São Paulo, quarta-feira, 07 de fevereiro de 2001

Texto Anterior | Índice

EUA

Michael Mathie, que já cumpriu 12 dos 30 anos de sua condenação por homicídio, ganhou mais de US$ 8 milhões desde 1998

Preso investe em Wall Street e fica rico

TINA KELLEY
DO "THE NEW YORK TIMES"

Em seus documentos de imposto, Michael Mathie escreve "investidor" no espaço em branco reservado para a ocupação. Ele ganhou mais de US$ 8 milhões em ações desde 1998. Mas na penitenciária de Elmira, em Nova York, uma prisão de segurança máxima na qual os guardas o chamam de "nosso preso milionário", Mathie é formalmente conhecido como "interno 90T1282". Ele já cumpriu quase 12 anos de uma pena de 30 por homicídio.
Ele também é conhecido por ajudar a pagar pelos custos legais dos outros presos, além de dar conselhos sobre as bolsas para qualquer um que lhe peça. Dado o seu sucesso em Wall Street, as pessoas o escutam. "Faço isso para todo mundo, de advogados a presos", disse ele.
Os presos não podem tocar seus próprios negócios da prisão, mas, como um funcionário diz, não perdem o direito de emitir opiniões atrás das grades.
Os investimentos de Mathie não são considerados um negócio, porque ele não os conduz pessoalmente. Seu pai o faz, tornando essa uma das mais estranhas histórias do atual frenesi com o mercado de ações nos EUA.
Mathie, 33, não tem ligação com a Internet, telefone celular nem telefone comum em sua cela. Ele faz suas transações ligando para seu pai a cobrar -até dez vezes por dia, quando o mercado está mais forte. Seu pai então fecha os negócios pela Internet.
Ele lembra ter investido em uma empresa chinesa de comércio de tecnologia, quando a proposta de filiação da China à Organização Mundial do Comércio era um assunto em alta. "A ação subiu de US$ 1 para US$ 10, depois, no dia seguinte, para US$ 18, então eu joguei US$ 50 mil, liguei de volta às 10h30 ou às 11h e ela já estava US$ 70", diz. "Então eu mantive US$ 150 mil e peguei meus US$ 50 mil de volta em duas horas e meia."
Ele também teve seus tropeços, quando o mercado de ações de alta tecnologia engasgou. Ele tem calafrios quando lembra a queda de agosto de 1998, quando suas ações perderam US$ 750 mil em valor em 20 minutos.
Mas ele permanece otimista e prevê que o índice Nasdaq (que reúne as empresas de alta tecnologia) vá chegar aos 6.500 pontos no final de 2002, dos atuais 2.643.
"Definitivamente, não estamos entrando numa recessão. Se ela acontecer, será por causa da mídia", afirma.
Mathie, um homem frágil que parece muito mais com um padre do que com um assassino, já era familiarizado com o risco -não o do tipo financeiro- quando foi preso, em 1989. Com 21 anos, ele tinha abandonado os estudos e era um ex-viciado em cocaína.
Ele e três outros colegas foram presos pelo assassinato de Paul Lamariana, 49, que foi golpeado na cabeça com uma barra de ferro, levou choques com um fio elétrico, foi amarrado, sufocado com sacos plásticos, enrolado num carpete e jogado no acostamento de uma estrada. Mathie admitiu tê-lo golpeado com a barra de ferro e ter-lhe dado choques.
Mathie diz que sente remorsos pelo crime, que afirma ter sido cometido porque ele acreditava que Lamariana estava abusando da filha de um dos colegas envolvidos. Ele fez consultas sobre como poderia ajudar a família da vítima. "Gostaria que houvesse algo mais que eu pudesse fazer", diz. "Eu melhorei bastante, sempre tendo Paul (Lamariana) em mente. Isso é basicamente o que me move."

Violência sexual
Mathie confessou homicídio e conspiração, mas disse que só fez isso para sair da prisão do condado de Suffolk, onde ele diz que era violentado e abusado sexualmente com frequência pelo chefe da segurança interna.
Por causa disso, Mathie ganhou, em 1996, US$ 750 mil numa ação civil. O juiz que analisou o caso disse que havia claras evidências de abuso de poder e de autoridade. A indenização foi depois reduzida para US$ 500 mil, após uma apelação. Com US$ 75 mil, Mathie começou a negociar ações.
Mathie segue com sua rotina diária, ligando a televisão às 4h para ver as notícias dos mercados europeus nos canais abertos -não há cabo para os condenados. Ele recebe também dezenas de publicações que o ajudam a tomar suas decisões de investimentos, incluindo o "The Wall Street Journal" e diversas revistas econômicas especializadas. Os funcionários da prisão que levam sua correspondência reclamam que ele recebe muita coisa.
"Eu os recompenso", diz Mathie. "Eles querem saber dicas sobre em quais ações investir, para suas carteiras de aposentadoria e coisas assim."
Ele sugere um enfoque diversificado. Quais seus investimentos favoritos? Milho, que ele acredita que vá dobrar de preço, Juniper Networks, JDS Uniphase e AT&T, que planeja se dividir em quatro. "São bons investimentos de longo prazo", afirma.
As ações de empresas de tecnologia têm sido generosas com ele, e Mathie considera a recente queda como "uma fabulosa oportunidade para compra". Ele é particularmente entusiasta da Yahoo.
"A Yahoo pagou meu Viper", diz ele, em referência ao seu novo carro conversível de US$ 97 mil, mantido na garagem da casa de sua família, em Long Island.
Ele ajuda outros prisioneiros financeiramente, quando eles precisam. Mathie diz ter pago US$ 2.000 em um teste de DNA que ele acredita que pode livrar um colega da cadeia. Ele também deu US$ 5.000 para pagar uma festa especial de Natal para os internos de um centro de reabilitação juvenil.
Mathie pretende abrir uma organização de ajuda a jovens quando deixar a prisão. Ele teve a liberdade condicional negada em 2000. Sua próxima audiência para a condicional é em junho.
Ele oferece um prognóstico para o mercado na primeira metade do ano, que talvez também possa ser aplicado à sua própria condição: "Os dois primeiros trimestres, até junho, serão bem duros."


Texto Anterior: Peru: US$ 3 bi das privatizações em campanha presidencial
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.