São Paulo, sexta-feira, 12 de abril de 2002

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VENEZUELA

Militares pedem renúncia de presidente após repressão que deixou 12 mortos; general diz que presidente abandonou cargo

Chávez enfrenta rebelião após megaprotesto

Associated Press
Polícia reprime manifestação contra Hugo Chávez em Caracas


DA REDAÇÃO

O comandante do Exército venezuelano, Efraim Vásquez, outros dez altos oficiais das Forças Armadas e o vice-ministro da Segurança se rebelaram contra o presidente Hugo Chávez, exigindo sua renúncia, após repressão a megaprotesto em Caracas ontem que deixou ao menos 12 mortos e 88 feridos. Rumores de golpe circularam pela capital, que teve forte presença militar. Mas Vásquez disse que não se tratava de golpe.
Numa declaração à TV no final da noite de ontem, o general da Guarda Nacional Alberto Camacho Kairuz disse que o presidente "abandonou suas funções" e que o país estaria sob o controle das Forças Armadas. "O governo abandonou suas funções", disse ele, acrescentando não saber onde estava Chávez.
Por volta das 22h (0h de hoje em Brasília), o secretário da Presidência, Rafael Vargas, afirmou que Chávez estava "ainda e para sempre" no palácio presidencial e que "a conspiração" havia sido abortada. Ele negou ainda os rumores de que a família do presidente teria deixado Caracas num avião mostrado pela TV.
Em um comunicado transmitido em cadeia de rádio e TV, antes da rebelião, Chávez, 47, acusou os canais privados de TV de incitarem o protesto e ordenou a suspensão das transmissões privadas por tempo indeterminado. Horas depois, as TVs voltaram ao ar, mas a TV estatal saiu do ar.
"Não podemos aceitar um tirano na Presidência. Sua permanência no cargo ameaça o país com a desintegração", disse comunicado dos oficiais rebelados.
Centenas de milhares de venezuelanos participaram do protesto em frente ao palácio presidencial de Miraflores, num dos maiores atos contra Chávez, no cargo desde 1999.
Foram registrados fortes enfrentamentos entre os manifestantes e os simpatizantes do presidente e a Guarda Nacional, deslocada para proteger o palácio presidencial. Um dos generais rebelados, da Guarda Nacional, disse que a tropa recebeu de Chávez ordem para disparar. Segundo testemunhas, tiros foram disparados por franco-atiradores de edifícios próximos ao palácio.
O protesto ocorreu após dois dias de greve geral, convocada pela Confederação dos Trabalhadores da Venezuela (CTV) e pela Fedecámaras (principal associação empresarial do país), associada a um duradouro protesto dos funcionários da PDVSA, a empresa estatal de petróleo. A greve geral, que inicialmente seria de 24 horas, passou a ter duração indefinida a partir de ontem.
Antes do pronunciamento dos generais rebelados, a alta cúpula militar havia declarado apoio a Chávez e pedido calma. Às 15h45 (17h45 em Brasília), Chávez fez seu pronunciamento em cadeia de rádio e TV, após 48 horas sem aparecer, para dizer que "parece haver uma minoria de venezuelanos que parece não aceitar a realidade". A ausência de Chávez havia gerado rumores de que ele estaria detido por militares numa base ou renunciado ao mandato.
Chávez acusou os dirigentes sindicais do país de convocar uma greve geral indefinida "sem nenhuma justificativa" e os criticou por "não apresentar propostas concretas à população".
Chávez justificou ainda a interrupção na transmissão dos canais de TV privados. "É bom que o país saiba com claridade que o sinal de radiodifusão é um sinal que pertence ao Estado venezuelano. O Estado pode ou não dar concessões", disse o coronel da reserva, que tentou golpe militar em 1992.
"Essa gente não vem aqui trazer nenhum documento. Pensam que vão chegar aqui para tirar Chávez e que as Forças Armadas vão apoiar uma insurreição", disse o presidente. "Essa marcha não pode chegar até aqui [ao palácio", havendo milhares de pessoas lá fora. Isso não se pode permitir", disse Chávez, cujo mandato termina em 2007.
A polícia usou bombas de gás lacrimogêneo para manter os manifestantes longe do palácio presidencial. Pequenos blindados também foram usados. As estimativas sobre o número de manifestantes anti-Chávez variavam entre 150 mil e 500 mil. Eles batiam panelas, agitavam bandeiras da Venezuela e gritavam "fora, fora". Marcharam pelas principais avenidas da cidade, em direção ao palácio.
Os críticos de Chávez o acusam de impor um regime esquerdista de modelo cubano no país, o quarto maior exportador mundial de petróleo. Eles também o acusam de não haver cumprido suas promessas eleitorais para reduzir a pobreza crônica, o alto índice de desemprego e a alta taxa de criminalidade.
Os organizadores do protesto pediram a moradores de outras cidades do país para protestarem também contra o presidente.
Num discurso televisionado, no início da tarde, o comandante das Forças Armadas, general Lucas Rincón, acompanhado de outros membros da alta cúpula militar, reiterou o apoio ao presidente e disse que a ordem estava sendo mantida. "À parte alguns pequenos focos de problemas, a situação no país é normal", disse Rincón. "Peço aos venezuelanos para ficarem calmos e para evitar os incidentes de violência", disse ele.
O ministro da Defesa, José Vicente Rangel, sugeriu um diálogo com os adversários do presidente, mas classificou a greve geral de irresponsável. Rangel negou a possibilidade de declarar estado de emergência e disse que não havia perigo de um golpe militar.

Com agências internacionais

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