São Paulo, quarta-feira, 12 de abril de 2000


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HOLOCAUSTO
Historiador processou professora dos EUA que o acusou de distorcer fatos da Alemanha nazista
Revisionista sofre derrota em tribunal

CHRISTOPHER S. WREN
do "The New York Times"

David Irving, um historiador britânico que minimizou a tragédia do Holocausto, "reproduziu evidências históricas erroneamente e as manipulou", decidiu ontem um juiz em Londres, ao desqualificar o processo por difamação que o historiador moveu contra uma acadêmica dos EUA que o acusou de distorcer os fatos ocorridos na Alemanha nazista.
Irving, 62, processou a professora de história Deborah Lipstadt, da Universidade Emory, de Atlanta, e a editora Penguin Books, que publicou seu livro no Reino Unido seis anos atrás.
No livro em questão, "Denying the Holocaust: The Growing Assault on Truth and Memory" (Negando o Holocausto - O Crescente Ataque à Verdade e à Memória), Lipstadt descreveu Irving como "um dos mais perigosos porta-vozes da negação do Holocausto" e disse que ele minimiza a responsabilidade de Adolf Hitler no massacre de 6 milhões de judeus.
Irving não nega que judeus tenham morrido sob a guarda nazista, mas alega que foram assassinados muito menos do que o número largamente aceito e afirma que nenhum judeu morreu nas câmaras de gás de Auschwitz, na Polônia ocupada pelos nazistas. Ele argumentou que o livro de Lipstadt o prejudicou, na medida em que lhe tornou difícil encontrar editoras dispostas a publicar seus escritos.
Mas, depois de presidir sobre o processo por difamação por mais de oito semanas, o juiz Charles Gray decidiu contra Irving, que qualificou como "anti-semita e racista" e "um polemista de direita e pró-nazista".
"A meu ver, é incontestável que Irving pode ser descrito como negador do Holocausto", disse o juiz Gray, confirmando o que os críticos do historiador vêm dizendo há anos. "Não apenas ele nega a existência de câmaras de gás em Auschwitz e afirma que nenhum judeu foi morto em câmaras de gás no local, como já o fez em diversas ocasiões e, por vezes, em termos altamente ofensivos."
O juiz disse ainda que Irving convive com neofascistas e parece compartilhar muitos de seus preconceitos racistas e anti-semitas.
"As acusações, que constatei serem em grande medida verdadeiras, incluem a de que, por razões ideológicas próprias, Irving vem, de maneira persistente e proposital, reproduzindo erroneamente e manipulando evidências históricas", disse o juiz.
Irving descreveu a decisão como "perversa" e disse que vai apelar. O juiz ainda vai decidir quem arcará com os custos do processo, mas indicou que Irving terá de pagar a maior parte das despesas da equipe de defesa, que podem chegar a mais de US$ 3 milhões.
Irving teve uma vantagem pelo fato de mover o processo num tribunal britânico, e não nos EUA. Pela lei de difamação britânica, o ônus da prova recai sobre os réus, que, neste caso, foram Lipstadt e a Penguin Books. Nos tribunais dos EUA, a responsabilidade recai sobre aquele que move o processo por difamação.
As implicações do processo foram vistas como tão significativas que o governo israelense colocou à disposição da defesa de Lipstadt o manuscrito das memórias inéditas de Adolf Eichmann -o oficial nazista que organizou a deportação de milhões de judeus para campos de extermínio durante a 2ª Guerra (1939-45) e foi capturado por agentes israelenses na Argentina, sendo executado por enforcamento em 1962.
O juiz Gray afirmou ontem que Irving não conseguiu demonstrar que o livro de Lipstadt tenha prejudicado sua reputação.
Israel e organizações judaicas que trabalham para preservar a memória do Holocausto expressaram satisfação com o veredicto.
"A carreira de David Irving como historiador está acabada", disse o Centro Simon Wiesenthal, em Los Angeles. "A decisão de hoje situa Irving definitivamente em seu lugar -não como historiador, mas como um dos mais importantes apologistas daqueles que procuram retratar como inócuo o crime mais hediondo da história humana."
Em Londres, o presidente do Conselho de Representantes dos Judeus Britânicos, Eldred Tabachnik, teria afirmado que "a decisão mostra que David Irving é um falsificador da história e simpatizante nazista cuja meta vem sendo a de minimizar a gravidade do nazismo e absolver Hitler da culpa pelo Holocausto."


Tradução de Clara Allain


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