São Paulo, quarta, 15 de julho de 1998

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ARGENTINA
Ex-general, preso em 9 de junho, deve continuar detido até ser julgado; bens do ex-presidente são embargados
Juiz estende prisão do ex-ditador Videla

AUGUSTO GAZIR
de Buenos Aires

O ex-general Jorge Rafael Videla, 72, presidente da Argentina entre 1976 e 81, continuará preso na penitenciária de Caseros (Buenos Aires) até a data de seu julgamento, segundo decisão tomada ontem pelo juiz Roberto Marquevich.
Videla é acusado em quatro processos por sequestro, substituição de identidade e falsificação de documentos de cinco recém-nascidos, filhos de desaparecidas políticas do regime militar (1976-83).
Além da prisão preventiva, o juiz Marquevich ordenou o embargo de bens do ex-militar até a soma de US$ 5 milhões. A medida é preventiva para o caso de Videla ter de pagar indenizações às famílias das vítimas.
Para Marquevich, Videla ordenou a execução de plano sistemático para apropriação de recém-nascidos, filhos de presas políticas que deram à luz em centros de detenção clandestinos mantidos pelo governo militar.
Os advogados de Videla entraram com recurso na Câmara Federal para que o ex-militar cumpra prisão domiciliar por ter mais de 70 anos. O juiz Marquevich já recusou esse pedido, pois exames realizados no ex-presidente não constataram nenhum problema de saúde.
As Avós da Praça de Maio, entidade que iniciou os processos contra Videla, comemoraram a prisão preventiva do ex-general.
"Queremos encontrar nossos netos. Achamos bom que um dos responsáveis fique preso. Videla é apenas um", disse Rosa Rosemblit, vice-presidente da entidade.

Justiça militar
Jorge Rafael Videla foi detido em 9 de junho, por ordem do mesmo juiz Roberto Marquevich. Na ocasião, o ex-general se negou a depor e exigiu ser julgado por um tribunal militar. Alguns membros da Justiça argentina e advogados do ex-general afirmam que as acusações que mantêm Videla preso já foram julgadas em 1985.
Naquele ano, os comandantes do regime ditatorial perderam a condição de militar e foram condenados a prisão perpétua pelos crimes cometidos pelo Estado no período. Cinco anos depois, o presidente Carlos Menem os indultou. Na interpretação do juiz Roberto Marquevich, o sequestro dos recém-nascidos é um crime ainda em prática, já que as vítimas ainda não recuperaram sua verdadeira identidade.
Segundo os arquivos da Conadep -comissão governamental que investigou na década de 80 os crimes cometidos pelos militares-, há uma estimativa de que 500 bebês tenham sido sequestrados em todo o país pelo regime. Já foram localizados 59.
O juiz Adolfo Bagnasco também investiga processos sobre sequestro de recém-nascidos. Ele está na Europa para ouvir depoimentos de ex-presos da ditadura.
Bagnasco e Marquevich não descartam citar ou ordenar a prisão de outros militares.
Nesta semana, o ex-capitão da Marinha Alfredo Astiz depôs na Justiça argentina sobre o tema dos menores desaparecidos, citado pela juíza María Servini de Cubría. Astiz negou conhecer realização de partos na Esma (Escola de Mecânica da Marinha).

'Meu general'
Jorge Videla está preso em cela de um setor especial da penitenciária de Caseros. Acorda às 5h, toma chá e lê os jornais. Pela manhã, caminha no pátio. Ele é chamado por alguns funcionários do presídio de "meu general".
O ex-militar é sempre visitado por seus filhos. A mulher de Videla ainda não foi a Caseros. O controle de visitas ficou mais rígido depois da chegada do líder do movimento militar de 1976.
Na semana passada, circulou a notícia de que o ex-general foi atacado por um preso jovem, armado com uma faca, no ginásio da penitenciária. A direção do presídio negou a versão.



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