São Paulo, sábado, 09 de fevereiro de 2008

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Jovens cubanos criticam regime em vídeo

Universitários questionam restrição a internet e câmbio especial para turismo em reunião com presidente do Parlamento

Imagens, repassadas à BBC, são de encontro na véspera da eleição; em dezembro, Raúl Castro voltou a dizer que quer "mais debate"

DA REDAÇÃO

"Querido Alarcón, [...] não quero passar um dia mais sem que possa derrubar cada um dos argumentos que escuto diariamente e que é difícil responder [...]. Crer verdadeiramente implica saber tudo ou quase tudo. E ter perspectiva do futuro imediato, do que pode acontecer. Com isso, podemos defender, ter mais argumentos..."
Exibindo um @ estilizado na blusa, o estudante universitário cubano Eliécer Ávila diz o prelúdio acima ao microfone, conferindo notas em um caderno, para listar questionamentos que afligem "os jovens revolucionários de hoje", entre eles: a defasagem entre o salário em moeda local e os preços dos produtos na ilha, os empecilhos financeiros e legais para o cubano viajar e as restrições ao acesso à internet.
As perguntas são feitas ao presidente da Assembléia Nacional cubana, Ricardo Alarcón, que, para algumas delas, diz não ter respostas.
A dias da posse da nova legislatura do Parlamento cubano -que vai decidir se o ditador convalescente Fidel Castro vai ou não continuar sendo o dirigente máximo da ilha-, as imagens do encontro circulam em Havana e, divulgadas pela britânica BBC, movimentam debates em sites e fóruns de internet sobre a ilha.
A reunião aconteceu um dia antes das eleições legislativas de 20 de janeiro na Universidade de Ciências Informáticas (UCI), tido como um dos projetos da predileção de Fidel.
O raro momento de debate crítico que vem a público -envolvendo não os dissidentes do regime, mas estudantes que se dizem interessados no "processo revolucionário"- faz parte, aparentemente, da iniciativa de Raúl Castro, no comando há 18 meses, de promover debates. Num regime com mídia estatal somente, os jovens da elite estudantil dizem no vídeo que "querem aproveitar o espaço".
"Olhava as fotos e as biografias dos delegados e deputados e dizia: quem são? Não sei quem são", diz o estudante Alejandro Hernández, em referência aos candidatos à eleição.
"Que essa pessoa faça um intercâmbio mais profundo, mais próximo com cada estudante que vai votar. Do contrário, [...]somos simplesmente hipócritas da liberdade. Não podemos falar de comunismo ou socialismo", continua.

Respostas e limites
Já Eliécer Ávila questiona por que os cubanos não vão a hotéis nem viajam ao exterior. Cita o exemplo de alguém cujo sonho é visitar a Bolívia, local de morte de Che Guevara.
Alarcón responde que "não se pode falar de viagem como um direito", que viajar é mesmo privilégio de uma minoria, há que ter dinheiro. Lembra que antes da Revolução os cubanos também não freqüentavam os principais resorts.
Para outras perguntas, o chefe do Parlamento diz não ter respostas, segundo transcrição de agências e da BBC (o vídeo completo não está disponível).
Sobre a restrição de usar e-mails dos gigantes Google ou Yahoo, Alarcón diz "não estar a par do tema de internet". O dirigente também informa, sem mais detalhes, que há um debate no governo sobre como resolver a disparidade criada pela duplicidade de moeda em Cuba. "Com relação a isso sou um perfeito ignorante."
Na ilha há o peso conversível, que é a moeda das divisas, dos serviços turísticos, e o peso, que vale 25 vezes menos. A discrepância dividiu os cubanos em dois grandes grupos, de acordo com a moeda com a qual lidam.
Há uma expectativa sobre quais mudanças e quais os limites da "abertura" que Raúl Castro pretende promover. Em discurso em dezembro, ele voltou a defender debates. "Às vezes as pessoas temem o termo discordar, mas digo que, quanto mais debate e mais discordância houver, melhores serão as decisões", afirmou.
Em uma reunião em janeiro, o governo informou a funcionários cubanos de empresas estrangeiras -os mais bem pagos- que aumentaria o imposto sobre suas rendas. Houve protesto e a mesa que dirigia o encontro perdeu o controle. As reuniões foram canceladas. O aumento do tributo está sendo avisado de casa em casa.


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