São Paulo, quarta-feira, 14 de abril de 2010

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ANÁLISE

Sanção fraca e retórica agressiva são pior cenário

CLAUDIA ANTUNES
DA SUCURSAL DO RIO

Se o tema subjacente à conferência convocada pelo governo Obama era o programa nuclear do Irã, uma pergunta vital continua sem resposta: qual a melhor estratégia para impedir que o país persa rompa com o TNP (Tratado de Não Proliferação) e produza a bomba?
Por enquanto, os principais envolvidos lidam com o problema para atender primariamente a seus próprios interesses.
Obama pretende demonstrar a um Congresso prestes a pôr em votação o endurecimento das sanções unilaterais contra o Irã que pode obter um consenso para uma quarta rodada de punições no Conselho de Segurança da ONU. Além disso, quer espantar o fantasma de um ataque israelense às instalações iranianas, cenário de pavor para os cerca de 250 mil militares americanos nos vizinhos Iraque e Afeganistão.
O objetivo da China é jogar água fria sobre as tensões recentes na relação com os EUA, relativas sobretudo ao seu superavit no comércio bilateral, mas também à venda de armas americanas a Taiwan e à iniciativa de Obama de receber o dalai-lama na Casa Branca.
A Rússia não quer jogar fora o "recomeço" com os americanos, que levou à renovação do tratado de redução de mísseis intercontinentais, mas também a um relaxamento da oposição de Washington à pretensão de Moscou de reafirmar uma área de influência em países próximos, como a Geórgia.
Brasil e Turquia, que ainda dizem se opor a novas sanções, preocupam-se sobretudo com que não sejam abertos precedentes contra o direito, expresso no TNP, de exploração do átomo para fins pacíficos.
Só uma coisa é certa até agora. Se houver sanções, fique o Brasil isolado ou não (de qualquer forma, sua implementação será obrigatória), elas serão mais fracas do que os EUA almejavam no início. Russos e chineses deixam claro que nada deve cortar seus laços econômicos com Teerã.
A combinação esdrúxula de sanções fracas com retórica agressiva pode ser o pior dos mundos, como mostra a reação do Irã à estratégia nuclear de Obama -o país, alvo da ameaça atômica americana, denunciou na ONU o que chama de "chantagem e terrorismo de Estado".

Decreto do aiatolá
Alguns analistas lembram que existe uma fatwa (decreto religioso) do aiatolá Khomeini contra a bomba. Mas a continuidade do regime e o nacionalismo podem falar mais forte. Como prevê o artigo 10 do TNP, ao qual a Coreia do Norte recorreu, qualquer país pode se retirar do tratado se julgar que existe ameaça iminente à própria sobrevivência.
Quanto ao objetivo primário da cúpula, o compromisso de reforçar a segurança de estoques de urânio e plutônio é importante, mas dependerá sobretudo de medidas voluntárias dos 47 países presentes.
Como disseram especialistas do Departamento de Estado, seria inviável forjar um novo acordo multilateral sobre questão que já é objeto de vários textos, parte deles parada por atraso nos processos de adesão e ratificação, como a Convenção para a Proteção de Material Nuclear. Um tratado para banir a produção de novos materiais físseis, recomendado no âmbito do TNP, é outra medida pendente de avanço.
Países como Ucrânia, Malásia e Chile ofereceram entregar parte de seus estoques de combustível nuclear usado para a Rússia ou os EUA. Mas pouco se sabe sobre concessões de Índia e Paquistão. Os dois países não integram o TNP e, pelo acordo de cooperação nuclear assinado com os EUA em 2005, apenas as instalações civis indianas passarão a ter inspeção internacional.
Israel, a terceira potência extra-TNP, preferiu a discrição em Washington. A proposta de um Oriente Médio sem armas nucleares será um dos temas da conferência de revisão do tratado, no próximo mês.


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