São Paulo, quarta-feira, 08 de dezembro de 2004

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

MEMÓRIA

Recém-descoberto, relato foi escrito por jovem judia não-identificada e está em museu do Holocausto em Israel

Diário relata drama no gueto de Varsóvia

DA ASSOCIATED PRESS

Nos últimos dias da resistência judaica contra os nazistas no gueto de Varsóvia, em 1943, uma jovem judia manteve um diário em que relatou sua luta por sobrevivência num porão lotado.
O diário de seis páginas, aparentemente o único relato escrito durante a resistência que sobreviveu à batalha, foi encontrado em um museu do Holocausto em Israel.
A autora, cujos nome e destino são desconhecidos, descreveu um período de dez dias durante o mês de levante, em que centenas de judeus resistiram contra o extermínio pelos nazistas.
Ela conta que sobrevivia com uma tigela de sopa e uma caneca de café por dia. Do lado de fora, os nazistas incendiavam casas.
"O gueto está queimando pelo quarto dia", escreveu a jovem. "Você vê apenas as chaminés de pé e os esqueletos das casas incendiadas. Num primeiro momento, essas visões provocam um terrível calafrio."
Escrevendo em polonês, a moça nunca mencionou seu nome. Apenas disse que formava parte de um grupo juvenil judaico, indicando que estaria no final da adolescência ou no início dos 20 anos.
O diário faz parte de uma coleção de cartas, anotações e páginas coletadas depois da Segunda Guerra por Adolf-Abraham Berman, um sobrevivente do gueto.
Berman doou seu acervo nos anos 70 à Casa dos Lutadores do Gueto, no kibutz (fazenda coletiva) Lochamei Haglettaot, no norte de Israel. Especialistas do museu se deram conta da importância do acervo apenas recentemente, enquanto organizavam o arquivo para divulgação ao público.
"A raridade desse diário é que é o único encontrado no mundo, pelo que sabemos, que foi escrito justamente no momento da luta", disse Yossit Shavit, diretor dos arquivos do museu. "Os outros diários foram escritos depois."
Segundo Shavit, a autora provavelmente morreu na demolição do gueto. "Mas ela pode muito bem estar em um asilo nos EUA."
O gueto de Varsóvia foi criado na Polônia ocupada pelos nazistas em 1939. Judeus das redondezas foram forçados a se aglomerar no bairro. Em seu ápice, em 1941, cerca de 450 mil judeus viviam nos 300 hectares do gueto. A maioria morreu de fome e frio ou pelas câmaras de gás nazistas.
Quando os alemães começaram a derrubar o gueto, em 1943, 60 mil judeus ainda viviam lá. Centenas deles revidaram ao ataque com poucas armas, munição, comida ou bebida. Eles resistiram por 27 dias, até que os nazistas incendiaram o local por completo.
"Estamos dentro de um abrigo", começa o diário no sexto dia da resistência, em 24 de abril de 1943. "Olhamos pela janela e vimos o gueto incendiado, completamente tomado pelas chamas", conta, segundo trechos publicados pelo jornal "Jerusalem Post".
Em outro momento, um abrigo vizinho é incendiado e os ocupantes tentam se refugiar no esconderijo da autora. Os novatos não têm comida e são barulhentos, aumentando as chances de descoberta pelos nazistas.
"O abrigo está muito lotado por causa do grande número de pessoas e do número ainda maior que quer entrar no esconderijo. As pessoas estão batendo para entrar. Todo mundo quer entrar."
"O ar no bunker é horrível, muitos perdem a consciência. Dormir está fora de questão devido ao perigo de sufocamento", diz, ainda segundo o jornal israelense.
O último relato, no dia 2 de maio, é o mais longo. "A única coisa que temos é nosso esconderijo. Claro que não será um lugar seguro por muito tempo." Suas últimas palavras escritas são: "Estamos vivendo pelo dia, pela hora, pelo momento".


Texto Anterior: Oriente Médio: Netanyahu apóia governo de união
Próximo Texto: Mídia: BBC anuncia demissão de 2.900 funcionários para cortar gastos
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.