São Paulo, quinta-feira, 06 de abril de 2006

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ANÁLISE

A "inoculação" de Chávez

NEWTON CARLOS
ESPECIAL PARA A FOLHA

A secretária de Estado americana, Condoleezza Rice, lançou contra Hugo Chávez, da Venezuela, a "estratégia da inoculação". A idéia é criar uma frente contra o chavismo que funcione como injeção de antivírus. Passa por aí o gesto surpreendente do embaixador dos EUA na Bolívia. Encontrou-se com o presidente Evo Morales para convencê-lo da ausência americana dos atentados de março em La Paz, com dois mortos. Não se conhece outro ato de contrição igual por parte de representante de Washington na América Latina. O objetivo é isolar Chávez ou "inoculá-lo".
Incorporado por antecipação à "onda esquerdista" na América Latina, o candidato presidencial peruano Ollanta Humala tornou-se foco de atenções com um discurso fortemente nacionalista. Fala de "meu irmão Evo Morales". Esteve com Lula em Brasília. Foi saudado por Chávez, o que motivou reação irada do presidente peruano, Alejandro Toledo, e um bate-boca envolvendo "intervenção em assuntos internos" do Peru e "desestabilização dos Andes". A rigor Humala estaria na categoria dos "populistas extremistas" denunciados pelo general Bantz Craddock, chefe do Comando Sul dos EUA.
Ex-oficial do Exército, Humala manifestou a pretensão de resgatar o "nacionalismo militar" colocado em cena pelo golpe de 1968. O general Velasco Alvarado e seus companheiros nacionalizaram o petróleo, motivo de briga acirrada com os EUA, e transformaram os grandes engenhos de açúcar em cooperativas. Propunham ações "antiimperialistas e antioligárquicas", mas a revolução velasquista terminou no pior dos mundos. Sede de poder, corrupção e deposição de Velasco em golpe dentro do golpe. Humala procura fundir numa só coisa antecedentes velasquistas e a "inspiração" em Morales, e a partir daí construir um discurso próprio.
No começo da campanha prometeu rever todos os contratos assinados com multinacionais de energia. Seriam restringidos investimentos do Chile, com o qual o Peru tem problemas territoriais. O Peru, prometeu Humala aos bolivianos, terá papel importante em qualquer negociação sobre concessão, por parte do Chile, de acesso ao mar à Bolívia.
De inicio à frente nas pesquisas, Humala passou por um período de estagnação, quando chegou a ser ultrapassado pela candidata conservadora Lourdes Flores.
Sobrevieram acusações de violações dos direitos humanos, quando comandou, entre 1992 e 1993, uma unidade antiterrorista. Reagiu dizendo que defendia seu país. Condenou a anistia para ex-guerrilheiros. Meteu-se num discurso de "tonalidades variadas". Como o "irmão Morales", Humala cultiva o apoio dos plantadores de folhas de coca. Garantiu à União Européia que é favorável a investimentos estrangeiros e que respeitará propriedades privadas. Falou à BBC sobre os "demônios do neoliberalismo". Recuperou-se nas pesquisas e é objeto de cautela, como Morales, em razão da "inoculação" de Chávez.


O jornalista Newton Carlos é analista de questões internacionais

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