São Paulo, terça-feira, 09 de março de 2004

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GUERRA SEM LIMITES

Americanos torturam e usam força excessiva, afirma Human Rights; país diz respeitar "leis de combate"

EUA são acusados de abuso no Afeganistão

MIKE COLLETT-WHITE
DA REUTERS, EM CABUL

A organização de defesa dos direitos humanos Human Rights Watch declarou ontem que as forças americanas no Afeganistão usaram força excessiva ao prender supostos terroristas islâmicos, resultando na morte evitável de civis e em possíveis violações das leis internacionais.
Um relatório do grupo, sediado nos EUA, diz que, desde 2002, as forças lideradas pelos americanos já detiveram pelo menos mil pessoas no Afeganistão e que algumas foram torturadas e não puderam questionar sua detenção.
Um porta-voz militar americano no Afeganistão disse que o relatório trai uma "falta de compreensão" das leis para conflitos armados. "Tomamos cuidado extremo com o uso da força", disse o tenente-coronel Bryan Hilferty. "Obedecemos a regras de combate muito rígidas e respeitamos as leis da guerra. O Afeganistão é, neste momento, uma zona de combate, e as forças aqui presentes estão engajadas em operações de combate contra forças inimigas. Aplicamos as regras de combate apropriadas e respeitamos as leis do conflito armado."
O relatório diz que os prisioneiros nos centros de detenção dos EUA na base aérea de Bagram e em outros locais do Afeganistão não têm acesso a seus familiares, a advogados e a jornalistas. Além disso, o relatório diz que três pessoas morreram sob custódia americana no Afeganistão e acusa as forças dos EUA por não terem investigado as mortes de maneira adequada. Hilferty disse que as mortes estão sendo investigadas.
Cerca de 13 mil soldados liderados pelos EUA estão no Afeganistão, buscando os remanescentes do Taleban e da Al Qaeda. Os afegãos os acusam de agir com brutalidade. As forças americanas admitem ter causado a morte de civis em operações mal conduzidas, mas rejeitam algumas das alegações feitas por afegãos.
Pouca coisa é sabida sobre os centros de detenção que os EUA mantêm no país, que, segundo o relatório, os americanos operam "em um clima de impunidade quase total". Hilferty disse que existem vários centros de detenção temporária espalhados pelo país, mas que o principal fica em Bagram, ao norte de Cabul, onde são mantidas 150 pessoas.
A Human Rights Watch reproduziu as palavras de um funcionário da ONU que compilou queixas sobre as operações americanas em 2002 e que teria dito que os EUA utilizam "força excessiva" contra os afegãos, agindo "como caubóis", e que a maioria dos afegãos detidos acabam revelando ser cidadãos respeitadores da lei.
O relatório criticou a chamada "supressão", ou uso de fogo indiscriminado durante operações de prisão, para imobilizar possíveis forças inimigas. Disse, também, que os soldados americanos às vezes prendem todos os homens em idade militar encontrados nas proximidades de uma operação.
Ex-detentos se queixam de ter sido fotografados nus, impedidos de dormir por várias semanas, espancados até perderem a consciência, mantidos em solitária e acorrentados. Cinco homens que ficaram detidos por 16 dias e depois foram libertados receberam o equivalente a US$ 0,70 cada um de um intérprete local, depois que um americano lhes pediu desculpas e prometeu compensação.
A Human Rights Watch pediu aos EUA que informassem onde as Forças Armadas e a CIA mantêm suspeitos presos e que assegurassem aos detidos um tratamento de acordo com as leis internacionais.
Hilferty declarou que, embora os detidos no Afeganistão não sejam cobertos pelas Convenções de Genebra, já que não são combatentes uniformizados e não representam um Estado, eles são tratados com respeito. "Permitimos que sejam vistos pela Cruz Vermelha, eles recebem três refeições por dia, têm oportunidades para orar e recebem assistência médica", disse.


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