São Paulo, terça-feira, 12 de julho de 2005

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ANÁLISE

Por ora, terror não abala premiê

MÁRCIO SENNE DE MORAES
DA REDAÇÃO

Diferentemente do que ocorreu, em março de 2004, com o então premiê da Espanha, José María Aznar, o premiê do Reino Unido, Tony Blair, não deverá ter sua reputação chamuscada em razão dos atentados da última quinta-feira se não houver outros ataques terroristas em solo britânico nos próximos meses, segundo especialistas consultados pela Folha.
"A situação britânica atual é muito distinta da espanhola em 2004. Primeiro, porque aqui não há nenhuma eleição importante no futuro próximo, enquanto Aznar teve de enfrentar as urnas poucos dias depois dos ataques em Madri", avaliou Torun Dewan, da London School of Economics and Political Science (LSE).
"Segundo, porque a oposição britânica não está em condições de desafiar o governo em relação à Guerra do Iraque, pois também a apoiou, enquanto a oposição espanhola era contrária ao envolvimento do país no conflito. E, terceiro, porque Blair não tentou convencer a população de que se tratava de terrorismo irlandês, não de extremismo islâmico. Esse talvez tenha sido o maior erro de Aznar", afirmou, aludindo à tentativa -frustrada- do ex-premiê de culpar separatistas bascos.
Para Dewan, Blair poderá até sair fortalecido da crise. "Se se revelar um verdadeiro estadista, que reconhece suas dificuldades, mas faz tudo para transpô-las, o premiê poderá ganhar capital político e manter-se no poder por mais tempo do que planejava."
De fato, na campanha para a eleição legislativa de maio, a mídia especulou que Blair tivesse feito um acordo com seu popular ministro das Finanças, Gordon Brown, segundo o qual este herdaria o posto de premiê em um ou dois anos em troca de seu apoio incondicional à lista de candidatos trabalhista.
O Partido Conservador britânico encontra-se, sem dúvida, em situação complexa por três razões. Primeiro, perdeu claramente a votação de maio, o que deu um forte mandato popular a Blair. Segundo, seus líderes travam um dura disputa interna pelo poder, o que mina uma tomada de posição em uníssono. Terceiro, os conservadores jamais atacaram o envolvimento britânico nos esforços militares americanos recentes.
Com isso, Blair goza de relativa liberdade para continuar a governar apoiado em sua base trabalhista. De acordo com Patrick Dunleavy, também professor da LSE, as duas únicas ameaças à permanência do premiê no poder são a ocorrência de novos atentados ou a própria vontade de Blair.
"Se houver novos ataques terroristas sangrentos e um número significativo de mortes, a população poderá começar a culpar o premiê pela situação, pois foi ele que pôs os britânicos na Guerra do Iraque. Ademais, na campanha eleitoral, foi dito que Blair estava um pouco desgastado e que, por conta disso, pensava em deixar o poder nas mãos de Brown. Talvez a pressão provocada pelo 7 de Julho faça que sua fadiga política aumente", explicou Dunleavy.

Liberdades civis
Diferentemente da reação americana ao 11 de Setembro, Dewan salientou ainda que não deverá ocorrer um forte aumento das restrições às liberdades civis no Reino Unido em decorrência dos atentados da última quinta-feira.
"Após o 11 de Setembro, o governo Blair tomou diversas medidas para proteger o território britânico e para reduzir a margem de manobra de extremistas islâmicos no Reino Unido. As leis de asilo e de imigração foram alteradas, por exemplo", apontou Dewan.
Segundo ele, haverá "várias medidas midiáticas, a curto e médio prazos, para acalmar os temores da população", mas a principal e mais controversa, a criação de uma carteira de identidade oficial, já está em debate no Parlamento. "É curioso para muitos estrangeiros, porém, para os britânicos, exigir que alguém porte uma carteira de identidade é uma séria restrição às liberdades civis."


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