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Muçulmanas de todo o mundo brigam por espaço, defendem o direito da mulher e afirmam: "Submissão, só a Deus"
Mulheres do islã
LUCIANA COELHO
DA REDAÇÃO
Entre a tradição patriarcal vigente em alguns países e o estereótipo negativo que o Ocidente
criou e os extremistas ajudaram a
propagar, as mulheres muçulmanas estão brigando por espaço e
voz. Submissão, fazem questão de
dizer, só a Deus, como prega a
própria definição do islã.
Essa frase foi ouvida exaustivamente pela reportagem da Folha
nas mais de três semanas em que
freqüentou mesquitas, conversou
com instrutores de islamismo, visitou a casa de muçulmanas, consultou analistas, assistiu a aulas
para convertidas e falou com escritoras muçulmanas eminentes.
Azar, Irshad, Saira, Magda e Zineb têm opiniões fortes, falam o
que pensam e são unânimes em
defender os direitos da mulher
muçulmana -condição de todas
elas. Dividem-se, no entanto, ao
apontar onde está o problema.
Para umas, está no próprio Alcorão, que dá margem para interpretações desfavoráveis à mulher.
Para outras, está nos homens, que
distorcem as palavras do profeta
Muhammed, ou ainda nos regimes que, como disse a escritora
iraniana radicada nos EUA Azar
Nafisi, fizeram da religião ideologia e a impuseram a quem não
quer segui-la. Para todas, a saída é
a educação e a capacitação.
Buscar o conhecimento é dever
de todo muçulmano e muçulmana, ainda que, em muitos países
islâmicos, ele seja negado a boa
parte das mulheres. O problema,
para Zineb Touimi-Benjelloun,
conselheira da Unifem (fundo da
ONU para mulheres) para o norte
da África, é de interpretação.
"Quando o islã surgiu, há 1.400
anos, ele era liberal para as mulheres. Havia nele mais direitos do
que qualquer outra mulher tinha.
Mas veio o patriarcalismo, e as
coisas começaram a ser interpretadas de um modo limitado."
Agora, as mudanças de interpretação começam a tomar o rumo contrário, embora lentamente. A Unifem tem investido para
capacitar as mulheres em países
islâmicos, por meio de financiamentos e educação, para que elas
promovam as mudanças por si.
Boa parte dos empecilhos, como a falta de liberdade de expressão, é imposta pelas teocracias
-alvo das maiores críticas das
muçulmanas. "Mesmo quando a
maior parte da população segue
uma religião, nem por isso ela
quer que essa religião vire o governo", diz Azar, cujo livro, "Lendo Lolita em Teerã", recém-lançado no Brasil pela editora A Girafa,
é o mais vendido nos EUA, segundo o "New York Times".
Como as demais, a iraniana se
queixa do estereótipo negativo
que o Ocidente criou para as muçulmanas -e que governos
opressores ajudaram a fortalecer.
A indumentária que muitos ocidentais vêem como sinônimo de
opressão é, para muitas muçulmanas, uma manifestação de fé. A
jornalista britânica de origem afegã Saira Shah, autora de "A Filha
do Contador de Histórias" (Companhia das Letras), conta que, durante sua passagem pelo Afeganistão, em 1997, era comum mulheres de burca lhe indagarem se
as ocidentais não se sentiam oprimidas usando roupas escassas e
atraindo olhares masculinos voluptuosos. Mas ela vai ao ponto.
"Se elas querem usar véu e só cuidar da casa, ótimo. Mas as pessoas
devem ter o direito de escolher."
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