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Revolta iugoslava lembra ciclo de mudanças no leste da Europa
DANIEL VERNET
DO "LE MONDE"
Uma década depois dos antigos
países comunistas da Europa, a
Sérvia (uma República iugoslava)
está em vias de libertar-se.
Será que o fará como a Polônia
ou como a Tcheco-Eslováquia,
após uma transição suave, uma
"revolução de veludo", ou após
um confronto entre manifestantes reivindicando seus direitos e
as últimas fileiras dos mercenários do regime? As comparações
históricas não são conclusivas,
mas ajudam a compreender.
Em Varsóvia, onde a transição
institucional começou nos primeiros meses de 1989, a transferência de poder foi negociada entre os comunistas e a oposição.
O governo e o sindicato Solidariedade concordaram em organizar eleições semilivres, reservando 65% das cadeiras na Dieta ao
Partido Comunista e 35% para a
oposição. Era um sistema que
misturava as forças democráticas
aos resquícios do partido único,
mas tinha a vantagem de permitir
ao poder sair sem desonra e à
oposição mostrar sua força.
Alguns meses mais tarde, em
Praga, centenas de milhares de
tchecos se reuniram durante três
semanas na praça Venceslas para
reivindicar a saída dos caciques
comunistas e a formação de um
governo de concórdia nacional.
Sem que um único tiro tenha sido disparado, o presidente Husak, que chegara ao poder nos caminhões do Exército soviético
após a derrota da "primavera de
Praga" de 1968, renunciou ao cargo. No novo governo, os antigos
opositores passaram a controlar a
economia, as relações exteriores,
a informação e a polícia, antes
mesmo de Vaclav Havel passar
diretamente da prisão para o palácio presidencial.
Inspiração
As manifestações pacíficas de
Praga parecem inspirar Vojislav
Kostunica e seus amigos. Mas isso
fará o presidente iugoslavo, Slobodan Milosevic, ceder?
Nos últimos 13 anos, Milosevic
construiu um regime baseado numa mistura de repressão policial,
exaltação nacionalista, guerras
externas e exploração econômica
do país, em benefício dele e de
seus aliados. Agora, os sérvios parecem cansados do isolamento a
que a comunidade internacional
os submeteu por causa das ações
de Milosevic.
Os dirigentes tchecos estavam
cada vez mais isolados, após a
queda do comunismo nos países
vizinhos. Milosevic nunca contou
com ninguém. Mais do que o caso
tcheco, ele lembra Ceausescu, isolado em seu bunker em Bucareste,
que não hesitou em mandar atirar
sobre a multidão para se proteger.
Será que Milosevic, que ainda pode contar com as forças especiais
da polícia, tentará usar a força para resolver o problema criado por
sua derrota nas urnas?
O paralelo com a Romênia não é
inteiramente pertinente. A "revolução" romena foi mais um golpe
perpetrado por um círculo próximo ao ditador, que esperava conservar seu poder após matar
Ceaucescu. Já a oposição sérvia
reivindica o poder em nome de
uma legitimidade democrática,
organizada pelo ditador que acabou montando uma armadilha
para ele mesmo.
Tradução de Clara Allain
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