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ANÁLISE
Washington ganha mais que Moscou
MÁRCIO SENNE DE MORAES
DA REDAÇÃO
Em tese, o novo tratado de redução de armas nucleares é importante porque demonstra que os EUA e a Rússia podem debater temas sensíveis e chegar a um acordo. Ainda em tese, é histórico porque prevê um significativo corte
nos respectivos arsenais.
Contudo, tal qual foi anunciado
ontem, ele dá aos EUA quase todas as regalias que Washington
exigia para firmar um tratado de
redução de armamentos nucleares e à Rússia apenas o documento formal em si -uma exigência de Moscou após o anúncio dos
EUA, feito em dezembro último,
de que abandonariam o Tratado
Antimísseis Balísticos (TAB,
1972) em seis meses-, de acordo
com analistas ouvidos pela Folha.
"Trata-se de uma situação complexa, pois, aparentemente, os
russos conseguiram somente a assinatura de um tratado formal. Já
o restante do que foi anunciado
favorece a postura do governo
dos EUA", apontou Ivo Daalder,
do Instituto Brookings (EUA).
"Não creio que o texto final venha a corresponder a tudo o que
foi acordado entre os dois países
no âmbito da geostratégia. Afinal,
o tratado anunciado só consolida
a postura de Washington nessa
área", declarou Ole Holsti, da
Universidade Duke (EUA).
Segundo ele, Moscou deve ter
obtido outras vantagens ao concordar em assinar um acordo que,
de modo informal, implica sua
anuência ao fim do TAB e à construção do escudo antimísseis dos
EUA. "É verdade que, com esse
acordo, poderá haver verificação
bilateral dos cortes feitos, porém
isso não seria suficiente para que
os russos mudassem de opinião."
Para ambos os analistas, entre
outros pontos, Washington pode
ter-se comprometido a ajudar a
financiar a redução do arsenal
russo e a permitir que Moscou tenha um papel mais relevante dentro da Otan embora não faça parte
da aliança militar ocidental.
"Nada garante que os EUA venham a respeitar o tratado, pois
Washington já mostrou que pode
abandonar acordos internacionais a qualquer momento, como
fez com o TAB. Mesmo assim, para que os russos aceitassem esse
tratado, é certo que o governo dos
EUA teve de oferecer mais do que
o texto formal", explicou Daalder.
"Desmontar ogivas custa caro.
Destruí-las ou estocá-las também
-isso por tempo indeterminado.
Ademais, amanhã [hoje], ocorrerá uma reunião da Otan que dará
a Moscou um papel mais importante dentro da aliança. Sem dúvida, essa "vitória" russa tem a ver com o novo acordo", disse Holsti.
De acordo com ele, resta agora
esperar que Washington esvazie a
Otan no que se refere a ações militares, "visto que os EUA jamais
permitirão que os russos influenciem suas decisões nessa área".
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