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[+] Análise
Resolução da ONU não põe fim à crise
ROBERT FISK
DO "INDEPENDENT", EM BEIRUTE
Então os grandes e os bons
de East River trabalharam
arduamente no Conselho de
Segurança da ONU -e o fruto de seus labores foi um texto irritante e ofensivo. Quase
foi possível ouvir o gemido
dos libaneses diante desse
esboço de resolução -um
documento carregado de
tanta falsidade e parcialidade que um grande amigo
meu libanês o leu cuidadosamente e formulou a pergunta
imortal: "Será que esses bastardos não vão aprender nada com a história?".
E estava tudo ali outra vez,
as propostas de paz requentadas da invasão israelense
de 1982, repletas de zonas de
segurança, desarmamento e
"respeito rigoroso de todas
as partes", além da necessidade de soberania libanesa.
O texto nem sequer exigiu
a retirada das forças israelenses do sul do Líbano,
questão para a qual Wallid
Moallem, o ministro sírio do
Exterior chamou a atenção
de imediato. Sem uma retirada israelense total, a resolução da ONU seria letra morta, disse ele, em visita estratégica a Beirute.
Uma análise cuidadosa do
texto provisório apresentado
pelos EUA e pela França
mostra exatamente quem
manda na política de Washington para o Oriente Médio: Israel. O texto não faz referência nenhuma à violência obscenamente desproporcional empregada por Israel e menciona de passagem
a posição do Hizbollah de
que somente libertará os
dois soldados israelenses
capturados em 12 de julho
em troca de presos libaneses
e de outros árabes encarcerados em prisões israelenses.
O conselho disse que "está
atento ao caráter sensível da
questão dos prisioneiros e
incentiva os esforços que visam resolver a questão (sic)
dos prisioneiros libaneses
detidos em Israel". Aposto
que o Hizbollah ficou impressionado com a parte do
"estar atento", sem falar na
palavra escorregadia "resolver". Depois disso, veio o verdadeiro tiro de misericórdia.
A exigência do "cessar total
de todos os ataques do Hizbollah" e do "cessar imediato
de todas as operações militares ofensivas" de Israel. Há
um probleminha aí. O Hizbollah terá que depor suas
armas. Os israelenses, não.
Se o Conselho tivesse exigido uma resolução imediata
sobre o futuro das Fazendas
de Shebaa, território ocupado por Israel que no passado
pertencia ao Líbano, e por
cuja "libertação" o Hizbollah
vem lutando, a coisa poderia
ter tido alguma chance de
dar certo. Mas o documento
da ONU pediu apenas uma
delimitação das fronteiras do
Líbano, "incluindo a área das
Fazendas de Shebaa".
Houve até mesmo um parágrafo fantástico, que "pede
a todas as partes que cooperem... Com o Conselho de Segurança". Então o Hizbollah
deve cooperar com os austeros diplomatas desse organismo respeitável e sábio?
Será que isso não significa
elevar um exército guerrilheiro a uma posição mais
nobre do que merece?
Mas ninguém se deixou
enganar. Poucos discordaram do sírio Wallid Moallem
quando ele falou que o texto
provisório de resolução da
ONU é "receita para a continuação da guerra". E continuar a guerra foi o que o Hizbollah e Israel fizeram. Isaac
Hertzog, o ministro israelense do Turismo, anunciou:
"Ainda temos os próximos
dias para realizar muitas
missões militares".
Houve mais ataques aéreos israelenses contra os subúrbios do sul de Beirute, garantindo que ainda mais milhares de civis xiitas vão continuar refugiados nas escolas
vazias e nas ruas cada vez
mais imundas de Beirute e a
gasolina virou artigo de luxo.
Mais ou menos a única concessão ao Líbano na resolução da ONU foi a necessidade
expressa de que a ONU receba os mapas israelenses remanescentes que indicam a
localização de minas terrestres no Líbano.
E, como de costume, o texto provisório da ONU sobre
essas idéias de concepção
impossível "decide permanecer ativamente atualizado
em relação ao assunto". Pode
apostar que sim. E assim, como dizem, a guerra continua.
Tradução de Clara Allain
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