São Paulo, quinta-feira, 07 de fevereiro de 2008

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SUCESSÃO NOS EUA/DECISÃO REPUBLICANA

McCain investe em conservadores

Acusado por rivais de estar "à esquerda", republicano faz festa e discursa para provar lealdade a ideais do partido

Apesar de o senador ter conquistado mais vitórias, Superterça mostrou que ele ainda carece de força em Estados mais ortodoxos

FÁBIO VICTOR
ENVIADO ESPECIAL A PHOENIX (ARIZONA)

Duas horas antes de John McCain entrar no salão preparado para a festa no Arizona Biltmore, um resort de luxo em Phoenix, um grupo de crianças vestidas com roupas camufladas já está a postos no lobby para saudá-lo. São os Young Marines (jovens fuzileiros navais) da cidade de Mesa, codinome Mesa Desert Devil Dogs (Cães Endiabrados do Deserto).
Têm entre 8 e 15 anos. O adulto que os lidera os coloca em posição de sentido e ordena: "Go, go, go". O grupo atravessa o salão e se posiciona bem em frente ao palquinho montado anteontem à noite para o candidato, o líder das primárias republicanas, que ganhou em nove Estados na Superterça.
Os Young Marines são escoteiros educados para a guerra. Desde cedo aprendem a história dos conflitos e como fazer para um dia integrar a elite das Forças Armadas americanas.
A Superterça não foi o êxito que permitiria a McCain liquidar já a disputa republicana, como previam alguns de seus simpatizantes. Mas, pelo discurso e pelo evento anteontem em Phoenix, parece cada vez mais claro que a aura de "maverick" (indomável) do candidato é uma névoa do passado que a conveniência eleitoral tem se encarregado de dissipar.
Um oportunismo cujo efeito é incerto: tanto pode roubar votos dos rivais no partido, Mitt Romney e Mike Huckabbe, que acusam McCain de ser excessivamente "liberal" -ter inclinações esquerdistas-, quanto afastá-lo de eleitores independentes e de centro.
A moral e a guerra deram o tom da noite, uma exaltação às virtudes e princípios da sociedade americana -uma típica festa conservadora no conservador Arizona de McCain.
"A primeiro razão é a guerra ao terror", responde a consultora política Sharron Gill, questionada por que vota em McCain. "A segunda é porque sua vida parlamentar mostra uma preocupação com o excesso de gastos do governo."
Ali perto, um senhor com boné dos marines, uma enorme pedra de turquesa pendurada na altura do peito e que circula carregando uma bandeira dos EUA dobrada é abordado por outro homem. "Ah, marine? De que ano?" "De 59." "Ah, eu sou de 73." E engrenam um bate-papo sobre memórias.
Meia hora antes da chegada de McCain, a banda que executava clássicos de pop-rock pára. Inicia-se uma seqüência de marchas das Forças Armadas americanas. São canções como "Stars and Stripes Forever" [Estrelas e Listras Para Sempre, uma ode à bandeira dos EUA] e "Glory of the Yankee Navy [Glória da Marinha Ianque]", seguidas pelo público com palmas.
São, a reportagem é informada, quase todas de John Philip Sousa, compositor do início do século passado, conhecido como "Rei das Marchas" -que tinha ascendência portuguesa.

Princípios
Às 21h35, McCain sobe ao palco. O público grita "Mac is back" (Mac voltou). O discurso parece de improviso, mas depois se percebe que é lido num teleprompter. Os resultados da Superterça àquela hora não estão fechados, mas ele admite que, de azarão, passou a se acostumar com a idéia de que é o líder da disputa republicana.
Então desfia uma fala recheada de termos como "princípios" (citado cinco vezes) e seguro/segurança (quatro), este associado a livre/liberdade (seis). E assegura aos partidários que sim, conservará o seu conservadorismo.
"Prometo que, seu eu tiver a felicidade de ser o indicado, trabalharei duro para garantir que a filosofia conservadora e os princípios de nosso grande partido ganhem de novo os votos da maioria dos americanos."
"Tenho vivido minha vida com um propósito acima de todos: manter a América segura de todos os inimigos estrangeiros ou domésticos. E eu nunca me cansarei dessa honra", afirmou. E mais garantias: "Sou republicano porque, como vocês, creio que o governo deve defender a segurança de nossa nação de forma efetiva, pois o custo de nossa Defesa é medido em perdas difíceis de suportar e no sofrimento de muitas famílias."
Uma ironia: a obsessão com segurança se resumiu ao discurso de McCain. Havia mais de mil pessoas no salão do hotel -e nenhum controle no acesso. O repórter da Folha entrou e saiu do local sem ser parado.

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