São Paulo, quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

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Possíveis sanções são obstáculo à visita de Lula a Teerã em maio

CLÓVIS ROSSI
COLUNISTA DA FOLHA

A evolução da crise entre o Irã e as grandes potências ocidentais complica enormemente a visita que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva já agendou para maio a Teerã. Complicará mais ainda se forem adotadas novas sanções contra o Irã, como cobram 4 dos 6 países que negociam a questão nuclear com o Irã (EUA, França, Reino Unido e Alemanha; as dúvidas são a Rússia, que já acenou com a aceitação de novas punições, e a China que, como o Brasil, não acredita que sanções sejam o melhor caminho).
Nesse caso, o Brasil, conforme a Folha apurou, acatará as punições, por terem sido adotadas no âmbito adequado, o Conselho de Segurança das Nações Unidas, de que o Brasil é hoje membro, embora não permanente e, por isso mesmo, sem direito a veto.
O chanceler iraniano Manoucher Mottaki já foi avisado pelo governo brasileiro de que o país será obrigado a acatar a decisão do CS da ONU, mesmo entendendo que sanções não são o melhor caminho para resolver a crise. O Brasil defende o diálogo, e seus diplomatas têm conversado com todas as partes envolvidas, aproveitando ser "de confiança" dos dois lados, pelo menos na visão do chanceler Celso Amorim.
Confiança, aliás, é a palavra-chave, na visão da diplomacia brasileira, para encaminhar a questão nuclear. É tamanha a desconfiança hoje que os iranianos argumentavam que uma das razões para não aceitar enviar seu urânio pobremente enriquecido para a Rússia e a França, que o devolveriam enriquecido ao nível necessário para usos medicinais, era o temor de não recebê-lo de volta.
Temem, portanto, o roubo puro e simples de seu material nuclear, o que seria insólito.
Mas é possível que a confiança do Brasil na palavra das autoridades iranianas também tenha sido afetada pelo anúncio de que o Irã decidiu enriquecer ele próprio o seu urânio até os 20%. Acontece que, faz apenas 15 dias, o chanceler Mottaki havia apresentado a Celso Amorim "novas ideias" a propósito do envio de urânio.
Nem Amorim nem Mottaki entraram em detalhes naquele momento mas, posteriormente, a Folha apurou que as "novas ideias" giravam em torno de "tempos e quantidades". Tempos significa o prazo que o Irã consideraria aceitável para receber de volta o urânio já enriquecido. Quantidade é, obviamente, o volume a ser enviado para o exterior.
Uma primeira proposta iraniana, depois retirada, falava em dois terços da produção iraniana de urânio pobremente enriquecido, durante um ano. Depois, falou-se em envios fracionados, à base de 400 quilos cada remessa.
A Folha não conseguiu saber que tempos e que quantidades Mottaki mencionou a Amorim, se é que desceu a tais detalhes. Mas é evidente que a decisão de enriquecer o urânio no próprio país joga no lixo as "novas ideias" apresentadas pelo chanceler iraniano a seu colega brasileiro, o que, em tese, é uma demonstração de que o Brasil tampouco é muito confiável aos olhos do Irã.


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