São Paulo, segunda-feira, 09 de junho de 2008

Próximo Texto | Índice

"Farc não têm mais lugar na América Latina", diz Chávez

Venezuelano pede que guerrilha colombiana solte reféns sem precondições

Declarações marcam virada na retórica do presidente, que já manifestou simpatia ideológica pelo grupo, mas vê pressão sobre si crescer


Palácio Miraflores-7.jun.08/Reuters
Chávez acena a simpatizantes durante encontro de seu partido, o PSUV, em Maracaíbo; eleições serão em novembro próximo

FABIANO MAISONNAVE
DE CARACAS

Depois de declarar sua simpatia ideológica pelas Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia) no início do ano, o presidente venezuelano, Hugo Chávez, afirmou ontem que "a guerra de guerrilhas está fora de lugar" na América Latina e exortou o novo líder máximo da organização colombiana, Alfonso Cano, a libertar todos os reféns sem precondições.
"Não justifica ter [refém] na montanha um grupo de gente, sobretudo civis e também militares. Uma montanha não é o mesmo que estar num presídio (...). Chegou a hora de as Farc libertarem a todos, seria um grande gesto humanitário, sem nada em troca. Assim proponho, agora que há um novo chefe à frente do secretariado das Farc", disse Chávez, em seu programa "Alô, Presidente".
"A esta altura, na América Latina, está fora de lugar um movimento guerrilheiro, e isso tem de ser dito às Farc. Queria dizer a [Manuel] Marulanda", afirmou, em alusão ao fundador das Farc, morto em março.
De acordo com o venezuelano, a guerrilha tem servido até de estratégia para os EUA ameaçarem Caracas: "Os guerrilheiros das Farc devem saber uma coisa: se converteram numa desculpa do império para ameaçar a todos nós. No dia em que se fizer a paz na Colômbia, acabará a desculpa do império".

Mediação e reação
Chávez voltou a se oferecer como facilitador das libertações e propôs criar um grupo de países -citou Brasil e Argentina, entre outros- e a Organização dos Estados Americanos para negociar um acordo de paz. "Chegou a hora, Cano."
O tom adotado por Chávez ontem é bastante diferente de seu discurso em 11 de janeiro, logo após ter conseguido a liberação das reféns Clara Rojas e Consuelo González. Na época, ele pediu que as Farc deixassem de ser classificadas de terroristas "porque são forças insurgentes que têm um projeto político bolivariano que aqui é respeitado". A proposta foi rejeitada pelo presidente da Colômbia, Álvaro Uribe, e criticada até por setores da oposição mais simpáticos a Caracas.
Ontem, o governo colombiano se mostrou surpreso com as declarações de Chávez. O ministro do Interior e Justiça, Carlos Holguín, disse que o venezuelano é "um grande defensor e aliado [das Farc], por isso é tão surpreendente que tenha agido dessa maneira". "Mas tomara que as Farc lhe ouçam."
Em março, com a divulgação de relatos que Bogotá diz ter achado nos computadores do líder das Farc Raúl Reyes, morto no início daquele mês, aumentaram as suspeitas sobre a aproximação de Chávez com a guerrilha. Uma das mensagens cita negociações para que a Venezuela emprestasse US$ 300 milhões à guerrilha. Outros textos mencionam reuniões com militares venezuelanos.
Em maio, a Interpol (polícia internacional) constatou que os relatos atribuídos a Reyes não foram adulterados após 1º de março. A perícia não aborda a procedência dos computadores. Pressionado, o presidente venezuelano procurou desqualificar a Interpol, chamando o seu relatório de "palhaçada" e acusando Bogotá e Washington de estarem por trás dos documentos, todos negados por ele.
Desde então, Chávez tem tido mais cuidado ao falar da guerrilha. Quando a morte de Marulanda foi confirmada só comentou brevemente após dois dias, sem elogiá-lo. Finalmente, na cúpula da Unasul (União das Nações Sul-Americanas) em Brasília, em maio, Chávez se aproximou de Uribe, com quem havia prometido nunca mais conversar. Conciliador, assegurou ao colega que nunca dera dinheiro às Farc.


Próximo Texto: Frases
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.