São Paulo, sábado, 13 de abril de 2002

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Para analista, já há novas lideranças

DA REDAÇÃO

O virtual desaparecimento dos partidos tradicionais AD (Ação Democrática) e Copei (Democrata Cristão), que dominaram a cena política da Venezuela por décadas, não impedirá o surgimento de novas lideranças alternativas a Hugo Chávez na transição até as eleições presidenciais.
A avaliação é do analista Alfredo Keller, diretor da empresa de consultoria e pesquisas Alfredo Keller e Associados, de Caracas. Ele descarta, porém, a possibilidade de que membros da Fedecámaras, principal associação empresarial do país, e da CTV, a principal central sindical, que se uniram nos protestos anti-Chávez, se caracterizem como uma nova força política emergente e dominante. A seguir trechos da entrevista concedida ontem à Folha, por telefone, de Caracas.

Folha - Quais são as perspectivas para o quadro político a partir de agora, considerando que o aparecimento de Chávez coincidiu com o esfacelamento dos partidos tradicionais, Ação Democrática e Copei?
Keller -
O presidente Chávez tentava vender a idéia, constantemente, de que a Venezuela só tinha um líder, ele, e que não existia liderança alternativa. As pesquisas mostram exatamente o oposto. Que há uma forte liderança emergente que não tem relação com o passado da AD e do Copei e que representam uma nova alternativa política. É verdade que toda a origem de toda a política venezuelana recente estava nesses dois partidos, mas acho que as velhas práticas políticas não têm futuro na Venezuela. Hoje, estão emergindo novas organizações políticas, com figuras jovens, de relevância, baseadas principalmente no efeito das reformas de descentralização política. As novas lideranças vêm principalmente da experiência em governos, prefeituras e da sociedade civil. Há muitos líderes novos e que têm nas pesquisas indicadores muito elevados de confiança popular. Se este governo de transição convocar eleições presidenciais para dentro de um ano, veremos nesse período um interessante processo de reconstrução da vida política e das instituições.

Folha - A aliança entre a Fedecámaras e a CTV, que constituiu a principal base de apoio dos protestos anti-Chávez, poderia ser o futuro o grupo político?
Keller -
Não desde o ponto de vista institucional. Não está previsto nem seria aceitável que a Fedecámaras, por exemplo, se tornasse um partido político. O que deve acontecer é o reforço dos partidos políticos. O que está acontecendo é que, com a experiência dos últimos três anos, a sociedade civil quer participar mais em política. E vamos ver muita gente que, no passado, havia se desligado da política convertendo-se em responsáveis cidadãos participativos.
O que vemos é interrupção institucional para regressar a uma normalidade política. Em consequência, o que os venezuelanos escolheram é reforçar as instituições tradicionais não políticas, como a Fedecámaras e a CTV, apoiadas por sua vez pelos meios de comunicação, pela igreja, pelas universidades e pelas organizações não-governamentais, como expressão da sociedade civil.

Folha - O novo governo enfrentará resistência nas instituições controladas até agora por Chávez, como a Assembléia Nacional?
Keller -
Neste momento, alguns deputados já renunciaram à Assembléia, para abrir espaço para um processo de legitimação do Poder Legislativo. É muito provável também que a nova junta de governo assuma funções não só executivas, mas também legislativas, e uma de suas primeiras medidas seria convocar eleições parlamentares o mais rápido possível para substituir ou ordenar o marco jurídico para que os poderes públicos fiquem legitimados o mais rápido possível.
No último ano, Chávez perdeu o apoio de 25% do parlamento. Ele ainda tinha uma maioria, mas era precária. A oposição vinha trabalhando nas últimas semanas para retirar-lhe a maioria, o que possibilitaria uma saída pela via de um julgamento político. Há 15 dias, o governo pela primeira vez perdeu uma votação na Assembléia.
Após as eleições parlamentares de julho de 2000, Chávez tinha o apoio de 75% do Parlamento. Mas, ao longo do ano passado, ele brigou com todo mundo. Com a Igreja Católica, com os empresários, com os meios de comunicação e também brigou com seus próprios aliados. Isso forçou a divisão da frente de partidos que suportava o governo. Quando o MAS (Movimento ao Socialismo) se retirou do governo, foi-se o apoio de 15% da Assembléia. Posteriormente, ele teve novas brigas com o setor mais institucional do governo, liderado pelo ministro das Relações Interiores, Luiz Miquilena. Quando o ministro deixou o governo, por suas brigas com o presidente, ele perdeu ainda mais e passou a controlar somente 50% da Assembléia. Uma maioria precária. É sabido agora que muitos deputados eram ameaçados e chantageados politicamente, para evitar que o governo perdesse essa maioria.



Texto Anterior: Oposição usa vácuo legal para se justificar
Próximo Texto: FHC diz que país vizinho precisa de eleições
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.