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São Paulo, quarta-feira, 12 de fevereiro de 2003

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Políticos e mídia dos EUA atacam a França

PATRICK JARREAU
DO "LE MONDE", EM WASHINGTON

A posição adotada por França, Alemanha e Bélgica na Otan elevou a exasperação dos EUA com relação aos aliados europeus contrários à guerra no Iraque.
Indagado se estava com raiva, o presidente George W. Bush respondeu que estava "decepcionado pelo fato de a França impedir a Otan de socorrer a Turquia". ""Creio que isso afete a aliança de maneira negativa", acrescentou o presidente americano. Observando que ""a França é amiga de longa data" dos EUA e que os dois países ""têm muito em comum", Bush lamentou a ""decisão míope" tomada por Paris e disse esperar que ela seja reconsiderada.
Bush atribuiu a culpa do que ocorreu na Otan à França, não à Alemanha ou à Bélgica. O terreno foi preparado por jornais e editorialistas conservadores que, nos últimos 15 dias, vêm se especializando em lançar ataques raivosos não apenas contra o governo francês, mas contra a própria população francesa.
Na semana passada, o jornal conservador ""The Wall Street Journal" publicou em sua página de debates um desenho representando um francês vestindo a boina característica de seu país, mas tendo cabeça de rato.
O semanário neoconservador ""Weekly Standard" já publicou vários artigos e editoriais apresentando o presidente francês, Jacques Chirac, e seu governo como aliados de Saddam Hussein por razões econômicas (petróleo) e os franceses, como anti-semitas.
A ""National Review", outra revista de direita, descreveu os franceses como ""macacos entreguistas, comedores de queijo". O editorialista George Will, que escreve no ""The Washington Post" e na revista ""Newsweek", além de falar na rede de TV ABC, escreveu que o chanceler Dominique de Villepin é um personagem ""seboso" e que ninguém sabe quantos soldados seriam necessários para defender Paris, ""porque faz tanto tempo que ninguém tenta".
O tema da covardia é retomado constantemente nesses ataques, assim como a acusação de que a França teria deixado que as tropas alemãs a invadissem sem opor resistência, em 1940. Na segunda-feira, o jornal ""The New York Post" provocou os franceses em sua primeira página com as palavras: ""Nós nos deixamos matar por vocês!", fazendo referência ao desembarque dos aliados na Normandia, em 6 de junho de 1944.
Colin Powell retomou o espírito das caricaturas antifrancesas no domingo, quando declarou na rede ABC que os inspetores de armas da ONU não têm por função ""brincar de detetive ou de inspetor Clouseau". O inspetor Clouseau é o personagem principal de ""A Pantera Cor-de-rosa", uma série de filmes cômicos em que o ator Peter Sellers, usando bigode e capa, encarna um policial francês pretensioso e ridículo.

"País de segunda classe"
Ontem, o deputado republicano Peter King chamou a França de "país de segunda classe". "Talvez tenhamos de formar uma nova aliança da qual a França não fará parte", disse ele sobre a crise na Otan. "A França se coloca como uma guardiã moral, quando eles teriam perdido a Primeira Guerra Mundial, e eles estabeleceram um recorde na Segunda Guerra com a rendição mais rápida de uma potência mundial", disse King, membro do comitê de Relações Internacionais da Câmara de Deputados dos EUA.
Ao que tudo indica, concentrar os ataques sobre a França parece diminuir, perante a opinião pública americana, as dificuldades enfrentadas pelo governo Bush. ""Os franceses têm acordos econômicos com Saddam Hussein e se opõem sistematicamente à potência americana", declarou na emissora pública PBS, na segunda-feira, o ex-diretor da CIA James Wosley. O que fica subentendido é que, assim sendo, as objeções feitas pela França à política de Bush não têm valor algum.


Tradução de Clara Allain


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