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Saldo da turnê de Bush é mais retórica do que ação
Depois do Brasil, álcool sumiu dos discursos, que enfatizaram "justiça social"
Quanto mais se aproximava de casa, maior a pressão sofrida por americano na questão da imigração, que divide sua própria base
SÉRGIO DÁVILA
ENVIADO ESPECIAL AO MÉXICO
Começou com samba e terminou em milho e feijão a viagem de George W. Bush pela
América Latina. No meio do caminho, muita retórica mas
pouca ação. O presidente norte-americano repisou em cada
uma das cinco paradas o caráter "compassivo" de seu povo,
defendeu "justiça social" via
"livre comércio"; falou que os
Estados Unidos "se importam"
com a região.
Ofereceu, no entanto, pouco
além do memorando conjunto
de biocombustíveis assinado
no Brasil, considerado um bom
começo por muitos, mas tímido
por outros tantos, por não incluir o fim das barreiras comerciais ao álcool brasileiro.
A Folha foi o único órgão da
imprensa latino-americana a
acompanhar o presidente em
seu giro pela América Latina,
ironia notada anteontem por
Tony Snow -animado e mostrando fotos de lagartos que fez
em Yucatán (México), o porta-voz da Casa Branca exibia no
braço direito duas pulseiras de
plástico com as cores do Brasil.
Sete dias, cinco países e 20
mil quilômetros depois, a viagem de Bush poderia ser resumida em dez itens:
1. Álcool não viaja bem
Apesar de ter sido chamado
de "diplomacia do álcool", o périplo de Bush ignorou o assunto
biocombustíveis tão logo o AirForce One deixou o aeroporto
de Guarulhos, em São Paulo.
2. Hugo quem?
Não só comparações com a
turnê que Hugo Chávez fazia ao
mesmo tempo pela região eram
repelidas pelos assessores de
Bush como foi banida a menção
ao nome do venezuelano e de
seu país. Indagado sobre Chávez, Bush respondeu da mesma
maneira: que iria se concentrar
na "agenda positiva".
3. "George W. Chávez"
Ainda assim, era evidente o
esforço do norte-americano em
mostrar que também "se importava" com o continente. Na
Guatemala, carregou alfaces e
elogiou os médicos militares de
seu país que "devolviam a visão" aos pobres locais.
4. Pouco dinheiro
Bush fez dez discursos em
cinco países, falando um total
de 6.000 palavras, sem incluir
as respostas em cinco entrevistas coletivas. Ainda assim, a
ajuda direta à região continua
onde estava quando a viagem
começou: de cerca de US$ 1,5
bilhão por ano. É menos do que
os EUA destinam ao Egito num
ano, e, numa região de 35 países, a maior parte do dinheiro
vai para a Colômbia.
5. Pouca ação
Bush negou a derrubada da
tarifa do álcool a Lula, disse que
o tratamento aos imigrantes
guatemaltecos (10% da população) continuaria igual e que a
barreira separando EUA e México seguirá como o planejado.
A exceção foi a Colômbia, onde
prometeu trabalhar pela aprovação do Plano Colômbia.
6. "Fuera Bush"
Uma constante acompanhou
Bush em todas as suas paradas,
apesar do esquema de segurança: protestos populares. Foram
da nudez patriótica (no Brasil)
à purificação do solo (na Guatemala), passando por coquetéis
molotov (na Guatemala) e prisões em massa (na Colômbia).
Bush não viu quase nada e conseguiu ignorar a "voz das ruas".
7. Comer ou conversar
Dez minutos após iniciados
os encontros com a imprensa
ou ao final dos discursos, Bush
começava a falar da comida. No
Brasil, cobrou o "almoço" que
Lula "pagaria" a ele, falou que
esperava ansioso o "asado" de
Tabaré Vázquez, pediu tortilhas ao presidente da Guatemala e, no México, finalmente,
confessaria: "Estoy lleno" (estou satisfeito).
8. "Jorge doblevê"
Por falar em espanhol, a partir do Uruguai o republicano
soltou várias frases na língua,
com as quais o norte-americano esperava ganhar a simpatia
dos locais. Chamou presidentes de "tejanos" (texanos) e se
apresentou como "Jorge Doblevê" (George W.) em mais de
uma ocasião.
9. É a imigração, estúpido
Quanto mais perto de casa,
maior a pressão por uma solução da questão dos imigrantes
ilegais nos EUA que vá além da
construção do muro na fronteira sul. A conversa com Óscar
Berger (Guatemala) foi dominada pelo assunto, Felipe Calderón (México) o recebeu com
um discurso duro a respeito.
Tamanha pressão fez Bush falar pela primeira vez num prazo para a aprovação da reforma
da atual lei imigratória norte-americana: agosto deste ano. A
questão opõe democratas a republicanos e há também divisões dentro dos dois partidos.
10. Não adianta fugir
Por mais que tenha tentado
fugir dos problemas domésticos, Bush não conseguiu evitar
assuntos espinhosos como o
Iraque e denúncias contra
membros de seu governo.
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