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Crença na "mágica" do consumo moveu o Leste, diz historiador
CLAUDIA ANTUNES
DA SUCURSAL DO RIO
Ao iniciar há 20 anos a derrubada do comunismo, russos e
europeus do Leste nada entendiam de livre mercado, que esperavam que funcionasse como
um passe de mágica para o consumo. Mas a região levará anos
para ter um "capitalismo razoável", diz o historiador russo
Constantine Pleshakov.
Pleshakov, 50, acaba de publicar "Não há Liberdade sem
Pão! e a Guerra Civil que Derrubou o Comunismo", seu sexto livro. Baseado há 11 anos nos
EUA, onde leciona no Mount
Holyoke College, em Massachusetts, ele falou à Folha por
telefone.
FOLHA - O senhor crê que o fim do
bloco soviético era inevitável?
CONSTANTINE PLESHAKOV - Sim e
não. A longo prazo, o enfraquecimento do comunismo era
inevitável. O sistema fornecia
de graça habitação, saúde, educação, relativa segurança nas
ruas. Mas as pessoas queriam
bens de consumo. Os Estados
gastavam muito dinheiro sem
investir suficientemente na indústria de bens. Mas o sistema
na URSS e no Leste Europeu
poderia ter durado muito mais
tempo. O colapso veio mais rápido do que todos esperavam.
FOLHA - E qual foi a causa?
PLESHAKOV - A invasão soviética
do Afeganistão, que minou a estabilidade na URSS, enfraqueceu o Estado. Com as grandes
perdas humanas na guerra, que
foram escondidas do país, a população, incluindo os militares,
se afastou do Estado comunista. Em poucos anos, o Kremlin
perdeu toda a legitimidade.
Quando [Mikhail] Gorbatchev
chegou ao poder [em 1985],
perdeu a chance de acabar logo
com a guerra. Levou três anos.
FOLHA - A maior parte da oposição
no bloco soviético era desorganizada. O que as pessoas queriam e o
que obtiveram?
PLESHAKOV - As pessoas no bloco oriental não tinham uma
compreensão clara do livre
mercado. Não acho que tenham
se dado conta de que havia diferentes opções, que o livre mercado na Escandinávia é muito
diferente do livre mercado nos
EUA. Elas acharam que funcionaria como mágica, que os salários iam subir e começariam a
gastar loucamente. Em poucos
anos, essas ilusões desapareceram, porque não é assim que
funciona, particularmente numa transição do socialismo para o capitalismo. A primeira
consequência é uma grande diferença entre os novos ricos e
os novos pobres. Quando as
propriedades estatais foram
privatizadas, poucos privilegiados ficaram ricos em meses e o
resto da população perdeu participação na riqueza nacional.
Levará décadas para que o capitalismo no Leste Europeu e na
Rússia se torne mais razoável.
FOLHA - O ingresso dos europeus
do Leste na UE não é suficiente?
PLESHAKOV - Claro que foi uma
grande coisa, mas também há
um forte sentimento contra
eles. São vistos como invasores,
cidadãos de segunda classe.
Com a crise financeira, os países do Leste dependem da boa
vontade do Ocidente, como
ocorria quando pediam empréstimos antes de 1989.
FOLHA - Pode-se esperar que a Rússia volte a ser potência mundial?
PLESHAKOV - A Rússia não voltará a ser superpotência, mas é
uma potência importante na
Eurásia, por duas razões. A primeira é seu petróleo e seu gás,
do qual dependem os europeus
e que é cada vez mais exportado
para a China. Em segundo lugar, ela não está disposta a deixar que países como Ucrânia e
Belarus se unam à União Europeia ou à Otan. Nas próximas
décadas o Kremlin vai tentar
reclamar a esfera de influência
do velho império soviético.
Leia a íntegra da
entrevista
www.folha.com.br/093121
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