São Paulo, sábado, 09 de dezembro de 2006

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Oposição boliviana pede a Lula que medeie crise

Tensão e protestos aumentam na Bolívia na véspera de cúpula sul-americana

Chávez culpa EUA pelas crescentes manifestações contra Morales; brasileiro diz que não falará sobre problemas do país vizinho

FABIANO MAISONNAVE
ENVIADO ESPECIAL A COCHABAMBA

Não são apenas os colegas da região que esperavam ontem a chegada do presidente Luiz Inácio Lula da Silva à Cúpula da Comunidade Sul-Americana de Nações (Casa). Com o acirramento da crise política boliviana, críticos de Evo Morales pediram encontros com o brasileiro para discutir o impasse entre governo e oposição sobre a Assembléia Constituinte e a nova lei de reforma agrária.
Até ontem, haviam solicitado audiências em separado com Lula o líder opositor de centro-direita Samuel Doria Medina, que iniciou a onda de greve de fome que já chega a 1.883 pessoas, segundo seu partido, Unidade Nacional (UN); o governador de oposição de Cochabamba, Manfred Reyes Villa, e sojicultores brasileiros radicados em Santa Cruz e alinhados com a poderosa CAO (Câmara Agropecuária do Oriente), contrária ao projeto agrário do governo.
Até ontem à tarde, nenhum pedido havia sido respondido -na agenda de Lula, estavam apenas encontros com Morales e com a presidente chilena, Michelle Bachelet, além de uma provável reunião com o presidente eleito da Nicarágua, o esquerdista Daniel Ortega, que vem como convidado.
"Lula é próximo de Morales e pode ajudar", disse à Folha Doria Medina, terceiro colocado nas eleições presidenciais do ano passado.
"Ele pode ressaltar a Morales a importância das mudanças de forma democrática, e não a pontapés."
Além deles, o ex-presidente Eduardo Rodríguez, antecessor de Morales, enviou uma carta a Lula expressando preocupação com a crise boliviana e insinuando alguma forma de intervenção brasileira. "Como o senhor sabe, renovaram-se em meu país velhos problemas que dividem os bolivianos", escreve Rodríguez na carta, à qual a Folha teve acesso.
"Acredito que os chefes de Estado que forem ao encontro de Cochabamba concordarão em propiciar que na Bolívia se aceite o diálogo como meio para superar diferenças e como uma maneira de preservar a continuidade institucional."
Ao chegar a Cochabamba ontem no final da tarde, Lula evitou comentar a crise boliviana, mas mostrou apoio a Morales: "Permita-me não dar nenhum palpite sobre os problemas internos do país", disse no aeroporto, ao ser questionado por um jornalista boliviano.
"Todo mundo sabe o que penso sobre a vitória de Evo Morales, todo mundo sabe do significado da vitória de Morales para o mundo e para os amantes da democracia."
Menos diplomático, o presidente Chávez disse, antes de embarcar para a Bolívia, que a crise é culpa de uma aliança entre a direita e os EUA e advertiu que "a Venezuela não ficará de braços cruzados".
"Ajudar Evo é uma responsabilidade de todos os revolucionários deste continente, de todos os homens e mulheres que trabalhamos por um mundo melhor", afirmou, classificando a oposição de "a extrema direita pró-imperialista que tem mantido a Bolívia escravizada por 200 anos".
No início de seu governo, em 2003, Lula atuou em situação semelhante na Venezuela, que vivia um impasse entre Chávez e seus oponentes. Na época, o Brasil comandou a criação do Grupo de Amigos da Venezuela, cujo trabalho resultou no referendo sobre a permanência do presidente, em 2004.

Violência
A tensão aumentou ontem em Santa Cruz, onde o governador Rubén Costas lidera uma greve de fome contra a imposição do sistema de votação por maioria simples na Assembléia Constituinte, o que livra o MAS (Movimento ao Socialismo) de negociar com a bancada oposicionista, que exige a aprovação por dois terços de todos os artigos da nova Carta.
Ontem, os líderes preparavam os detalhes para um encontro de massa com o objetivo de declarar a "autonomia" ou mesmo a independência do departamento mais rico do país.
Entre a noite de quinta e ontem, em ataques separados, desconhecidos atiraram contra a casa do presidente do Comitê pró-Santa Cruz, Germán Antelo, um dos principais líderes dos protestos, contra um dirigente do MAS e contra a ONG Cejis, de apoio a Morales.
Depois dos ataques, o presidente determinou o fechamento de todos os escritórios de órgãos federais em Santa Cruz.
Embora a situação em Cochabamba seja politicamente mais calma, a organização da cúpula teve de se desdobrar para minimizar os danos causados pela forte chuva de anteontem, que matou quatro pessoas e inundou a região onde está sendo realizado o encontro.
A enchente chegou a atingir o centro de imprensa, danificando computadores. Houve falta de água durante parte do dia.


Com agências internacionais


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