São Paulo, domingo, 13 de fevereiro de 2011

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RESENHA

Jornalista revê guerra dos EUA ao terror em obra-prima imperfeita

Repórter da CNN aborda o principal conflito do século 21 sob os pontos de vista dos americanos e da Al Qaeda


AUTOR É BRANDO COM OBAMA, E OS JIHADISTAS NÃO SÃO TRATADOS COM PROFUNDIDADE QUE GARANTA A ISONOMIA QUE O LIVRO ALMEJA


IGOR GIELOW
SECRETÁRIO DE REDAÇÃO
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA


Elaborar uma revisão do principal conflito do século 21 vista pelos dois beligerantes, Estados Unidos e Al Qaeda, é a promessa do jornalista americano Peter Bergen na introdução de seu novo livro, "The Longest War" ("A mais longa guerra", ainda sem tradução no Brasil).
Uma proposta e tanto, que ao final o repórter da rede de TV CNN acaba por não cumprir integralmente.
O que não deve demover o leitor interessado em entender por que ele não pode entrar com mais de 100 ml de líquidos em um avião. Aquele que busca compreensão profunda do embate Islã radical e Ocidente sairá algo frustrado, mas não terá nenhum desprazer na sua leitura.

ATAQUE AOS "FALCÕES"
Bergen é do ramo. Cobre o assunto desde os anos 90, e em 1997 produziu uma célebre entrevista do líder da rede terrorista, Osama bin Laden, à CNN.
Com linearidade, o jornalista disseca a incrível incompetência do time de George W. Bush ao lidar com a ameaça que explodiu no 11 de setembro de 2001 com uma mentalidade própria da Guerra Fria.
Os "falcões" são demolidos em sua arrogância e depois indiciados pela criminosa manipulação dos motivos que levaram à invasão do Iraque e à lixeira moral da tortura e de Guantánamo. É preciso lembrar que Bergen tem lado: é alinhado aos democratas e brando em relação a Barack Obama, ainda que aponte que o atual presidente ampliou a estratégia de fim de mandato de Bush.
A mídia manipulada não escapa, nem a CNN (OK, numa rápida passagem).
Bergen inunda seu texto com depoimentos menores, na intenção de dar textura à narrativa. O resultado é ambíguo, assim como a linguagem do livro, que por vezes beira a frivolidade.
Mas são detalhes, assim como o fato de o texto refletir a maior experiência do autor com Afeganistão-Paquistão do que com Iraque.

OUTROS LADOS
A falha central está em não cumprir o prometido: o lado dos jihadistas, ainda que amparado por muitas histórias saborosas, não tem profundidade que garanta a isonomia pretendida.
O que não é difícil de explicar. Como o próprio Bergen conclui, o 11 de Setembro foi o ápice das operações de Bin Laden (pelo menos enquanto os fatos não provarem o contrário). Desde então, sua rede, a Al Qaeda, ainda oferece perigo, mas está sob pressão e em fuga.
Não é exatamente fácil entrevistar jihadistas, como qualquer repórter sabe no Paquistão, e não é casual que os melhores vislumbres deles saiam do relato de torturadores americanos.
Ainda assim, há momentos brilhantes, como a descrição da batalha de Tora Bora, quando Bin Laden escapou após a queda do Taleban, que lhe dava refúgio no Afeganistão. O desespero do agente da CIA que não consegue reforço terrestre para cercar os militantes é tão vivo quanto o relato do médico dos jihadistas.
Escrevendo para americanos, Bergen é menos feliz em considerações culturais, recorrendo a clichês -e naturalmente, em um tomo único, é impossível ainda aprofundar-se na origem histórica dos problemas.
Ainda assim, é educativo para aqueles que consideram a Irmandade Muçulmana apenas um ator benigno na atual crise que o Egito vive ler algo mais sobre Sayed Qutb, que é o inspirador do grupo -e de Bin Laden.

HISTÓRIA DO PRESENTE
Peter Bergen inscreve-se, assim, na linhagem do historiador britânico Timothy Garton Ash como testemunha da "história do presente", refletindo sobre fatos que estão na televisão.
Como Garton Ash, Bergen corre riscos com sua assertividade analítica. Sem revelações bombásticas, o jornalista consegue montar um quadro abrangente em sua obra-prima imperfeita.

"THE LONGEST WAR"

AUTOR Peter Bergen
EDITORA Free Press
PÁGINAS 473
QUANTO US$ 16,80 na www.amazon.com, sem frete; US$ 11,99 na versão para Kindle AVALIAÇÃO bom


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