São Paulo, sexta-feira, 11 de janeiro de 2008

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Farc libertam Rojas e Consuelo González

Soltura, anunciada em 18 de dezembro, ocorre após fiasco no fim do ano envolvendo comissão internacional e presidente da Venezuela

Aparentando boa saúde, reféns são levadas a Caracas e agradecem Chávez; as duas trouxeram prova de vida de outros seqüestrados

France Presse
Soltas, Consuelo González (esq.) é amparada pela senadora Piedad Cordoba, e Clara Rojas (dir.), pelo embaixador Sanchez Otero


FABIANO MAISONNAVE
ENVIADO ESPECIAL A BOGOTÁ

Depois de mais de quase seis anos em cativeiro, Clara Rojas e Consuelo González foram libertadas ontem pelas Farc. As reféns foram entregues a uma comitiva liderada pelo governo venezuelano no sudeste da Colômbia, encerrando dois longos dramas familiares com repercussões diplomáticas.
A entrega foi feita numa clareira de selva, no Estado de Guaviare, sudeste do país. Nas imagens da libertação, gravadas apenas pela chavista TV Telesur, Rojas, vestida de camiseta azul e com um colar com a foto de seu filho, Emmanuel, surgiu sorridente e tranqüila. Já González, com camiseta negra, tinha o rosto tenso, entrecortado por sorrisos mais contidos.
As imagens mostram também as duas conversando com o presidente venezuelano, Hugo Chávez, por telefone via satélite, entregue pelo ministro venezuelano do Interior, Ramón Rodríguez Chacín. "Presidente, estamos agradecidas por esse acompanhamento feito a nós. Mil obrigadas, foi uma emoção quando vimos os helicópteros", disse uma Rojas sorridente, antes de entregar o aparelho a González.
"Ai, presidente, mil obrigadas por toda a sua gestão humanitária. Por favor, [o sr.] não pode baixar a guarda, presidente. Os que ficaram lhe mandam essa mensagem", afirma a ex-congressista, seqüestrada em setembro de 2001. As duas trouxeram provas de vida de cerca de dez seqüestrados pelas Farc, entre fotos e vídeos.
A entrega durou cerca de dez minutos e ocorreu em clima de cordialidade. Nas imagens, uma guerrilheira se aproxima de Rojas para se despedir com um beijo. Ela concede, mas rapidamente vira o rosto.González também aparece beijando algumas guerrilheiras e cumprimentando os homens das Farc responsáveis pela entrega.
Em seguida, os guerrilheiros das Farc começam a marchar de volta à selva, acenando com os braços. "Até loguinho todos", diz o chefe da patrulha.
O anúncio da soltura foi feito em seguida pelo próprio Chávez, em Caracas. "Faz dez minutos, recebi uma mensagem diretamente do ponto das coordenadas, que desconheço. Ali, nosso ministro do Interior me disse: "Estamos recebendo Clara e Consuelo das mãos das Farc'", disse Chávez, durante evento oficial, por volta das 11h (13h30 em Brasília).
O presidente venezuelano agradeceu ao governo colombiano, mas voltou a dizer que pretende continuar conversando com as Farc para libertar outros 43 reféns proeminentes, apesar de o presidente Álvaro Uribe ter encerrado sua intermediação em novembro, detonando uma crise diplomática.
"A Venezuela continuará abrindo caminho para a paz na Colômbia. Nós estamos às ordens e seguiremos em contato [com as Farc]. Esperamos que o governo colombiano entenda [...], com o único fim de continuar a liberação de todos reféns, prisioneiros de guerra e, mais além, um dia nos sentar para conversar sobre a paz com [o líder máximo da guerrilha, Manuel] Marulanda", disse.
Mais tarde, durante pronunciamento em cadeia de TV e rádio à noite, o presidente Uribe agradeceu "infinitamente" a gestão de Chávez, mas deixou claro que seu trabalho como mediador nas negociações com as Farc está encerrado.
"Devo reconhecer que foi eficaz o processo levado pelo presidente Hugo Chávez, da Venezuela, que conseguiu a liberação unilateral e incondicional de nossas compatriotas", afirmou Uribe, que em novembro acusara o colega de "legitimador do terrorismo".
Sobre a liberação dos demais seqüestrados, Uribe disse que "está vigente a proposta de zona de encontro feita pela Igreja Católica e que o governo nacional aceitou há algumas semanas". As Farc, no entanto, já rejeitaram esse formato.

Operação discreta
A aterrissagem dos helicópteros na zona indicada pelas Farc ocorreu por volta das 11h locais. Uma hora antes, os helicópteros venezuelanos identificados com o símbolo da Cruz Vermelha haviam decolado de San José, a 390 km de Bogotá.
A operação de ontem teve um perfil bem mais discreto do que a fracassada tentativa de libertação no final do ano passado, em que estavam presentes o ex-presidente argentino Néstor Kirchner e até o cineasta americano Oliver Stone. Desta vez, a comitiva incluía apenas Rodríguez Chacín, o embaixador cubano na Venezuela, Germán Sánchez, a senadora colombiana Piedad Córdoba e membros do Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV).
Toda a operação foi acompanhada de perto pelo governo colombiano, que se comprometeu em não realizar operações militares contra a guerrilha na região entre as 6h e as 18h na zona. Segundo o Ministério da Defesa, os helicópteros pousaram a apenas 2 km de uma unidade militar colombiana.

Emmanuel
A liberação de Clara Rojas não alterará o tempo de transição para que o menino Emmanuel, de três anos e meio, seja devolvido à família da mãe, disse à Folha Janeth Cardenas, porta-voz do Instituto Colombiano de Bem-Estar Familiar. "A única mudança é que, em vez de ser entregue à avó, ele será recebido pela mãe".
Filho de Rojas com um guerrilheiro, Emmanuel foi separado da mãe com poucos meses de idade. Em 2005, o menino foi internado num hospital com saúde delicada pela família a qual as Farc o entregaram.
Registrado como "Juan David", ele foi levado a Bogotá, sob a tutela do ICBF. Na semana passada, um exame de DNA revelou sua identidade, desmentindo a versão das Farc de que ele estaria seqüestrado pela guerrilha e seria devolvido.


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