São Paulo, sábado, 10 de janeiro de 1998.




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O INÍCIO DO FIM
No poder desde 1966, o presidente indonésio começa a enfrentar desafios devido à crise econômica
Indonésios pedem renúncia de Suharto

JAIME SPITZCOVSKY
Editor de Exterior e Ciência

O segundo dirigente há mais tempo no poder em todo o planeta, o presidente indonésio, Suharto, 76, começa a enfrentar sérios desafios a sua permanência no governo, iniciada em 1966. A grave crise econômica que castiga o país levou um dos principais jornais da Indonésia a estampar, em sua primeira página, apelos para que Suharto renuncie.
O "Jakarta Post", principal jornal em inglês do arquipélago, desafiou o regime indonésio, conhecido por simular eleições que perpetuam o Golkar, partido de Suharto, no poder. Participa do jogo político apenas a "oposição tolerada", e o presidente não costuma admitir que seja questionada sua supremacia imperial.
O "Jakarta Post" trouxe cartas de intelectuais e até de um ex-ministro, pedindo o fim da era Suharto. Os textos argumentavam que o presidente não reúne mais condições físicas e políticas para governar num momento de crise aguda.
O desafio das páginas do "Jakarta Post" se soma a uma pequena manifestação realizada ontem em Jacarta (capital) e a um apelo lançado na quinta-feira. Outro grupo, de generais da reserva e intelectuais, também pediu a renúncia.
Rumores sobre um enfraquecimento da saúde de Suharto e sua eventual incapacidade de governar alimentam o clima de incerteza.
O ministro da Informação, R. Hartono, chegou a dizer ontem que um golpe militar "nunca ocorrerá".
Os militares são o principal alicerce de apoio do regime de Suharto, que chegou ao poder depois de derrubar Sukarno, o líder da independência da Indonésia, em 1965. No ranking de permanência no poder, Suharto perde apenas para o cubano Fidel Castro, que reina desde 1959.
Suharto busca demonstrar, em aparições públicas, que reúne energia para governar o quarto país mais populoso do planeta (200 milhões de habitantes).
Ele se esforça para desfazer os rumores que se intensificaram depois que seus médicos recomendaram "repouso" no mês passado.
Naquele momento, boatos de uma quartelada envolveram o país. Chefes militares, com medo do caos num arquipélago multiétnico, derrubariam Suharto.
O presidente ensaia uma ofensiva de imagem, para mostrar que mantém as rédeas do poder. Na terça, orquestrou um discurso de 55 minutos, para anunciar o Orçamento. Aparentava boa forma para um homem de sua idade.
No entanto, não é apenas a idade e a saúde de Suharto que despertam preocupações nas ilhas indonésias. O presidente, conhecido por seu estilo autocrático, sempre evitou cultivar sucessores, o que deixa ainda mais imprevisível o futuro de um país pressionado por dificuldades econômicas, tensões religiosas (entre a maioria muçulmana e a minoria cristã ou budista) e separatismo (resistência em Timor Leste).
A eleição presidencial está marcada para março, quando a Assembléia Consultiva do Povo, num jogo de cartas marcadas, oferecerá o sétimo mandato a Suharto.
Mas o agravamento da crise econômica pode significar mudanças políticas impensáveis há até pouco tempo. Primeiro, deve pressionar Suharto a anunciar o seu candidato a vice com certa brevidade.
O próximo vice-presidente é visto como natural sucessor de Suharto, que cultiva uma cortina de fumaça sobre sua futura escolha.
Antes do furacão econômico, especulava-se que um dos seis filhos do presidente poderia ser o próximo vice, forma de garantir a dinastia. Agora, já se fala na possibilidade de um "governo coletivo", formado por militares, assumir o controle ainda este ano.



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