São Paulo, terça-feira, 06 de agosto de 2002

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ÁSIA

Para críticos, sistema de identificação informatizado, lançado ontem, ameaça privacidade e lembra controle totalitário

Japoneses protestam contra RG eletrônico

France Presse
Manifestantes protestam contra o novo sistema de identificação diante do Ministério do Interior


ISABEL REYNOLDS
DA REUTERS, EM TÓQUIO

O Japão lançou ontem um sistema obrigatório de identificação dos cidadãos, medida que provocou protestos nas ruas de Tóquio. Para os manifestantes, trata-se de uma violação da privacidade e uma tentação para hackers.
Um grupo de acadêmicos e ativistas entregou ao Ministério do Interior uma petição exigindo que o governo interrompa o programa, que interliga sistemas municipais informatizados e confere a cada cidadão um número de identificação de 11 dígitos.
O grupo moveu uma ação contra o sistema no final do mês passado, pedindo que ele seja abandonado por ser inconstitucional. ""Não queremos viver sob vigilância do governo. Parem com o sistema de registro de residentes", gritou um pequeno grupo de manifestantes reunidos diante do ministério, um deles fantasiado de computador.
O novo banco de dados armazena dados pessoais -nome, endereço, data de nascimento, sexo e número de identificação- de cada um dos 126 milhões de japoneses, facilitando o trabalho deles quando quiserem obter documentos para uma série de serviços e benefícios públicos. O sistema não abrange estrangeiros residentes no país.
Mas pelo menos cinco municípios, incluindo o de Suginami, a oeste de Tóquio, se recusaram a fazer parte do sistema. O prefeito de Yokohama, a segunda maior cidade do Japão, disse na sexta-feira que os moradores da cidade poderão escolher se querem tomar parte do sistema.
Seiji Osaka, prefeito de Niseko, na ilha de Hokkaido, disse que sua cidade pode se retirar do sistema em setembro, se for constatado que as informações pessoais dos cidadãos não estão sendo totalmente protegidas.
Cerca de 4 milhões de japoneses vivem em municípios que se recusaram a introduzir o sistema, segundo a imprensa local.
O prefeito de Kokubunji, a oeste de Tóquio, promoveu uma cerimônia oficial de "fechamento", na qual, diante das câmeras de TV, clicou com um mouse para fechar o acesso do sistema computadorizado local à nova rede.

Temores e problemas
Os adversários do novo sistema temem que alguma coisa sinistra esteja em ação e acham que ele confere às autoridades uma ferramenta com a qual podem molestar os cidadãos e silenciar críticas.
"Esse sistema trata os indivíduos como coisas, não como gente", disse o especialista jurídico Hirohisa Kitano, professor honorário na Universidade Nihon, em Tóquio, em entrevista coletiva.
"Os nazistas atribuíram números aos judeus, de maneira idêntica. É muito perigoso", disse ele, explicando que teme que o país volte para o sistema de vigilância dos cidadãos adotado pelo regime militar japonês antes e durante a 2ª Guerra Mundial.
Os críticos do novo sistema dizem que o número de identificação pode abrir a porta para toda uma gama de informações pessoais guardadas em locais diferentes. Com isso, ficaria bem mais fácil para hackers semearem a confusão.
O governo afirma que criou um sistema de segurança que pode detectar acessos suspeitos ao banco de dados.
""É importante dar explicações, diminuir a ansiedade das pessoas e fazer com que compreendam o que está sendo feito", disse o primeiro-ministro Junichiro Koizumi a jornalistas, acrescentando que é preciso garantir que os dados pessoais sejam protegidos, e não utilizados para fins incorretos.
Dúvidas sobre os aspectos técnicos do sistema surgiram depois que diversos municípios, incluindo o de Osaka, relataram problemas técnicos.
O prefeito Kazuo Yoshimura, da cidade de Yamagata, no norte do Japão, fez o que descreveu como ""protesto humilde" ontem pela manhã, atrasando em uma hora a inicialização do sistema em sua cidade. Um representante local explicou que o prefeito estava protestando contra a ausência de uma lei, anteriormente prometida, que garantiria a proteção das informações pessoais.
Durante a última sessão do Parlamento, em 31 de julho, a administração de Koizumi não promulgou a lei, após protestos de jornalistas, para quem ela poderia amordaçar a imprensa.
Os japoneses que vivem em municípios que não rejeitaram o novo sistema vão receber seus números de identificação neste mês.

Tradução de Clara Allain


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