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São Paulo, terça-feira, 13 de maio de 2003

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"FUGA DE CÉREBROS"

Médicos e coveiros removeram órgãos para serem utilizados em pesquisas, sem autorização das famílias

Reino Unido teve 20 mil cérebros roubados

JILL LAWLESS
DA ASSOCIATED PRESS, EM LONDRES

Médicos e coveiros britânicos removeram pelo menos 20 mil cérebros -muitos deles de corpos de pessoas que sofriam de depressão ou possuíam problemas mentais- sem a autorização das famílias. A informação foi divulgada em relatório de Jeremy Metters, inspetor real de anatomia do Reino Unido.
Metters afirmou que a remoção dos cérebros era uma rotina entre 1970 e 1999. A ação, segundo ele, representa um abuso de privilégio. Remover órgãos sem a autorização das famílias é ilegal desde 1999. Antes, órgãos eram removidos sem autorização sob a alegação de "fins médicos".
O número de 20 mil inclui apenas cérebros mantidos em hospitais e universidades do Reino Unido. Metters afirma que muitos outros podem ter sido destruídos. O médico citou casos nos quais coveiros recebiam US$ 16 para cada cérebro que ele entregasse para ser utilizado em pesquisas médicas. Segundo Metters, as atitudes em relação aos corpos dos mortos mudaram muito nas últimas décadas.
"Muitos que sabiam sobre a retenção de órgãos em casos de investigação de mortes não consideravam suas ações antiéticas nem ilegais", disse. "Há uma crença de que a retenção de órgãos é de interesse público."
Metters afirmou que alguns cérebros eram removidos para tentar explicar a causa da morte das pessoas. Outros para pesquisas neuropsiquiátricas.
Há um caso, ocorrido na Universidade de Manchester, em que 200 cérebros foram levados para um projeto de pesquisa para uma comparação entre pessoas com problemas mentais e um grupo de pessoas sem problemas.
O governo pediu uma investigação após pressão da viúva de Cyril Isaacs. Ele sofria de depressão e se suicidou em 1987. Em 2000, Elaine Isaacs descobriu sem querer que o cérebro do marido havia sido removido para pesquisa. Isso é impedido pela fé judaica, que exige o enterro do corpo intacto.
Isaacs disse que espera que autoridades médicas e governamentais tomem as medidas contra os responsáveis pelas remoções.
O chefe da agência médica do governo do Reino Unido, Liam Donaldson, disse que remover órgãos de mortos sem autorização "é uma afronta para as famílias que perderam seus parentes".
"Eu posso garantir a essas famílias que, a partir do momento que essas atividades foram descritas no relatório, a prática de remover órgãos sem consentimento não será aceita pelo Serviço de Saúde Nacional", disse Donaldson.
Metters fez 32 recomendações para impedir que órgãos sejam retirados sem permissão.
Ele disse, no entanto, temer que seu relatório prejudique pesquisas importantes. "Há algumas pesquisas que precisam ser realizadas por meio da pesquisa do cérebro", afirmou. "Muitas pessoas dariam autorização para o estudo do cérebro de seus parentes."
Representantes de grupos de apoio a pessoas com problemas mentais temem que o relatório atrapalhe pesquisas que visam a cura de doenças mentais.
A remoção sem autorização foi proibida em 1999, após roubo do cérebro de 3.500 crianças e bebês mortos.


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