São Paulo, quarta-feira, 07 de fevereiro de 2001

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Currículo polêmico é marca de eleito

DO ENVIADO ESPECIAL

Ariel "Arik" Sharon nasceu com o nome russo Ariel Scheinerman, em 1928, em Kfar Mahal, uma aldeia ao norte de Tel Aviv, quando a Palestina ainda era domínio britânico. Seu avô já era um sionista fervoroso na Rússia, tendo imigrado à Palestina no começo do século.
Quando tinha 1 ano, a aldeia de Sharon sofreu um ataque de vizinhos árabes, e ele diz que aprendeu cedo que defender a terra e ter amor por ela é fundamental no Oriente Médio.
Setenta e um anos depois, é dono de uma das maiores fazendas de Israel e de um dos currículos mais polêmicos, tanto na área política quanto na militar.
Ao lado do ex-premiê trabalhista Shimon Peres, 77, Sharon é o último remanescente de uma liderança política que surgiu junto com o nascimento do Estado judeu, em 1948.
Ele entrou em 1945 na Haganah, a organização clandestina que precedeu o Exército israelense. Na Guerra da Independência (1948-49) já era comandante de pelotão.
Em 1953 tornou-se líder da Unidade 101, criada para retaliar ataques árabes contra Israel. Após o assassinato de uma israelense e seu filho no leste de Tel Aviv, Sharon comandou uma operação contra a aldeia de Kibya, na Cisjordânia, então sob domínio jordaniano, explodindo 45 casas e matando 69 moradores. Sharon diz que seus homens entraram nas casas e viram que elas estavam vazias, explicando que as vítimas deveriam estar escondidas e não foram vistas.
Na Guerra do Sinai, em 1956, Sharon comandou uma das batalhas mais difíceis do Exército israelense, causando várias baixas dos dois lados e enfurecendo seus superiores, que consideraram a ação desnecessária. Segundo seus biógrafos, surpreender os superiores e aumentar as proporções de suas missões tornaram-se padrões de Sharon.
Nas guerras árabes-israelenses de 1967 e 1973, ele ganhou bastante respeito de seus comandados e do país ao liderar missões arriscadas e vitoriosas. Suas tropas foram as primeiras a cruzar o canal de Suez na guerra de 1973, ação vista como o ponto de virada do Exército israelense, que nos primeiros dias do conflito perdeu terreno para a ação combinada e surpresa das forças sírias (norte) e egípcias (sul).
No início dos anos 70, como comandante militar do sul, Sharon combateu o terrorismo na faixa de Gaza com deportações em massa de terroristas e suas famílias. Para facilitar a ação do Exército num campo de refugiados palestinos, destruiu centenas de casas para abrir uma avenida larga no meio do campo.
Ele entrou na carreira política em 1973, pouco antes da guerra, e foi um dos principais articuladores da união das forças de direita no partido Likud.
A direita ganhou sua primeira eleição em Israel em 1977, e Sharon tornou-se ministro da Agricultura. Foi quando organizou o primeiro grande movimento de colonização judaica dos territórios palestinos ocupados. Ele sempre viu nas colônias a melhor forma de impedir a formação de um Estado palestino contíguo e proteger pontos estratégicos.
Mas mostrou pragmatismo ao retirar sua oposição inicial ao acordo de paz que Begin costurou com o presidente egípcio, Anwar Sadat, entre 1977 e 1979. Ele acabou comandando a retirada, à força, de colonos judeus do Sinai ocupado.
Após nova vitória nas eleições de 1981, Begin nomeou Sharon ministro da Defesa. Sua primeira ação foi ordenar ao Exército a elaboração de um plano para impedir que milícias palestinas seguissem bombardeando o norte de Israel de suas bases no sul do Líbano.
Lançada em 6 de junho de 1982, a chamada "Operação Paz na Galiléia" foi vendida ao gabinete como uma ação rápida para tomar 40 km do sul do Líbano, criando ali uma "zona de segurança" contra os ataques palestinos. Sharon omitiu que planejava chegar a Beirute, empossar um governo cristão pró-Israel e expulsar a liderança palestina do país.
Iasser Arafat e sua OLP acabaram saindo após fortes bombardeios contra Beirute, criticados até pelos aliados EUA, e as tropas israelenses chegaram à capital libanesa. Em 23 de agosto, o Parlamento libanês elegeu um presidente cristão pró-Israel, Bashir Gemayel, que tomaria posse em setembro. Pouco antes, foi morto em atentado orquestrado pela Síria.
Milícias cristãs libanesas, em retaliação ao assassinato de seu líder, invadiram os campos de refugiados palestinos de Sabra e Chatila, em região de Beirute controlada por Israel, e massacraram centenas de civis (as estimativas vão de 800 a 2.000), sem que os israelenses os impedissem. Sharon afirma que não podia prever a ação das milícias, que pediram para entrar nos campos para buscar terroristas.
Israel foi responsabilizado pelo massacre pela comunidade internacional, e os israelenses, chocados com a atrocidade, saíram em massa às ruas pedindo o fim da guerra, a queda do governo e uma investigação. Um inquérito oficial concluiu, em fevereiro de 1983, que Sharon tinha responsabilidade indireta e sugeriu que ele deixasse o posto de ministro da Defesa. Sharon recusou. Só deixou o governo depois que um extremista lançou uma granada contra uma das grandes manifestações pedindo sua queda, matando um dos manifestantes.
Na época considerou-se que as ambições políticas de Sharon estavam enterradas. Mas seu conselheiro Uri Dan disse na época, profeticamente: "Aqueles que não querem aceitá-lo como ministro da Defesa terão de aceitá-lo como primeiro-ministro".
Desde então Sharon ocupou outros cargos no governo, o último como chanceler do ex-premiê Binyamin Netanyahu, antecessor de Ehud Barak. Em 1998, negociou com Arafat a retirada parcial israelense de Hebron em Wye (EUA), mas recusou-se a apertar a mão do líder palestino. Em entrevista recente, chamou Arafat de "mentiroso" e "terrorista". Se quiser mesmo seguir com o processo de paz, terá de sentar-se com ele novamente. Mais um teste para seu pragmatismo. (SM)


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