São Paulo, quinta-feira, 09 de março de 2006

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ANÁLISE

Diplomatas não acreditam em sanções econômicas

ALISTAIR LYON
DA REUTERS, EM LONDRES

O Conselho de Segurança terá dentro de alguns dias em sua pauta as ambições nucleares iranianas, mas a busca de um consenso, mesmo em torno de sanções mais leves, pode dar lugar a um desgastante atrito diplomático.
Além disso, sanções não impediriam que o Irã prossiga no que considera seu direito de obter tecnologia nessa área, sobretudo se o regime islâmico as interpretar como uma nova operação hostil americana e não como a preocupação da comunidade internacional com a proliferação nuclear.
O que ninguém deseja, dizem analistas e diplomatas, é a repetição dos desgastantes 12 anos de sanções comerciais que a ONU impôs ao Iraque. Ou então uma operação militar contra as instalações nucleares iranianas, dispersas e hoje bem protegidas.
O simples fato de levar o caso ao Conselho de Segurança, sob recomendação da Agência Internacional de Energia Atômica, já significa uma humilhação para os iranianos, com a qual Rússia e China não concordavam.
Diplomatas acreditam que o CS possa vir a emitir advertências durante o período de um ano antes de adotar medidas pontuais que atinjam os dirigentes iranianos e seus familiares. Entre as etapas anteriores haveria, por exemplo, a suspensão de viagens de estrangeiros ao país e o congelamento das contas bancárias iranianas no exterior.
"Evitamos até pronunciar a palavra sanção", diz um diplomata americano baseado em Bruxelas. "Não começamos a discutir o assunto e sabemos que ele será objeto de divergências, mesmo no interior da União Européia." Outro diplomata, um europeu, diz, no entanto, que os governos da UE já trocam idéias sobre o assunto.
Ele resume os próximos passos da seguinte maneira:
1 - O Conselho de Segurança redigiria ainda em março uma declaração em que exortaria o Irã a aceitar o pedido da AIEA para cessar o enriquecimento de urânio e responder às dúvidas daquela agência sobre o caráter pacífico -ou não- do programa nuclear;


Para acadêmico britânico, Irã não sofrerá sanção, por falta de consenso na comunidade internacional; o país exporta muito petróleo

2 - Um ou dois meses depois, o CS aprovaria uma resolução em que fixaria um prazo para que o Irã suspenda o enriquecimento de urânio e ratifique o protocolo do Tratado de Não-Proliferação que abriria todas as suas instalações aos inspetores da ONU;
3 - Somente a partir de então é que as sanções poderiam ser impostas ao regime islâmico.
Mas nesse ponto começa uma outra série de problemas. Alguns analistas acreditam que seja preciso ter estômago para vetar transações comerciais com o quarto produtor mundial de petróleo. O Irã já ameaçou restringir suas exportações, o que semearia o caos no mercado energético global.
Paul Rogers, professor em questões de paz na Universidade Bradford, no Reino Unido, afirma que "sanções não funcionam no caso do Irã pela falta de consenso internacional".
Ele afirma que o Irã foi engenhoso ao assinar grandes acordos comerciais com China, Índia e Rússia. "Nenhum desses países aceitaria um programa sério de sanções ao Irã", diz Rogers.
O regime iraniano tem acusado as cinco primeiras potências nucleares (Estados Unidos, Rússia, Reino Unido, França e China) de tratarem a proliferação com dois pesos e duas medidas. Não se desarmam a si mesmos e se recusam a punir Israel, Paquistão e Índia, hoje integrados ao clube nuclear.
O secretário-geral da ONU, Kofi Annan, previa ontem que Teerã usaria o recente acordo de cooperação nuclear entre os EUA e a Índia para argumentos a seu favor.
O Irã diria também que Washington tenta construir um consenso internacional contra seu governo por meio das Nações Unidas, em contraste com a pulsão unilateral que o levou a invadir o Iraque.
"Tenho sérias dúvidas de que sanções funcionem no caso do Irã", disse David Cortright, co-autor americano de um estudo sobre as sanções da ONU nos anos 90. "Negociar é necessário", diz ele. Medidas pontuais podem ser úteis, mas não se pode falar em amplas sanções como as adotadas contra o Iraque de Saddam.
Os Estados Unidos impuseram em 1979 um embargo ao Irã que prejudicou sua aviação e sua indústria petrolífera. Mas não conseguiram convencer outros países a respeitar a legislação americana que pune os investidores estrangeiros naquele país.
Em resumo, diplomatas acreditam que medidas radicais -como a proibição de vôos comerciais, de venda de armas ou que tendam a limitar o comércio- não estão nos atuais horizontes.
Um diplomata europeu disse haver espaço ao entendimento com os Estados Unidos para a adoção de medidas pontuais, que não levem em conta um dos pilares da visão da Casa Branca, que enquadra o Irã no "eixo do mal".


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