São Paulo, terça-feira, 05 de novembro de 2002

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Agora, tarefa do vencedor é convencer os militares

RODRIGO UCHÔA
DA REDAÇÃO

Depois da vitória nas urnas, a próxima grande tarefa para que o AKP forme seu gabinete -e para que ele sobreviva- deve ser convencer as Forças Armadas de que respeitará o Estado secular.
Desde 1960, a Turquia mantém a média de um golpe militar a cada dez anos. O último, que derrubou o premiê Necmettin Erbakan -também acusado de ser religioso demais e secular de menos- em fevereiro de 1997, foi exemplar: deu-se sem derramamento de sangue e sem que as tropas chegassem sequer a sair da caserna. Bastou um ultimato.
A presença castrense é tão forte na vida política do país que analistas europeus a classificam como equivalente a um governo paralelo. Eric Rouleau, ex-embaixador da França na Turquia, chama isso de "política dos paxás" -uma referência aos antigos líderes militares do Império Otomano.
Os golpes, entretanto, não criaram um problema com a opinião pública. Pelo contrário, o prestígio das Forças Armadas é enorme, já que são tidos como o baluarte da indivisibilidade turca e carregam o sentimento de orgulho nacional.
A força dos "paxás" se faz sentir por meio do CSN (Conselho de Segurança Nacional), um órgão de poderes apenas consultivos, como diz o nome, mas que não costuma ser contrariado.
Formado pelos seis oficiais mais graduados da Turquia e por cinco civis -o presidente, o premiê, o chanceler, o ministro do Interior e o da Defesa-, o CSN analisa todos os assuntos do Estado, tanto internos quanto externos, para fazer suas recomendações.

Poder econômico
Contando com leis e tribunais especiais, as Forças Armadas se distinguem também por controlar diretamente uma parte importante da economia do país.
Os cadetes são educados pelo Estado em escolas especiais que não estão sob a jurisdição do Ministério da Educação. Assim que se formam, recebem salários muito maiores do que os dos servidores civis. Como têm uma formação considerada superior, acabam ocupando postos-chave em grandes empresas -e muitas delas têm participação do Estado.
Os privilégios se sucedem: compram de roupas a alimentos em lojas subsidiadas, obtêm empréstimos camaradas para adquirir imóveis e têm resorts exclusivos.
É o Estado-Maior que faz e administra o Orçamento das Forças Armadas, além de controlar a indústria de armas.
Há, sob o controle militar, negócios que abarcam setores tão diversos quanto petróleo, turismo, produção automobilística (em joint venture com a Renault) e serviços bancários.


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