São Paulo, quinta-feira, 14 de julho de 2011

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Poder na Rússia é degenerado, diz presidenciável de oposição

Ex-vice-premiê Boris Nemtsov tenta construir partido contrário ao Kremlin

Um dos maiores líderes da oposição, ele quer disputar governo russo contra grupo liderado por Putin e Medvedev

MARINA DARMAROS
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, EM MOSCOU

No mês passado, um dia depois de ser condenado pela Justiça russa por ter participado de manifestação não autorizada, o ex-vice-premiê Boris Nemtsov, 51, recebeu do Ministério da Justiça negativa de registro de seu Partido da Liberdade do Povo (PLP).
Três dias depois, porém, Nemtsov liderava um novo ato na praça Puchkin, centro de Moscou, para exigir diversidade de partidos no país.
Um dos mais notórios líderes da oposição no país, Nemtsov foi um dos principais dirigentes do país entre 1997 e 98, no governo Boris Ieltsin.
Em entrevista à Folha, ele, que pretende se candidatar a presidente na eleição do ano que vem, diz que o período desde a queda da União Soviética, há 20 anos, foi "penoso", em razão da erosão das liberdades civis.
Procurado, o Ministério da Justiça russa não quis comentar as declarações.

 

Folha - Como o sr. vê a recusa em registrar seu partido?
Boris Nemtsov -
Infelizmente, aqui não se registra a oposição e não se permite que ela vá às eleições. Eleições sem oposição não são eleições, são uma farsa.
O poder demonstra covardia, tem medo. O Brasil é um exemplo de democracia, porque a oposição participa das eleições. A corrupção na Rússia não é apenas um problema, mas um sistema.

Muitas pessoas ainda não querem tomar parte nas eleições no país. Por quê?
As pessoas, em primeiro lugar, não acreditam que as eleições sejam limpas e acham que nada depende delas. O próprio poder constantemente provoca as pessoas para que elas se sentem em silêncio e calem a boca.
Ou seja, "nós decidimos por vocês, e vocês se sentem em silêncio". Isso é horrível, as pessoas são estimuladas à passividade.

A imprensa russa tem discutido bastante quem será o candidato do governo, [o premiê Vladimir] Putin ou [o presidente Dmitri] Medvedev...
Essas eleições estão muito degeneradas. Faltam opções. O regime liquidou a oposição e não dá chance a ninguém de se revelar.
A Rússia é muito mais brilhante e multiforme que apenas Putin e Medvedev.

Medvedev muito fala sobre a guerra contra a corrupção...
O Medvedev em tudo fala demais, mas faz pouco. Ele é para a gente um blogueiro, um articulista, não um presidente. Há três anos ele guarda lugar no Kremlin, mas não se tornou presidente.
Isso é uma tragédia. Não se pode levar muito a sério as palavras dele. Fala não sei o quê, e depois nada acontece.

Na política externa, o governo tem apoiado regimes como o sírio, o líbio...
Falta-nos uma política externa, que hoje é eclética na Rússia: por um lado, apoia a Síria, por outro, tenta fazer amizade com Israel. Ficou neutra quanto à Líbia, depois Putin diz que é preciso apoiar o Gaddafi...
Aqui todos se afastaram, todo mundo à nossa volta é inimigo: Geórgia, Ucrânia, Belarus, Ásia Central, bálticos... isso é um absurdo. O governo sofre da síndrome do império: é agressivo, por isso todos se afastam.

Como o sr. considera os 20 anos desde a queda da União Soviética?
Penosos. Nesses 20 anos, as pessoas foram despojadas de novo de liberdades civis.

E o papel do Exército no país?
O Exército é muito arcaico, ficou para trás e não pode desempenhar suas funções. Tem hoje um Orçamento de US$ 40 bilhões, mas a maior parte é desviada, por isso o equipamento russo é muito ruim. E a Rússia tem muitos problemas, no Cáucaso, na Ásia Central, na China e assim por diante.

Qual poderia ser a solução no Cáucaso do Norte?
O Cáucaso já está de fato separado da Rússia, lá agem separatistas, e devido a isso pagamos uma soma imensa de dinheiro. Devemos instituir uma Constituição para o Cáucaso. Lá se vive pela sharia [lei islâmica].


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