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DEPOIS DO IMPASSE
Candidato presidencial do Partido Verde diz que foi "uma das condicionais" que definiram a eleição
Nader admite influência na vitória de Bush
Associated Press
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O candidato do Partido Verde Ralph Nader faz campanha para preseidente em Milwaukee, em novembro |
SÉRGIO DÁVILA
DE NOVA YORK
Ralph Nader é o culpado pela
derrota de Al Gore para George
W. Bush nas eleições presidenciais norte-americanas? Desde o
término das eleições, o candidato
do Partido Verde vinha declarando peremptoriamente que não.
Agora, relativiza o discurso. Diz
que "há muitas condicionais na
história" e que ele é "apenas mais
uma delas". Cita o fracasso do democrata Gore em seu Estado natal, o Tennessee, a ausência do
presidente Bill Clinton na campanha e até o candidato ultraconservador Pat Buchanan.
O advogado Ralph Nader, 66,
conhecido mundialmente por seu
papel na defesa do consumidor
desde os anos 60 -a obrigatoriedade do uso de cintos de segurança em carros é uma de suas vitórias-, teve um papel polêmico
nas eleições de novembro.
Por um lado, defendia sua permanência na corrida como uma
oportunidade de crescimento para o Partido Verde, o que efetivamente ocorreu. Por outro, sofreu
críticas duras de setores progressistas por não abdicar de sua candidatura em favor de Gore, que
precisava desesperadamente do
voto verde para derrotar o republicano Bush.
Os republicanos perceberam logo o papel de fiel da balança do
candidato verde e chegaram a pagar anúncios de página inteira
com títulos como "Amigo Verde,
Siga sua Consciência: Vote em
Ralph Nader" em jornais de Estados em que a diferença entre Gore
e Bush era muito pequena.
No final, Nader não conseguiu
seu principal objetivo: obter 5%
do voto nacional (teve 3%) e, com
isso, ter direito a verbas oficiais de
campanha no próximo pleito.
E parece ter eleito Bush. Na Flórida, que, com seus 25 votos no
Colégio Eleitoral, definiu o pleito,
Nader conseguiu quase 100 mil
votos. A vantagem de Bush sobre
Gore no Estado ficou em apenas
537 votos.
Nader fala sobre esses e outros
assuntos na entrevista exclusiva
que deu à Folha, que encerrou
com uma frase em português:
"Precisamos fazer reforma agrária radical!". De volta ao inglês:
"Sério. O Partido Verde é o único
a falar sobre isso nos EUA."
Folha - A pergunta fatal: a derrota de Gore para Bush é mesmo culpa sua?
Ralph Nader - Há muitas condicionais, a minha parte na história
da derrota dele é apenas mais
uma delas. Antes de tudo, Al Gore
deveria ter cuidado melhor do seu
Estado natal, o Tennessee, o que a
maioria dos candidatos consegue
sem nenhuma dificuldade.
Ou quem sabe ter deixado Bill
Clinton ir junto fazer a campanha
em Arkansas. Ele fez uma campanha muito pobre, não se deu bem
nos debates. Al Gore foi seu próprio inimigo nessa eleição, não
precisou de ajuda de ninguém.
Há ainda o problema final na
Flórida. O condado de Palm
Beach, que é um condado controlado pelos democratas, não conseguiu recontar os votos em tempo de pegar o prazo da Suprema
Corte. São tantas condicionais...
Por exemplo, o que teria acontecido se Pat Buchanan não tivesse
concorrido? Bush teria ganho
Winsconsin, Iowa e Novo México
e teria vencido a eleição. Gore
venceu nesses Estados por apenas
17 mil votos, e Bush perdeu por
causa de Buchanan.
Folha - O sr. continua achando
que o país seria o mesmo se governado por Bush ou por Gore?
Nader - Na política externa não
haverá nenhuma diferença. Na
política interna, na maioria dos
assuntos, idem. A maioria das
coisas ficaria igual com um ou
com outro. O Tesouro, o Departamento de Defesa, as agências reguladoras federais estiveram pior
com a dupla Clinton-Gore, acredite, do que com Reagan-Bush
(pai do presidente eleito) dez anos
antes. Você pode dizer que haveria alguma diferença em questões
ambientais. De retórica, eu digo.
Gore fala muito do aquecimento
do planeta, mas ele e Clinton não
fizeram nada para impedir que os
carros soltem a fumaça que provoca o fenômeno. Os dois não fizeram absolutamente nada em oito anos sobre este assunto. Nem
Bush pode fazer algo pior que isso.
Folha - Vendo o novo gabinete de
Bush, é difícil concordar que não há
nenhuma diferença.
Nader - O.k., há diferenças, na
natureza do corte de impostos, na
Previdência Social e em alguns
outros assuntos, como as florestas
nacionais. Mas a razão das muitas
semelhanças é que as grandes corporações comandam o governo,
não importa quem esteja sentado
na cadeira oficial. Elas pagam pelas campanhas nos dois partidos,
colocam os próprios executivos
no governo. E isso aconteceu
mesmo no governo Clinton-Gore.
Veja o Robert Rubin: ele era de
Wall Street e foi secretário do Tesouro. E as corporações têm 22
mil lobistas em Washington. São
muito mais elas que comandam a
capital do que o Partido Republicano ou o Democrata.
Folha - O sr. ou o Partido Verde
aceitaria um convite para participar do governo Bush?
Nader - Não. E não aceitaria nem
se o vitorioso fosse Al Gore.
Quanto a outras pessoas do partido, cabe a elas tomar essa decisão.
Folha - O sr. pretende concorrer
de novo em 2004?
Nader - É muito cedo para dizer.
O que eu pretendo fazer é construir o Partido Verde, que é muito
pequeno no mundo inteiro. Ocorrerá uma convenção global dos
Partidos Verdes em Canberra, na
Austrália, em abril. O Partido
Verde brasileiro vai estar lá, assim
como os de outros países da América do Sul. Pretendo também
atrair novos candidatos para cargos municipais e estaduais nas
eleições de 2001 e 2002.
Folha - No balanço final, a impressão que dá é a de que o Partido
Verde mais perdeu em imagem do
que ganhou em tamanho passadas
as últimas eleições. O sr. concorda?
Nader - Antes de tudo, é importante dizer que os democratas só
ganharam duas novas cadeiras no
Senado por causa do Partido Verde. Não havia nenhum candidato
verde para o Senado, então as pessoas que decidiram votar em mim
para presidente acabaram optando por Maria Cantwell no Estado
de Washington, por exemplo.
Folha - Mas a plataforma dos verdes, basicamente de causas ambientais, não está fadada a atingir
mesmo poucas pessoas?
Nader - Discordo. E mesmo que
seja um partido que atinja poucas
pessoas, vai ter influenciado o
Partido Democrata, e isso já é um
grande avanço. Na última eleição,
mandamos uma mensagem a
eles: se vocês não começarem a
ser mais progressistas e menos
corporativistas, vão perder cada
vez mais votos para os verdes, e isso pode custar mais cargos e cadeiras importantes.
Folha - Qual a sua avaliação do
imbróglio na Flórida? Não está na
hora da reforma eleitoral?
Nader - Sei que a confusão na
Flórida deu ao Brasil um legítimo
complexo de superioridade. Ouvi
dizer que algumas pessoas do seu
país queriam mandar observadores para vigiar as eleições dos
EUA (risos). É verdade, vocês têm
um esquema de eleição muito
mais moderno do que o nosso.
O problema na Flórida mostrou
ao país e ao resto do mundo como
a máquina eleitoral do país é obsoleta e discriminatória com os
pobres e as minorias, principalmente os negros. No final, vai
obrigar o país a fazer uma reforma que já era necessária.
Folha - Foi também a eleição presidencial mais cara da história.
Quanto o sr. gastou?
Nader - Menos de 1% do que
Bush e Gore gastaram: US$ 8 milhões, e nenhum centavo vindo de
corporações. Nada de "soft money" (doações não-declaradas
que se aproveitam de uma brecha
na legislação atual) para o Partido
Verde. Todo o dinheiro foi doado
por indivíduos ou obtido em comícios. O de Nova York foi o comício político que mais arrecadou
dinheiro em qualquer eleição para presidente. Lotamos as maiores arenas do país, fizemos muito
mais dinheiro dessa maneira do
que Bush e Gore juntos. Nossas
doações de campanha foram um
modelo de reforma a ser seguido.
Democratas e republicanos enfrentaram muitas denúncias de
corrupção nas arrecadações de
campanha, mas nenhum editorialista de nenhum jornal teve a
grandeza de dizer que o Partido
Verde estava fazendo tudo como
devia ser feito.
Folha - O sr. tem contato com o
Partido Verde brasileiro?
Nader - Sim. Conheço o deputado Fernando Gabeira, sei do trabalho dele, mas ainda não o encontrei pessoalmente.
Colaborou Teté Ribeiro, especial para a
Folha, em Nova York
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