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CALIFÓRNIA
Apesar de quebrar promessas de campanha, ex-ator mantém popularidade e recebe elogios até da oposição
Carisma move o governo Schwarzenegger
VITOR PAOLOZZI
DA REDAÇÃO
Com menos de dois meses como governador da Califórnia, Arnold Schwarzenegger já descumpriu promessas feitas antes da
eleição, já voltou atrás de decisões
tomadas e nem sequer preencheu
todos os cargos do governo. Em
resumo, não conseguiu se distanciar muito da "política habitual"
contra a qual baseou toda a sua
campanha. Nem por isso seu
prestígio sofreu qualquer abalo.
Ao contrário, de políticos oposicionistas até imprensa e população, a maioria parece estar encantada com o novo líder.
A eleição de Schwarzenegger
deve-se em grande parte ao fracasso do governo anterior, do democrata Gray Davis, cuja administração foi incapaz de lidar com
graves crises econômica e energética. Na última terça-feira, ao fazer o seu primeiro discurso sobre
o "estado do Estado", Schwarzenegger exibiu um tom otimista:
"Eu não lutei por este cargo para
cortar, mas para construir".
Anteontem, porém, ao apresentar a sua proposta de orçamento
para o Estado, o que se viu foi
uma sucessão de cortes para enfrentar um déficit estimado em
US$ 14 bilhões. "É difícil. É doloroso. É a única maneira, porque
não temos dinheiro", disse em entrevista coletiva.
Algumas das medidas adotadas
no início do governo provocaram
passeatas de minorias. Um dos
protestos que enfrentou foi em
decorrência do anúncio da sua
disposição de cortar cerca de US$
280 milhões de programas para
deficientes. Diante da inesperada
resistência, voltou atrás.
Schwarzenegger prometeu na
campanha que contrataria investigadores para apurar as acusações de que teria assediado sexualmente diversas mulheres.
Após tomar posse, disse que não
mais faria isso pois precisava se
concentrar na crise orçamentária.
Vinho e charutos
À frente do Executivo, no entanto, Schwarzenegger vem demostrando uma grande habilidade
política. No mês passado, conseguiu uma importante vitória ao
fechar um acordo para a emissão
de títulos públicos no valor de
US$ 15 bilhões, destinados a impedir que o governo fique sem dinheiro em caixa a partir de junho.
Schwarzenegger chamou um
grupo de parlamentares democratas e republicanos e depois de
longas negociações, entre charutos e vinho, conseguiu o compromisso. Um deputado chegou a dizer que o governador tinha mais
determinação e poder de persuasão do que um vendedor.
Os deputados saíram do encontro derramando elogios e contando que, além de política, conversaram sobre cinema. Também tiraram fotos e ganharam charutos
que traziam um selo com o nome
de Schwarzenegger.
Ao mesmo tempo em que busca
criar amizades com os parlamentares -é capaz de chamar um deputado de primeiro mandato para tomar uma cervejinha e convida outros para viajar em seu jato
particular-, o governador também coloca pressão sobre o Legislativo. Schwarzenegger adotou a
filosofia de "campanha perpétua"
e viaja pelo Estado fazendo comícios em busca de apoio para suas
iniciativas. Não raro faz críticas
aos legisladores no palanque.
O governador ainda emite sinais de que, se não encontrar
apoio na Assembléia e no Senado
do Estado, poderá atropelar as
Casas, fazendo com que suas propostas sejam adotadas através de
referendos populares.
Até agora, Schwarzenegger não
enfrenta resistências do Legislativo, mas a diretora do Instituto para o Estudo de Política e Mídia da
Universidade Estadual da Califórnia em Sacramento, Barbara
O'Connor, tem dúvidas se essa estratégia pode durar muito: "Ele
precisa ter cuidado quanto a dizer
uma coisa para os parlamentares
e depois ir aos distritos deles e fazer um discurso com críticas a
eles antes das votações. O tempo
dirá se ele vai continuar assim".
Schwarzenegger não se encaixa
no figurino republicano típico.
Muitas de suas opiniões são mais
próximas às dos democratas: ele é
a favor do aborto e do controle de
armas e tem simpatia pela proteção ao ambiente. "Está ficando
claro que ele é mais moderado do
que muitos membros da sua equipe", diz a senadora estadual democrata Dede Alpert.
Alguns dos textos publicados
sobre Schwarzenegger na mídia
americana remetem, pela semelhança das descrições sobre seu
carisma, a ninguém menos do
que o ex-presidente Bill Clinton,
considerado um mestre da arte
política pela maneira íntima e informal que trata seus interlocutores. Schwarzenegger às vezes conversa com deputados com as roupas que acabou de usar em uma
sessão de malhação.
O ex-Mister Universo, 56, não
abandonou a rotina de exercícios
e passou a frequentar, com a companhia de seguranças, uma academia a quatro quadras da sede
do governo. "Ele é uma pessoa
bastante sociável, fala com todos e
já interrompeu o que estava fazendo para ajudar outros nos seus
exercícios", diz Rick Leonard, diretor do Capitol Athletic Club.
Até agora, pelo menos, toda essa simpatia está sendo capaz de
deixar em segundo plano o descompasso entre o candidato
Schwarzenegger e o governador
Schwarzenegger. "As pesquisas
de opinião estão sendo bastante
favoráveis a ele. Não se deve esquecer que, já há algum tempo,
existe um ódio muito grande aos
políticos", afirma O'Connor.
Michael Levine, um dos mais
renomados relações-públicas de
Hollywood -por seu escritório já
passaram clientes como Michael
Jackson, Demi Moore e Barbra
Streisand-, acredita que o prestígio atual de Schwarzenegger se
deva a duas coisas: "Uma é que ele
é bastante carismático. A outra é
que ele está substituindo um governador tão ruim que ele, por
comparação, parece ótimo".
Muitos cínicos poderiam dizer
que, se Schwarzenegger conseguiu se transformar num dos
maiores nomes de Hollywood
mesmo sendo um mau ator, não
será exatamente uma novidade se
ele vencer em sua nova carreira à
custa da sua popularidade.
A senadora oposicionista Alpert
discorda dessa visão e adverte
aqueles que tratam como piada a
nova aventura do "último grande
herói": "Ele está fazendo um trabalho bastante razoável até aqui.
Ele é bastante inteligente e tem
um charme muito grande. As pessoas deveriam ter um pouco de
cautela ao subestimar o governador Schwarzenegger".
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