São Paulo, quarta, 14 de outubro de 1998

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ANÁLISE
Tese da reunificação perde terreno na ilha

do enviado especial

China e Taiwan retomam uma reaproximação iniciada nos anos 80, quando a Guerra Fria desaparecia, e interrompida em 95, com a viagem do presidente Lee Teng-hui aos EUA.
Entre os fatores responsáveis pela retomada das negociações estão a consolidação do poder de Jiang Zemin no universo político chinês e sua disposição para acelerar uma eventual reunificação, a pressão norte-americana e a necessidade do Kuomintang de correr contra o relógio da história.
Jiang Zemin chegou ao poder em 89, levado por seu padrinho político, Deng Xiaoping. No começo, foi tratado como uma figura transitória, destinada a esmaecer com a morte do líder chinês. Deng morreu em 97, e Jiang conseguiu, contrariando as previsões iniciais, consolidar seu poder. Levou aliados à cúpula do Partido Comunista e à direção das Forças Armadas.
Jiang planeja garantir um lugar de destaque na história chinesa ao despontar como o responsável pela "reunificação da pátria". Pretende deixar um legado comparável ao de Deng, que iniciou a abertura econômica em 78 e comandou a reincorporação de Hong Kong.
O presidente chinês também tem pressa, pois teme as próximas eleições presidenciais em Taiwan, marcadas para o ano 2000. A força política que mais cresce na "ilha rebelde" é o Partido Democrático Progressista (DPP), que nasceu como defensor da independência, ou seja, do rompimento de qualquer compromisso com Pequim.
Em 1997, em eleições municipais e distritais, o DPP teve 43% dos votos, contra 42% do Kuomintang, na primeira derrota eleitoral dos nacionalistas desde 1949. Jiang Zemin alimenta o receio de um triunfo do DPP na disputa presidencial de 2000. Prefere então acelerar a reunificação e, para isso, se dispõe a negociar com Lee Teng-hui, a quem havia chamado de "traidor" e "mentiroso".
O Kuomintang busca manter o compromisso histórico da reunificação, mas tenta ganhar tempo, à espera de mudanças políticas na China comunista. Os nacionalistas acreditam ser inevitável, num futuro próximo, o enfraquecimento do PC chinês, devido à abertura econômica.
Mas, enquanto aguarda a derrocada do regime de Pequim, o Kuomintang também testemunha crescente distanciamento das gerações mais jovens de Taiwan em relação à reunificação.
Pesquisa realizada pelo governo de Taiwan indicou que apenas 7,4% dos entrevistados desejam "independência já". Essa fatia da população corresponde principalmente às gerações mais jovens, que crescem num universo cultural mais marcado pela influência norte-americana do que pelos laços históricos com a China continental.
Portanto, o Kuomintang enfrenta o seguinte desafio: a espera de uma queda do PC chinês pode coincidir com o amadurecimento em Taiwan de uma onda pró-independência. Seria então preferível acelerar a reunificação a fim de evitar o risco da ruptura histórica com a China.
Lee Teng-hui caminha com cautela. Não pode recusar a oferta de diálogo de Pequim, pois estaria contrariando os objetivos históricos de seu partido. Tentará conciliar a estratégia de "ganhar tempo" com a necessidade de negociar com os ex-inimigos.
O Kuomintang e o Partido Comunista também enfrentam pressão dos EUA para a retomada do diálogo. A Casa Branca tem de manter compromissos assumidos com Taiwan, como sair em defesa da ilha no caso de um ataque de Pequim.
A prioridade de Bill Clinton, no entanto, é garantir lugar para empresas dos EUA no crescente mercado chinês. Para isso, Washington precisa cortejar os comunistas de Pequim. (JS)


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