São Paulo, quinta-feira, 10 de agosto de 2006

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"Por insegurança, Raúl Castro não vem a público"

Ex-analista da CIA diz que irmão do ditador cubano tem problemas com bebida

Na agência de espionagem, Brian Latell seguiu Cuba por três décadas; ele diz que política da ilhanão muda enquanto Fidel "respirar"


SÉRGIO DÁVILA
DE WASHINGTON

Fidel Castro está vivo? Onde está Raúl Castro? Principalmente, quem é Raúl Castro? Brian Latell sabe responder às duas últimas perguntas que todos se fazem hoje -inclusive o presidente George W. Bush- e tem palpites sobre a primeira.
Analista do regime cubano desde 1964, quando entrou para a CIA, a agência de inteligência norte-americana, e onde ficou por três décadas, é o autor da considerada mais completa biografia não-autorizada de Raúl Castro, "After Fidel" (depois de Fidel, 2005). Membro do Center for Strategic and International Studies (CSIS), em Washington, Latell deu entrevista exclusiva à Folha ontem.

 

FOLHA - Onde está Raúl Castro?
BRIAN LATELL -
Está esperando para ver o que acontecerá com seu irmão. Está relutante em vir a público e dizer qualquer coisa porque não está seguro, não sabe realmente o que vai acontecer. Talvez Fidel esteja em uma situação tão ruim que venha a morrer muito em breve. Talvez Fidel, por outro lado, se recupere e fique são o suficiente para fazer aparições públicas. Se isso acontecer, será ele, e não Raúl, que fará a primeira. Raúl nunca foi de fazer aparições.

FOLHA - Bush se disse "surpreso" pela internação de Fidel. Por que os serviços de inteligência não o informaram? Onde estão os espiões?
LATELL -
(Risos) A saúde de Fidel sempre foi um segredo de Estado. Em mais de 48 anos, ele nunca admitiu nem que tivesse uma gripe. Eu sei de outras ocasiões em que ele correu risco de morte, mas isso nunca foi assumido publicamente. Essa é a política de Fidel e do governo cubano. E, na verdade, ele é tão protegido e anda com um círculo tão pequeno e controlado de pessoas que esse tipo de segredo é fácil de guardar. Mas nós sabíamos que a saúde dele estava se deteriorando rapidamente. Sabemos desde o ano passado que ele tem Parkinson. Sabemos que ele caiu e quebrou um osso por conta da doença e nós o vimos em público desmaiando e perdendo o equilíbrio.

FOLHA - Os serviços de inteligência negligenciaram Cuba depois do 11 de Setembro?
LATELL -
É verdade que o Oriente Médio e as organizações terroristas passaram a ter prioridade na comunidade americana de inteligência, mas não acho que negligenciar seja a palavra adequada. Cuba ainda é importante para o governo americano.

FOLHA - O sr. descreve Raúl Castro em seu livro como um alcoólatra não-recuperado.
LATELL -
Ele deveria cuidar de si mesmo e parar de beber. Se continuar bebendo pesadamente, não sei o que acontecerá quando tiver de encarar uma crise, quando tiver de tomar decisões. Se isso acontecer, não creio que conseguirá ficar no poder por muito tempo, terá de renunciar.

FOLHA - Renunciar?
LATELL -
Sim, vai dividir o poder com outros cubanos. Creio que Carlos Lage [integrante do Conselho de Ministros] pode virar o presidente de Cuba, e Raúl continuaria no comando do Partido Comunista e dos serviços de inteligência e segurança. Ele pode querer ainda ter outras pessoas em posições mais visíveis que a dele.

FOLHA - Caso ele seja confirmado no comando de Cuba, mudam as relações com os EUA?
LATELL -
Nada vai mudar até que Fidel morra. Se ele sobreviver a tudo isso e continuar no comando, como um líder emérito, ainda assim vai ser muito difícil para os novos líderes abandonar suas políticas, e isso inclui melhores relações com os EUA. Enquanto estiver respirando, Fidel não quererá isso. Não é o que pensam todos os outros, incluindo Raúl e Lage.

FOLHA - O jornal espanhol "El País" disse que Cuba está sendo governada por uma "junta". Quem está nela?
LATELL -
Quando Fidel escreveu aquela carta concedendo o poder antes da cirurgia, indicou vários outros integrantes a quem deu responsabilidades além de Raúl. Essa é a maneira que Raúl gosta de operar, com uma liderança coletiva.

FOLHA - Como o sr. vê hoje as tentativas da CIA de assassinar Fidel Castro nos anos 60?
LATELL -
Isso não é algo de que eu queira falar. Deixei a CIA e não estive envolvido em nenhuma dessas operações. Em toda a minha carreira lá fui um acadêmico, um analista, não estava envolvido em atividades do dia-a-dia.

FOLHA - Ainda assim, o sr. tem uma opinião sobre o episódio?
LATELL -
Essas coisas nunca deveriam ter sido feitas, são erros. Aconteceram durante o governo Kennedy, que nunca deveria ter feito isso.


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