São Paulo, segunda-feira, 12 de setembro de 2011 |
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ANÁLISE Para lidar com o presente, o país deve rever contas com o passado MARISA VON BÜLOW ESPECIAL PARA A FOLHA O Chile vive hoje um importante paradoxo: seu sistema político, tradicionalmente considerado um dos mais estáveis do mundo, parece caminhar rumo a uma profunda crise de legitimidade. Os protestos liderados por universitários, que surpreendem pela capacidade de angariar simpatias e mobilizar, devem ser entendidos não só como consequência dos problemas do modelo educacional chileno, mas também a partir de uma análise mais ampla sobre os desafios do sistema político do país. Segundo dados do Projeto Auditoria da Democracia, do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD-Chile), desde 2006 vem diminuindo o número de eleitores que se identificam com coalizões partidárias. Em 2010, mais de 60% dos chilenos não se sentiam identificados com nenhum partido político - um crescimento superior a 20 pontos em apenas uma década. QUEDA SISTEMÁTICA A pesquisa Barômetro das Américas confirma: em nenhum país da América Latina, exceto o caso extremo do Haiti, houve queda tão sistemática da adesão a partidos políticos como no caso chileno, entre 2006 e 2010. Esse distanciamento em relação aos partidos políticos tem levado a uma crescente apatia eleitoral, especialmente da juventude, que hoje prefere expressar suas demandas e frustrações nas ruas, e não nas urnas. Entre os que votam, a insatisfação não parece menor, fato que explicaria as recentes pesquisas de opinião pública, que mostram o atual governo acumulando recordes de desaprovação. Nesse contexto de enfraquecimento das instituições políticas de representação, o movimento social capta e canaliza esses sentimentos por meio de críticas duras às lideranças tradicionais e de demandas como o fim do lucro na educação, reforma tributária e plebiscito sobre os rumos da política educacional. Porém, o desafio de encontrar respostas concretas para a crise depende justamente da capacidade do Poder Executivo e do Congresso Nacional de dialogar e trilhar caminhos novos, sob pena de perderem ainda mais do seu enraizamento na sociedade. Esse desafio é urgente, mas complexo, pois pressupõe mudança de regras herdadas do período da ditadura militar chilena. Uma reforma política que altere o sistema eleitoral e os processos decisórios no Legislativo, possibilitando renovação das instituições e maior participação da sociedade civil, não seria uma panaceia para os problemas que o Chile enfrenta. No entanto, isso permitiria ao país dar um passo importante no esforço de acertar as contas com o passado e enfrentar os desafios impostos pelo presente. MARISA VON BÜLOW é Ph.D. em ciência política pela Johns Hopkins University, professora do Instituto de Ciência Política da Universidade de Brasília e atualmente professora visitante do Instituto de Ciência Política da PUC-Chile Texto Anterior: Chilenos vão às ruas para lembrar seu 11 de Setembro Próximo Texto: Luiz Carlos Bresser-Pereira: 11 de Setembro, dez anos depois Índice | Comunicar Erros |
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