|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
ANÁLISE
Vitória retumbante pode ser amarga para Putin
RICHARD BALMFORTH
DA REUTERS, EM MOSCOU
O Kremlin conquistou uma vitória eleitoral retumbante, mas
sua campanha habilidosa pode
ter sido um desserviço ao presidente Vladimir Putin, ao relegar
ao segundo plano os reformistas
pró-Ocidente, de quem ele precisa. ""Foi uma vitória", disse a analista Liliya Shevtsova, do Centro
Carnegie, em Moscou, "mas pode
ter sido uma vitória amarga."
Os partidos favoráveis ao Kremlin (incluindo o bloco Rússia Unida, de Putin) conquistaram uma
vitória enorme na eleição de anteontem. O resultado representou
um avanço grande em relação às
fileiras comunistas, mas também
eliminou os adversários liberais
do campo presidencial.
Putin saudou o resultado, dizendo a altos funcionários do
Kremlin que viu a eleição como
mais um passo no caminho da democracia. Entretanto, numa observação que traiu o temor de que
a campanha, bem-sucedida até
demais, possa ter polarizado o cenário político russo excessivamente, o presidente disse a seus
adversários derrotados que as
idéias e o potencial deles seriam
aproveitados para o bem do país.
O resultado da eleição deixou os
partidos pró-Kremlin com uma
maioria próxima dos dois terços
de que precisam para modificar a
Constituição, de modo a autorizar
Putin a cumprir um terceiro mandato de quatro anos.
Alguns analistas disseram que
esse próprio fato pode ser motivo
de constrangimento para Putin,
que, em junho passado, durante
viagem ao Reino Unido, excluiu
categoricamente a possibilidade
de candidatar-se a um terceiro
mandato em 2008 -caso confirme seu imenso favoritismo na
eleição de março de 2004. Esses
analistas dizem que, embora quisesse reduzir a presença dos comunistas e buscasse maioria inequívoca para seus aliados, Putin
esperava conseguir um equilíbrio
de forças mais saudável na Duma.
Em especial, disseram, ele vai lamentar o fato de a bem organizada campanha do Kremlin ter provocado a derrota de dois partidos
liberais que tinham fornecido ajuda especializada crucial para a
aprovação de algumas reformas-chave pelo Parlamento.
A promoção enérgica de reformas econômicas é ponto crucial
da percepção que o Ocidente tem
da Rússia de Putin, especialmente
após a prisão do empresário petrolífero Mikhail Khodorkovsky
por sonegação de impostos e
fraude, e da ambição de integrar a
Rússia a instituições como a Organização Mundial do Comércio.
O partido Yabloko, do economista Grigory Yavlinsky, e a pró-empresariado União das Forças
de Direita (SPS), liderada por Boris Nemtsov, não obtiveram o número mínimo de votos para conseguir assentos na Duma.
"Nos últimos quatro anos, Putin vem basicamente implementando a política econômica defendida pela SPS", disse o analista
Michael McFaul. "Com toda certeza o que ele vem promovendo
não são as idéias do Rússia Unida
sobre reformas econômicas, porque o Rússia Unida não tem
idéias. Foram as idéias do SPS -e
esse partido não estará mais representado na Duma."
Um diplomata ocidental disse
que os líderes do bloco Rússia
Unida, que encabeçou a campanha do Kremlin e agora será a força dominante na Duma, são dirigentes que protegem seus interesses regionais e são leais a Putin,
mas que dificilmente geram idéias
de reforma. "Ironicamente", disse
o diplomata, "o Rússia Unida se
tornou o que existe de mais próximo a um fiador das liberdades democráticas na Duma. Mas o partido não possui visão nem programa, e isso não vai ajudar Putin."
Analistas também chamaram a
atenção para duas outras realidades indesejadas para Putin. Uma
delas é o ressurgimento do ultranacionalista Vladimir Jirinovski,
cujo Partido Liberal-Democrático
vem dando apoio vital ao Kremlin
desde que surgiu no cenário político, em 1993.
Putin também pode estar
olhando com alguma desconfiança para Sergei Glazyev, o popular
co-dirigente do partido Terra-Mãe, que saiu de lugar nenhum
para assumir o quarto lugar na
Duma, pregando políticas nacionalistas e antioligarcas.
Analistas dizem que o Kremlin
deu apoio ao partido de Glazyev
contra os comunistas. Mas eles
afirmam que Putin ainda poderá
ver o ambicioso Glazyev como rival para a Presidência. "Acho que
o presidente não deve estar muito
feliz neste momento", afirmou
ontem o líder do SPS, Boris Nemtsov. "As pessoas no Kremlin estão
percebendo que deixaram o gênio
escapar da garrafa."
Texto Anterior: Rússia: Observadores contestam eleição russa Próximo Texto: Europa: Condenados membros do grupo terrorista grego 17 de Novembro Índice
|