São Paulo, domingo, 13 de julho de 2008

Próximo Texto | Índice

Sob polêmica, EUA reativam sua Quarta Frota

Em atividade desde ontem, comando atuará nas águas da América Latina e do Caribe, a princípio sem navio próprio

Ex-chefe do Comando Naval Sul disse que retomada envia "sinal certo" à região; unidade terá 120 militares em quartel na Flórida


SÉRGIO DÁVILA
ENVIADO ESPECIAL A MAYPORT (FLÓRIDA)

Em meio a polêmica, desconforto e desconfiança em diversos países da América Latina, os Estados Unidos reativaram ontem sua Quarta Frota, comando naval que será responsável por todas as embarcações militares do país em atividade nas águas da região e do Caribe.
Diferentemente de frotas ofensivas como a Quinta, em atividade no golfo Pérsico, a princípio a Quarta não terá embarcações próprias. No momento de sua reativação, no entanto, havia nove embarcações em atividade naquela parte do Atlântico e do Pacífico -quatro em missões antitráfico, as outras em treinamentos ou missões humanitárias.
A frota contará com um efetivo de 120 militares, alocados em seu novo quartel-general, na base naval de Mayport, no Norte da Flórida, segundo o porta-voz, tenente Myers Vasquez. O local já funciona de base para outras divisões das Forças Armadas norte-americanas e é porto de 22 embarcações militares -cruzadores, destróieres e fragatas- e seis esquadrões de helicópteros.
A volta foi marcada por cerimônia de passagem da chefia do Comando Naval Sul do contra-almirante James Stevenson, que sai da ativa, a seu colega de patente Joseph Kernan. A escolha não é usual: o militar de 53 anos não fez carreira na Marinha convencional, mas nos SEAL, a força de operações especiais de elite, mobilizada em ações antiterrorismo e combates não-convencionais.
"Ele é o homem certo para as tarefas desafiadoras da região", havia dito o almirante James Stavridis, do Comando Sul (Southcom), divisão responsável pelas atividades militares na América Latina, à qual a Quarta Frota responderá.

"Sinal certo"
Embora recentemente tenha mudado de discurso, com ênfase na questão humanitária e combate ao tráfico na região, no anúncio da volta da frota, adiantado pela Folha na edição de 26 de abril, o governo norte-americano havia adotado uma posição ofensiva.
Em depoimento no Congresso, nos dias 6 e 17 de março, Stavridis havia defendido que um porta-aviões nuclear fosse incorporado ao comando naval reativado -em conversa ontem com repórteres, ele disse que não tinha certeza de ter dito isso e que uma embarcação tão grande não faria sentido ali.
Em conversa com blogueiros militares no mês seguinte, James Stevenson, então chefe do Comando Naval Sul, disse que a reativação mandaria "o sinal certo, mesmo para as pessoas que nós sabemos que não são necessariamente nossos maiores apoiadores".
O governo norte-americano se preocupa com o que considera uma "corrida às armas" que seria estimulada pelo presidente venezuelano Hugo Chávez, principal crítico dos EUA na região e seu quinto maior fornecedor de petróleo. A preocupação foi explicitada por Stavridis no mesmo depoimento ao Congresso.
Mas não só. O país observa com interesse ações recentes como a articulação de países da América do Sul, liderados pelo brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva, para criar um conselho de defesa regional, e o aumento da presença militar e comercial da China e do Irã na região.
Some-se à equação a possibilidade cada vez maior de os EUA perderem a base aérea com que contam hoje na América do Sul, em Manta, no Equador. O acordo expira em 2009, e o presidente Rafael Correa, de esquerda, já disse que não pretende renová-lo.

Acalmando ânimos
Diante da reação negativa ao relançamento da Quarta Frota, Washington destacou uma força diplomática-militar para acalmar os ânimos, recalibrando o discurso do Pentágono.
O contra-almirante James Stavridis visitou países da região e passou a ressaltar a prioridade humanitária da frota e o fato de ela não contar com embarcações próprias. Foi seguido pelo número um do Departamento de Estado para o hemisfério, Thomas Shannon.
No Brasil, o embaixador dos EUA, Clifford Sobel, escreveu: "Foi até sugerido que o restabelecimento da frota foi de alguma maneira relacionado com descobertas recentes de petróleo. É importante deixar bastante claro: não é o caso".
A reação é compreensível, dado o histórico militar dos EUA na região, disse à Folha Frank Mora, professor do National War College, de Washington. Mas a volta da frota, defende, "é mais uma ação de política interna do Pentágono do que uma ameaça à região".
As atividades navais dos EUA ao sul do México eram controladas até ontem pela Segunda Frota, que cuida do Atlântico todo. Com a definição de uma frota numerada só para a América Latina, calcula Mora, a Marinha pode pleitear mais recursos para combate ao narcotráfico, a prioridade ali.


Próximo Texto: Comandantes dizem que vizinhos foram avisados
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.