São Paulo, sábado, 11 de junho de 2011

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros

Escritora turca teme giro autoritário

Meltem Arikan, que já foi censurada na Turquia, avalia que premiê usará vitória para impor Constituição islâmica

Autora diz que é frágil a democracia no país e que preocupação com garantia dos direitos humanos é crescente

DE JERUSALÉM

Embora o êxito econômico e a ampliação da influência regional do país tenham dominado a campanha para a eleição de amanhã na Turquia, a antiga divisão entre islamitas e secularistas continua uma ferida aberta.
Pesquisas apontam triunfo quase certo do Partido Justiça e Desenvolvimento (AK), que deverá conquistar o terceiro mandato consecutivo capitaneado pelo premiê Recep Tayyip Erdogan.
Os islamitas do AK apostam na popularidade do premiê para obter mais de dois terços do Parlamento, o que lhes daria carta branca para reformar a Constituição sem precisar de um referendo.
A possibilidade assusta secularistas como a escritora feminista Meltem Arikan, 43.
Ela já teve um livro censurado pelo governo e vê na concentração de poder nas mãos do primeiro-ministro um risco real de que a Turquia mergulhe no autoritarismo islâmico, conforme ela disse em entrevista à Folha, a seguir.

 


Folha - O temor de a reforma da Constituição gerar restrições à democracia procede?
Meltem Arikan
- Não está claro que mudanças o premiê Erdogan pretende. Em vez de falar sobre a nova Constituição, ele passa mensagens religiosas à multidão. Outro dia disse na TV que deseja o sistema presidencial.
O que entendemos de suas palavras é que há uma preparação para uma Constituição islâmica autoritária baseada no sistema presidencialista.
Na Turquia, o conceito de democracia foi esvaziado. O número de pessoas preocupadas com a destruição dos direitos humanos mais básicos cresce a cada dia.

Os seculares estão perdendo espaço?
Desde que chegou ao poder, o AK diz defender uma forma de democracia que se ajuste às normas da União Europeia. Grande parte da sociedade confiou que o AK iria conduzir a Turquia à UE.
Ao longo do tempo, as declarações do AK sobre democracia se voltaram contra os seculares e favoreceram o movimento político islâmico.
A preocupação é maior entre as mulheres. A polarização cresceu e se consolidou. Às vezes o governo instiga essa polarização. A Turquia está certamente dividida.

Por que a preocupação é maior entre as mulheres?
Desde que o AK chegou ao poder, o número de mulheres assassinadas na Turquia aumentou 1.400 %.
Não quer dizer que o governo seja assassino de mulheres, mas Erdogan faz política à custa das mulheres, além de dizer que homens e mulheres não são iguais.
A atmosfera sociocultural criada pelo premiê e seu partido, que apoia fortemente a sociedade dominada pelo homem, trivializou as mulheres. Segundo a Organização Mundial de Saúde, 20% das mulheres nos EUA sofrem violência doméstica; na Europa, 40%. Na Turquia o índice foi de 58% em 2010.
Como mulher, sinto minha existência na Turquia a cada dia mais ameaçada.
(MARCELO NINIO)


Texto Anterior: Clóvis Rossi: Eleição reforça a estrela da Turquia
Próximo Texto: EUA gastam US$ 2 milhões por dia com operação anti-Gaddafi
Índice | Comunicar Erros



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.