São Paulo, domingo, 08 de maio de 2005

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O FIM DO NAZISMO

Para diretor internacional do Ministério da Defesa, esforço soviético evitou a nazificação da Europa

A vitória foi nossa, afirma general russo

MÁRCIO SENNE DE MORAES
ENVIADO ESPECIAL A MOSCOU

A Rússia não se importa com o modo como o Ocidente vê a vitória na Segunda Guerra Mundial, que exalta a participação dos aliados, considera o ponto de inflexão do conflito o desembarque das tropas aliadas na Normandia (França) em 1944 e não dá o devido valor ao esforço soviético para conter o avanço nazista na frente leste, conforme afirmou à Folha o general Anatoly Mazurkevich, chefe do Diretório de Cooperação Militar Internacional do Ministério da Defesa russo.
"Conhecemos o valor do esforço militar soviético e sabemos que fomos nós que obtivemos a vitória no conflito. Perdemos quase 27 milhões [cerca de 26,6 milhões, de acordo com estatísticas oficiais] de pessoas na Grande Guerra Patriótica, o que foi o mais alto preço possível por nossa vitória. Costumo até brincar com meus amigos sobre o tema e dizer que, se não fossem a determinação e a coragem dos russos, talvez toda a Europa e até os EUA ou o Brasil falassem somente alemão hoje, o que seria terrível, pois se trata de uma língua muito difícil", disse Mazurkevich, com um sorriso nos lábios.
"Graças à nossa luta e à nossa vitória, as pessoas podem hoje em todo o mundo viver em seu território soberano e falar sua própria língua. Além disso, a derrota nazista permitiu que cada país pudesse ter sua própria cultura, sua própria moeda e sua liberdade", acrescentou o general de três estrelas, cujo escritório, que "já foi do grande marechal Georgy Zhukov" -herói de guerra soviético-, é decorado com um grande relógio que pertencia ao ministro da Propaganda nazista, Joseph Goebbels.
Ele não mencionou, contudo, os mais de 40 anos do domínio russo sobre outras ex-repúblicas soviéticas, como os países bálticos (Estônia, Letônia e Lituânia).
Mazurkevich ressaltou, contudo, que a Rússia crê hoje na importância de uma parceria construtiva com a Alemanha. "É importante estabelecer uma relação positiva com a Alemanha, pois os alemães já perceberam o que fizeram de negativo durante a Segunda Guerra Mundial. "Com isso, mais uma vez, estamos na vanguarda do pensamento global. A idéia de muitos no Ocidente é de que o papel da Rússia na Grande Guerra Patriótica foi primitivo e miserável. Volto a dizer que, para os russos, o modo como muitos ocidentais acreditam que a vitória tenha sido conquistada não é de nenhuma importância", afirmou o general russo.
A URSS entrou na guerra em 1941, pois, anteriormente, o ditador soviético Josef Stálin e o "Führer" nazista, Adolf Hitler, tinham feito um acordo de não-agressão, chamado Ribentrop-Molotov. "Não conheço os detalhes daquele pacto. Ha rumores sobre a colaboração soviética com Hitler, mas não saberia dizer se ele foi positivo ou negativo para a URSS. Tínhamos boas relações com os países ocidentais e só pudemos perceber que a guerra tinha realmente começado quando os nazistas passaram a nos atacar", admitiu Mazurkevich.
Ele ressaltou ainda que os comandantes soviéticos adiantaram uma grande operação militar passar poupar vidas de soldados aliados. "Quando o Ocidente abriu a segunda frente da guerra em 1944, na Normandia, a situação era terrível para as forças ocidentais. Decidimos, então, começar uma das maiores ofensivas da guerra duas semanas antes do que estava programado para salvar vidas de soldados aliados."
"Não sei quantos mais teriam morrido se não tivéssemos começados aquela operação antes do tempo que estava planejado, mas, para nossos comandantes, era importante salvar o maior numero possível de pessoas inocentes de qualquer nacionalidade", declarou Mazurkevich.
"Para que se possa ter uma verdadeira noção da situação à época e do enorme esforço soviético durante o conflito, é preciso lembrar que, apenas durante o cerco de Stalingrado [hoje Volvogrado], perdemos 1,12 milhão de pessoas entre civis e militares. Ademais, descobri recentemente que, em Rzhev-Vyazma, perto de Moscou, no verão [setentrional] de 1942, houve uma enorme batalha, na qual perdemos 1,3 milhão de pessoas", acrescentou.
"Por razões políticas, este número jamais foi tornado público pelo regime soviético. Somente em 1941, perdemos 5,5 milhões de militares, que foram mortos em combate ou levados a campos de concentração nazistas. Isso tudo ilustra o tamanho de nosso esforço militar e também mostra que merecemos crédito pela vitória", concluiu o bem-humorado general russo.

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