São Paulo, sexta-feira, 13 de setembro de 2002

Próximo Texto | Índice

SADDAM NA MIRA

Presidente diz que órgão pode se tornar "irrelevante" se não agir já; Annan refuta ataque unilateral

Bush exige da ONU ação contra Iraque

Win McNamee/Reuters
O presidente George W. Bush acompanha discurso do secretário-geral das Nações Unidas, Kofi Annan, durante assembléia da ONU, em Nova York


SÉRGIO DÁVILA
DE NOVA YORK

Com palavras duras e em tom de ultimato, o presidente dos EUA, George W. Bush, disse ontem, na abertura da Assembléia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU), que, se a entidade não agir imediatamente contra o Iraque, seu país agirá sozinho.
"As resoluções do Conselho de Segurança serão seguidas e as justas exigências da paz e da segurança serão alcançadas", afirmou. "Ou uma ação será inevitável e um regime que perdeu a legitimidade perderá também o poder", disse. "A ONU servirá ao propósito para a qual foi criada ou será irrelevante?", questionou.
Falando pausada e longamente, Bush elencou as 16 resoluções da ONU que o ditador iraquiano, Saddam Hussein, vem ignorando e afirmou que isso ameaça a autoridade e a credibilidade do órgão.
"O Iraque tem respondido a uma década de demandas da ONU com uma década de desafios", disse ele. "Se esse regime nos desafiar novamente, o mundo precisará agir deliberada e decididamente para responsabilizá-lo. Não se deve duvidar dos propósitos dos EUA."
Disse ainda que o país árabe abriga fugitivos da organização terrorista Al Qaeda e que o líder iraquiano vem subvertendo o programa "petróleo por alimentos" da ONU, que permite ao Iraque vender o combustível no mercado internacional e usar o dinheiro para comprar alimentos e remédios para a população.
Antes, em seu discurso de abertura, o secretário-geral da ONU, Kofi Annan, havia chamado indiretamente a atenção dos EUA, sem citar o nome do país, para o fato de que um ataque contra o Iraque sem a aprovação da entidade violaria o direito internacional e a estabilidade global.
"Há consequências [de uma ação militar" além do contexto imediato", discursou Annan. "Quando Estados decidem usar a força para lidar com ameaças externas à paz e à segurança internacionais, não há substituto para a legitimidade única concedida pelas Nações Unidas."
Listando, em ordem de importância, as quatro questões que ameaçam a paz do mundo, Annan colocou o Iraque em segundo lugar, atrás do conflito israelo-palestino e na frente do Afeganistão e da Caxemira. "Se o desacato iraquiano continuar, o Conselho de Segurança deve encarar suas responsabilidades", disse ele.
Nesse delicado xadrez diplomático, os EUA buscam apoio da comunidade internacional para seus propósitos. A ONU, por sua vez, tenta fazer valer sua soberania na questão. Segundo as regras do Conselho de Segurança, órgão executivo da entidade, um país não pode atacar outro sem que tenha sido provocado antes.
Por outro lado, desde o fim da Guerra do Golfo (91), o Iraque é obrigado a seguir resoluções do Conselho de Segurança que determinam que o país deve destruir seu arsenal não-convencional e permitir o livre trabalho dos inspetores de armas, expulsos em 1998 acusados de "espionagem".
Pela manhã, a Casa Branca havia divulgado um documento em que lista suas acusações. Intitulado "Uma Década de Decepção e de Desacato", o relatório baseia-se em estudos de grupos de oposição iraquianos, da própria ONU e de ONGs lideradas pela Anistia Internacional (leia texto ao lado).
Nem todas as evidências, que incluem uma entrevista feita pelo jornal "The New York Times" com um desertor iraquiano, são aceitas unanimemente pela comunidade internacional.

Reação doméstica
Políticos republicanos pressionaram a oposição democrata a demonstrar apoio público às palavras do presidente, como maneira de mostrar ao mundo que o Congresso dos EUA apoiaria uma eventual ação militar.
"Temos de votar agora mesmo [uma ação contra o Iraque" para mostrar apoio ao presidente", disse o senador republicano Trent Lott. Tom Daschle, líder democrata no Senado, disse que o discurso de Bush tinha sido "forte", mas que ainda devia haver debate. Bush promete pedir autorização do Congresso para um ataque.
Leia a íntegra dos discursos de Bush, Annan e Celso Lafer, chanceler brasileiro.

www.folha.com.br/mundo


Próximo Texto: O discurso de Bush
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.