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Crise no Quênia contamina vizinhos
País, um dos que mais crescem na região subsaariana, tem papel-chave na economia do leste africano
Com a violência da última semana, Ruanda e Uganda racionaram combustíveis; óleo e alimentos ficaram parados em porto e estradas
ANA FLOR
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, DE NAIRÓBI
Desabastecimento, aumento
de preços e falta de combustíveis foram sintomas imediatos
da onda de violência que tomou
conta do Quênia na última semana, desde o anúncio dos resultados das eleições presidenciais de 27 de dezembro. Mas a
crise iniciada com a contestação dos resultados que deram a
reeleição ao presidente Mwai
Kibaki trouxe sérios danos de
longo prazo à imagem externa
do país e à sua economia, uma
das mais estáveis da África.
Nas últimas décadas, a estabilidade do Quênia contrastou
com a oscilação dos países vizinhos, em especial no Chifre da
África. Sua economia forte e
instituições relativamente democráticas ajudaram nos últimos anos na luta contra o terrorismo. O país teve papel ativo
nas negociações de paz no Sudão. Também ajuda a pressionar pelo fim dos conflitos na
Somália, da qual recebeu milhares de refugiados.
Crescimento
Na África abaixo do Saara, a
solidez econômica e social do
Quênia eram comparadas apenas à da África do Sul e de Gana.
"O Quênia tem feito sua lição
de casa. Mesmo sem recursos
naturais, temos nos destacados
como uma das principais economias africanas", disse o economista e diplomata aposentado Phillip Mwanzia.
Desde 2002, quando Kibaki
foi eleito por uma coalizão de
partidos para substituir o governo de Daniel Arap Moi, que
estava havia 24 anos no poder,
a economia do país cresceu entre 5% e 7% ao ano. Este crescimento estimulou a região e fortaleceu as bases da Comunidade do Leste da África.
Sem recursos naturais para
gerar riqueza, a exportação de
chá e café representa um quarto do PIB do país. Outro setores, como o turismo -que no
ano passado lucrou US$ 900
milhões, a maior fonte de renda
externa- representam uma fatia cada vez maior da economia
do país.
A estabilidade e uma crescente classe média tornaram o
país um das maiores destinos
de investimentos estrangeiros
na África. Apesar de ter um terço de sua população vivendo
em favelas, Nairóbi é hoje uma
cidade com intenso comércio,
shopping centers funcionando
24 horas e uma oferta de serviços quase inexistente em outras áreas do continente.
A segurança levou para Nairóbi a sede de inúmeras organizações internacionais e agências das Nações Unidas.
"Até a década de 90, o Quênia
era o país mais estável da África, o único com capacidade para, por exemplo, ser uma sede
da ONU", diz o analista internacional Salomon Shah.
Prejuízo regional
A onda de violência afetou o
escoamento da produção de café e chá do país, que tiveram
seus leilões internacionais cancelados temporariamente.
A bolsa de valores de Nairóbi
foi fechada e companhias cancelaram pacotes turísticos,
aconselhando seus clientes a
procurarem outros destinos.
O centro da capital queniana,
que concentra atividades econômicas, permaneceu fechado
ou com acesso restrito pelos últimos dias. Bloqueios da polícia, que tentava evitar manifestações, medo de vandalismo ou
problemas com o transporte
público levaram lojas e empresas a fechar as portas.
Segundo associações de comerciantes, o fechamento de
estabelecimentos de comércio
fez o Quênia perder cerca de
US$ 31 milhões por dia em impostos.
A paralisação do país por
causa da violência mostrou o
quanto o leste da África dependente do Quênia. Se internamente o fechamento de estradas tornou difícil o escoamento
e distribuição de produtos -o
que, ao lado da destruição de
estabelecimentos comerciais,
fez com que os moradores tivessem que comprar alimentos
a preços mais altos-, a crise foi
sentida por consumidores de
países vizinhos.
Uganda e Ruanda, países sem
costa que dependem em grande
parte do porto queniano de
Mombaça, tiveram que tomar
medidas para racionar combustíveis.
Caminhões com alimentos
que iriam para Campala, capital da Uganda, ficaram dias parados no Quênia. Em Ruanda, o
governo chegou a anunciar que
estava negociando com a Tanzânia para escoar combustíveis
da costa leste até seu território.
No Burundi, a falta de combustíveis chegou a ameaçar a saída
de aviões do aeroporto internacional de Bujumbura.
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