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GEOPOLÍTICA
Ex-inimigo, Moscou passa a ter o direito de debater temas como terrorismo e controle de armas com países da aliança
Otan acolhe Rússia como aliada estratégica
MÁRCIO SENNE DE MORAES
DA REDAÇÃO
A Otan abriu ontem suas portas
para a Rússia, o maior inimigo da
aliança militar ocidental na segunda metade do século passado,
decretou o fim da Guerra Fria
mais uma vez e delineou os contornos de uma nova parceria estratégica para combater o terrorismo, a propagação de armas de
destruição em massa e os desafios
surgidos após os atentados terroristas de 11 de setembro.
"Trata-se do funeral da Guerra
Fria. Há 15 anos, a Rússia era nossa inimiga. Agora a Rússia se torna nossa amiga e nossa aliada.
Não poderia haver mudança
maior", declarou o chanceler britânico, Jack Straw, durante a histórica reunião da Otan ocorrida
em Reykjavík, capital da Islândia.
Os chanceleres Colin Powell
(EUA) e Igor Ivanov (Rússia) participaram do evento solene.
De fato, a cúpula de ontem foi
marcada pelo simbolismo. Até o
hotel que a abrigou tem um lado
histórico. Nele, em 1986, os ex-presidentes Ronald Reagan e Mikhail Gorbatchov se encontraram
para discutir a redução dos arsenais bélicos americano e russo e
começaram a pôr fim ao antagonismo bipolar da Guerra Fria.
"O simbolismo do ocorrido é
indiscutível. Em 1949, a Otan foi
criada sobretudo para defender as
"fronteiras" que separavam o
mundo ocidental do bloco comunista. Não se pode esquecer que a
Rússia é a herdeira da URSS, que
liderava o "grupo inimigo" do Ocidente", explicou à Folha Ole
Holsti, co-autor de "Unity and Disintegration in International
Alliances" (unidade e desintegração em alianças internacionais).
"Ademais, desde que Bill Clinton [ex-presidente dos EUA" começou a insistir em expandir a
aliança para o leste do continente
europeu, em meados da década
passada, Washington tenta convencer Moscou de que essa medida não visa a ameaçar os russos
ou a minar seus interesses na região. Ora, não há nada mais simbólico para reiterar essa afirmação do que acolher a Rússia dentro dos quadros da Otan."
Após selar a criação do Conselho Otan-Rússia -cujo texto final será assinado perto de Roma,
em 28 de maio-, o secretário-geral da Otan, George Robertson,
lançou o que chamou de "agenda
de mudança", um plano de modernização da aliança. Ele exortou
os membros a contribuir para tornar a Otan mais eficaz num contexto de "desafios inesperados".
Para tanto, ele disse que a aliança não poderia restringir seu campo de atuação à Europa. Mas analistas não são tão otimistas. "Com
a inclusão da Rússia na discussão
de temas ligados à segurança, como o terrorismo, o campo de ação
da Otan ficará mais restrito, não
mais amplo", apontou Bruno
Tertrais, da Fundação para a Pesquisa Estratégica (Paris).
"Afinal, como demonstrou a
campanha militar no Afeganistão, os EUA não pretendem permitir que a aliança se ocupe do problema do terrorismo. Na verdade, talvez a Rússia tenha sido
iludida mais uma vez", acrescentou Tertrais, aludindo ao estéril
Conselho Conjunto Permanente
Otan-Rússia (1997), criado para
atenuar a oposição russa à expansão da Otan para o leste (1999).
O chanceler belga, Louis Michel,
desmaiou antes da fotografia oficial do evento, mas seus assessores disseram que ele passava bem.
Com agências internacionais
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