São Paulo, Sexta-feira, 09 de Abril de 1999
Próximo Texto | Índice

PERDIDOS NA GUERRA
Kosovares separados de parentes pedem telefone celular a jornalistas para tentar reunião
Campos de refugiados separam famílias

SYLVIA COLOMBO
enviada especial a Skopje


A procura por familiares se tornou ontem o principal drama vivido pelos albaneses de Kosovo refugiados no campo de Brazda (o nome quer dizer fosso), em Skopje, capital da Macedônia.
A Macedônia, país vizinho à Iugoslávia, recebeu entre 130 mil e 150 mil refugiados vindos de Kosovo, a maior parte após o início dos bombardeios da Otan à Iugoslávia.
O país já avisou que não tem condições de receber mais refugiados.
Na madrugada de quarta-feira, as autoridades macedônias transferiram milhares de refugiados que se encontravam na fronteira com Kosovo para campos no interior do país ou para outros países, como a Albânia e a Turquia.
Como resultado da operação, muitas pessoas afirmam ter sido separadas de seus parentes.
Ada Khan, da ONG (organização não-governamental) britânica "Convoy of Mercy", diz que encontrou vários casos de separação de famílias nos campos de refugiados macedônios.
"Minha mulher está aí fora tentando entrar para me levar para a casa de meus cunhados em Struga (sudoeste do país). Mas a polícia não a deixa entrar", disse à Folha Iramani Tefil, 54, ex-morador de Pristina (capital de Kosovo).
Tefil afirma ter sido separado da mulher e do filho adolescente durante a transferência da fronteira há cerca de dois dias.
"Sei que eles querem me mandar para a Albânia, mas eu não vou de jeito nenhum", disse.
Do lado de fora do campo, Sveruvska, sua mulher, tentava convencer um dos policiais a deixá-la ver o marido.
"Eles reclamam, mas muitos querem tirar vantagem da situação. Inventam que são parentes de gente que está aí, querem levar coisas. Se não controlamos o fluxo, o campo vira uma bagunça", afirmou um policial.
Logo após a transferência dos refugiados anteontem, surgiram rumores de que milhares deles -entre 10 mil e 30 mil- teriam desaparecido, o que foi negado ontem pelo governo macedônio.
"É completamente errôneo dizer que 30 mil pessoas tenham desaparecido. Todos os refugiados que chegaram a nossas fronteiras, legalmente ou não, foram acolhidos", afirmou o ministro do Interior da Macedônia, Pavle Trajavanoc.
Segundo Trajavanoc, a Macedônia está abrigando cerca de 150 mil kosovares, 120 mil deles oficialmente registrados.
O governo afirma ter tirado 48 mil refugiados da região da fronteira com Kosovo: 40 mil teriam sido distribuídos por vários campos no próprio país e 8.000 teriam sido levados para a Albânia e para outros países, como Turquia, Alemanha etc.
Ontem, uma alta funcionária do Acnur (Alto Comissariado da ONU para Refugiados), Sadako Ogata, chegou ao país para verificar a situação dos refugiados de origem albanesa no país.
No campo de Brazda, os refugiados abordavam os jornalistas portadores de telefones celulares com o objetivo de tentar localizar parentes.
"Consegui falar com meu marido depois de três dias, ele foi levado para a Turquia", comemorava uma mulher.
No centro do acampamento, há dois grupos de grandes cabanas, um deles reservado à Cruz Vermelha e outro às tendas de militares da Otan, que cuidam do campo junto com a polícia da Macedônia.
Ao redor, espalham-se as tendas ocupadas pelos refugiados. Cartazes colocados na entrada permitem identificar as famílias que ocupam as barracas.
Várias filas se espalham pelo local. Há a fila da água, distribuída duas vezes por dia pelos soldados da Otan. Há ainda um barbeiro improvisado.


Próximo Texto: Otan centra ação em tanques e tropas
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Agência Folha.