São Paulo, segunda-feira, 09 de maio de 2005

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O FIM DO NAZISMO

Sob pressão internacional, presidente da Rússia aproveita os holofotes para mostrar seu lado estadista

Putin usa festa para melhorar imagem

Kevin Lamarque/Reuters
O presidente russo, Vladimir Putin, mostra o painel de seu carro, um Volga modelo 1956, ao presidente dos EUA, George W. Bush


MÁRCIO SENNE DE MORAES
ENVIADO ESPECIAL A MOSCOU

Sob pressão internacional e em meio a disputas com líderes de outras ex-repúblicas soviéticas, o presidente da Rússia, Vladimir Putin, pretende usar as comemorações de hoje, quando os russos lembram a vitória na Grande Guerra Patriótica (Segunda Guerra Mundial), para melhorar sua imagem no exterior, avaliam especialistas ouvidos pela Folha.
A festa pelo fim da guerra, comemorado na Rússia em 9 de maio, não na véspera (como no Ocidente), porque a rendição nazista foi anunciada na URSS neste dia, "dará a Putin a chance de mostrar seu lado estadista" ante diversos líderes globais num momento em que enfrenta dificuldades na cena internacional, diz Lilia Shevtsova, autora de "Putin's Russia" (a Rússia de Putin).
Afinal, estarão presentes à cerimônia na praça Vermelha -ponto alto da festa que ocorre hoje-, entre muitos outros, o presidente dos EUA, George W. Bush, o recém-reeleito premiê do Reino Unido, Tony Blair, o presidente da Franca, Jaques Chirac, o da China, Hu Jintao, o chanceler (premiê) da Alemanha, Gerhard Schröder, e o premiê do Japão, Junichiro Koizumi.
"Putin encontra-se numa situação controversa. De um lado, ataca a ingerência do Ocidente, sobretudo dos EUA, em assuntos russos para agradar ao público doméstico. De outro, busca mostrar que é um chefe de Estado de estatura global e que faz parte do clube europeu. Obviamente, não é fácil harmonizar as duas posições", analisou Shevtsova, considerada uma das mais influentes analistas políticas russas.
A realidade geopolítica russa atual não é confortável para Putin. A centralização de poder por ele empreendida nos últimos dois anos passou a ser criticada pelos EUA e, em menor escala, pela Europa nos últimos meses. Ademais, ex-repúblicas soviéticas, que, tradicionalmente, faziam parte da zona de influência russa, atravessam um momento de transformações políticas. Três delas, a Geórgia, a Ucrânia e a Moldova, passaram nos últimos anos a privilegiar suas relações com o Ocidente, principalmente com a Europa, deixando para trás sua antiga aliança com Moscou.
"O Ocidente suspeita de certas atitudes de Putin, como o fim das eleições para governador das 89 regiões russas. Contudo, o simples fato de que tantos líderes mundiais aceitem participar das comemorações em Moscou significa que há razões geopolíticas maiores que unem os interesses russos aos ocidentais. Na verdade, não interessa a ninguém transformar a Rússia num inimigo, já que a cooperação de Moscou em temas como a prevenção da proliferação de armas ou a contenção das intenções belicosas da Coréia do Norte ou do Irã é vital", avaliou Harley Balzer, autor de vários livros sobre a Rússia.
A expansão da União Européia para países do antigo bloco comunista só agora começa a ser verdadeiramente digerida por Moscou. Vale lembrar que alguns desses Estados, como a Polônia, estão entre os mais duros críticos das políticas do Kremlin. A ausência nas comemorações do 9 de Maio dos líderes da Lituânia e da Estônia, que entraram na UE em maio passado, e da Geórgia, ilustra a tensão entre o Kremlin e algumas ex-repúblicas soviéticas, que acham que o fim da guerra marcou o início do jugo soviético.
Todavia, isso não significa que EUA e Europa venham a tentar isolar a Rússia. "Putin, Bush e os líderes são políticos pragmáticos e sabem que é mais importante manter boas relações para enfrentar os desafios comuns, como o terrorismo. Não se deve esperar, contudo, uma mudança política real na Rússia", disse Shevtsova.

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