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RELIGIÃO
Comissão ligada ao Vaticano debate se criança sem o batismo vai para o limbo
Teólogos discutem destino de criança pagã após a morte
FÁBIO CHIOSSI
DA REDAÇÃO
Em reunião da Comissão Internacional de Teologia realizada na
última semana, no Vaticano, seus
29 membros trataram, entre outros assuntos, do limbo.
Comumente conhecido como
lugar para o qual, de acordo com a
doutrina católica, vão as crianças
que morrem sem ser batizadas, o
limbo não é um dogma, ou seja,
não é um ponto sobre o qual não
cabe discussão na igreja.
Segundo o padre Geraldo Luis
Hackmann, o único membro brasileiro dessa comissão, que é o
principal corpo consultivo da
Congregação para a Doutrina da
Fé, o limbo surgiu nas discussões
como um assunto derivado de
outra questão, mais importante,
que é a "sorte das crianças que
morrem sem batismo".
O assunto fundamental é o que
acontece com essas crianças, diz o
padre Hackmann, que é professor
de teologia dogmática da PUC-RS, afirmando que o limbo entra
como uma questão vinculada a
essa.
Salvação
Quem explicou à Folha a relação entre o limbo -que parte da
imprensa internacional chegou a
dizer que poderia estar "chegando ao fim"- e o batismo foi o padre João Batista Libânio, jesuíta,
teólogo, professor do Instituto
Santo Inácio, em Belo Horizonte.
De acordo com a tradição católica, disse o padre Libânio, só adquirem a salvação eterna as pessoas que receberam ou o batismo
da água -que é um sacramento
da igreja-, ou o batismo do sangue -que é o martírio-, ou o
batismo "do desejo". Este último,
diz o teólogo, é o de pessoas adultas que praticam a justiça de Deus.
"Quem não cumprir uma dessas
três condições", diz o padre Libânio, "não se salva."
Surge então a questão da criança que morre sem ser batizada
(pela água), que não foi martirizada e que não pôde ter sido batizada pelo desejo, pois não atingiu a
idade em que toma consciência
da ação justa. O que acontece com
ela?
De acordo com o professor do
Instituto Santo Inácio, "há dois
destinos possíveis". Um deles é a
condenação, mas essa visão não é
aceita pela teologia hoje, por ser
"muito violenta". Então a criança
segue para o outro destino possível, que é o limbo.
O limbo é um lugar neutro. "Nele, a criança nem sofre nem está
no céu, mas teria a felicidade natural, como a que nós temos aqui
na Terra", diz o pare Libânio. Felicidade essa, deve-se ressaltar, diferente da que vem com a salvação, a qual "supõe a graça de
Deus".
Escolhas
Porém, afirma Libânio, muitos
teólogos crêem que não exista o
limbo.
Nesse caso, o que aconteceria,
então, com as crianças mortas antes do batismo?
Entre as diversas correntes de
reflexão sobre esse problema, o
padre Libânio afirma que a mais
comum é a que reza que seria oferecida a elas, no momento da
morte, a opção pela salvação eterna -mas como uma criança, que
não chegou ao nível da consciência, pode escolher algo, ainda
mais se quer ser salva para sempre ou não?
Ao morrer, responde o padre, a
pessoa se liberta das limitações da
vida terrena, e passa a ser capaz de
enxergar claramente o bem e o
mal -independentemente da
idade com a qual tenha morrido.
Em face dessa opção, a criança escolheria, claro, a salvação eterna.
Assim, em não havendo o limbo, o batismo pela água tem sua
importância relativizada: "Para
que batizar a criança se ela, ao
morrer antes do batismo, pode se
salvar?", pergunta o padre Libânio -pergunta essa retórica, pois
Libânio diz que a verdadeira importância do batismo é iniciar a
educação católica da pessoa, e não
salvá-la do pecado original.
O padre Hackmann diz que não
há uma corrente dominante na
teologia acerca do destino das
crianças que morrem sem ser batizadas, e que é para definir isso
que esse é um dos temas que a Comissão Teológica Internacional
está discutindo.
Em progresso
Sobre os rumos dessa discussão,
o padre Hackmann disse que não
pode adiantar nada: "Ela ainda está em progresso". E a próxima
reunião de seus membros será
apenas em outubro de 2006, antes
de quando nenhuma conclusão
sobre o assunto sairá.
O teólogo da PUC-RS diz ainda
que a questão do batismo das
crianças foi escolhido como tema
de discussão da comissão porque
"é um tema que aflige muitos pais
que não tiveram condições de batizar o seus filhos".
Já o padre João Batista Libânio
afirma que o papa João Paulo 2º
não gostava da corrente de pensamento que relativizava a importância do batismo. Para o antecessor de Bento 16, diz o teólogo jesuíta, o batismo da criança deveria ser valorizado por causa da influência das outras religiões na
formação das crianças -obviamente não desejáveis. Eis por que
João Paulo 2º teria pautado essa
discussão.
Já o padre Hackmann diz que o
tema está sendo discutido "pela
necessidade de dar uma resposta
à preocupação, à angústia" dos
pais cujos filhos morrem antes do
batismo.
A atual constituição da Comissão Teológica Internacional foi
convocada para trabalhar no
qüinqüênio de 2004 a 2008. Seus
membros, teólogos de diversos
países, são escolhidos pela Santa
Sé. Os temas que ela debaterá
também. Suas conclusões são recomendações à Congregação para a Doutrina da Fé, que podem
ser acatadas ou não, como informa o vaticanista americano John
Allen Jr. em coluna no site "National Catholic Reporter".
Allen Jr. conta que, em 1977, a
comissão publicou um documento sobre um determinado tópico
que foi mais simpático à Teologia
da Libertação do que a instrução
da Congregação para a Doutrina
da Fé que foi efetivamente promulgada.
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