São Paulo, quarta-feira, 07 de junho de 2000


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GUERRA NA IUGOSLÁVIA
Anistia divulga relatório em que acusa a aliança ocidental de bombardear civis deliberadamente
"Otan cometeu crime de guerra em Kosovo"

ROBERT FISK
DO "THE INDEPENDENT"

Apenas cinco dias após a Otan ter sido isentada de culpa pelo Tribunal Internacional para Crimes de Guerra pela morte de civis no conflito de Kosovo (1999), a Anistia Internacional publicou ontem um relatório acusando a aliança militar ocidental de ter cometido graves violações das regras de guerra, assassinatos e, no caso do ataque à sede da TV sérvia em Belgrado, um crime de guerra.
O relatório, de 65 páginas, detalha um grande número de mortos civis em decorrência dos ataques aéreos da Otan e afirma que "as baixas entre os civis poderiam ter sido significativamente reduzidas se a aliança tivesse respeitado todas as regras de guerra".
A Anistia, organização não-governamental com sede em Londres, salienta que sempre condenou as atrocidades cometidas por forças iugoslavas contra kosovares de origem albanesa, mas não deixa de apontar a inconsistência das informações da Otan.
Apesar de um dos porta-vozes da Otan ter dito à Anistia que os pilotos da aliança operaram segundo "regras estritas" durante os bombardeios ocorridos no ano passado, a aliança se recusou a fornecer detalhes das "regras" ou dos princípios que guiaram os ataques. O documento diz: "Eles (Otan) não responderam a questões feitas pela Anistia Internacional sobre incidentes específicos".
A Anistia lembra que aviões da Otan realizaram 10.484 missões de ataque sobre o território iugoslavo e que as estatísticas do país sobre o número de civis mortos em decorrência desses ataques variam entre 400 e 1.500.
O relatório condena particularmente um ataque a uma ponte na cidade de Varvarin, no qual 11 civis foram mortos, em 30 de maio. "As forças da Otan não suspenderam seus bombardeios, mesmo depois de estar claro que tinham atingido alvos civis", concluiu a Anistia.
Quando a aliança ocidental atingiu comboios de refugiados de origem albanesa perto de Djakovica, em 14 de abril, e em Korisa, em 13 maio, "ela deixou de tomar as precauções necessárias para diminuir o número de baixas em meio à população civil".
O documento afirma que a Otan privilegiou a segurança de seus pilotos em detrimento da vida de civis iugoslavos. Sobre o ataque a um hospital na cidade de Surdulica, em 31 de maio, o documento diz: "Se a Otan bombardeou o hospital porque acreditava que ele abrigava soldados sérvios, ela violou leis de guerra".
Segundo o Artigo 50 do 1º Protocolo da Convenção de Genebra, "a presença em meio à população civil de pessoas que não podem ser definidas como civis não retira o caráter civil dessa população".
Algumas das críticas mais graves da Anistia envolvem o bombardeio da sede da TV sérvia, em 23 de abril.
"A Otan atacou deliberadamente um alvo civil durante três horas, matando 16 civis, com o simples propósito de atrapalhar as transmissões da TV sérvia no meio da madrugada", afirma o relatório da Anistia.
A organização de defesa dos direitos humanos chega a implicar o premiê britânico na questão. "Tony Blair pareceu indicar, num documentário da rede BBC, que uma das razões pelas quais a TV sérvia foi atacada foi que imagens de erros da Otan estavam sendo passadas por ela a redes ocidentais, mostrando civis mortos e prejudicando o apoio à guerra dentro da aliança ocidental."
O ditador iugoslavo, Slobodan Milosevic, era acusado de "limpeza étnica" -expulsar e matar a população de origem albanesa de Kosovo, Província no sul da Sérvia (as Repúblicas da Sérvia e de Montenegro formam a Iugoslávia). Para tentar forçá-lo a um acordo, a Otan bombardeou a Iugoslávia por 78 dias.
Ele aceitou as condições da aliança ocidental, que incluíam retirada das forças iugoslavas de Kosovo e o envio de uma força internacional de paz à região.


Tradução de Márcio Senne de Moraes


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