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Haverá guerra, acreditam iraquianos em Bagdá
NICHOLAS HÉNIN
DO "LE MONDE", EM BAGDÁ
Assim que a decisão de Saddam
Hussein foi divulgada, as TVs iraquianas interromperam os programas religiosos e dramas históricos típicos nas tardes do Ramadã. Os apresentadores leram e releram inúmeras vezes a carta de
nove páginas na qual Bagdá diz
aceitar os termos da resolução
1441. Assim, os iraquianos souberam da notícia e a receberam favoravelmente, mas sem ilusões.
"Esse acordo é uma boa coisa,
mas a resolução não é", diz o estudante Ahmed, em Bagdá. "Se tivéssemos recusado a volta dos
inspetores, seríamos bombardeados na semana que vem. Entre
uma resolução prejudicial a nós e
uma guerra, ainda prefiro a resolução prejudicial."
Fahrid, gerente de um restaurante no centro da capital, repete
fielmente os argumentos da carta.
"A ONU não é justa. Ela deveria
ser tão exigente com Israel quanto
é conosco. Por que o Iraque é o
único que deve dobrar-se diante
das resoluções? Israel possui a
bomba atômica -por que nós
também não podemos ter armas
poderosas?".
Fahrid adota uma atitude fatalista. "A América e a ONU são
mais fortes do que nós. Elas querem destruir o Iraque. Acho que
haverá uma guerra dentro de dois
ou três meses." Ele se diz cansado.
"Fiz guerra contra o Irã, lutei na
Guerra do Golfo, não posso mais
combater. Isso não é vida."
Salah é comerciante na zona
oeste de Bagdá. Ele ouviu as emissões em árabe da rádio Monte
Carlo, uma das poucas fontes de
informação independentes no
país. "A decisão foi muito boa,
porque os iraquianos não queremos guerra", opinou. "Só os americanos querem essa guerra. Nossa concordância com o retorno
dos inspetores vai garantir que, se
houver uma guerra, ela seja uma
guerra americana."
Em todo caso, ele não pretende
se deixar derrotar sem reagir. "Se
houver uma guerra, todo mundo
aqui se defenderá. Todos os iraquianos têm uma arma em casa, e
os americanos podem prever o
pior", diz. "Eu mesmo tenho um
Kalashnikov um casa."
Seu amigo Mohammed é dono
da loja ao lado, que se prepara para fechar. "Essa decisão não deveria apenas salvar a paz -deveria
também permitir que o embargo
fosse levantado", diz ele. "O Iraque é a favor do retorno dos inspetores porque essa é a única maneira de suspender as sanções."
Ceticismo
Os representantes de organizações pacifistas ocidentais, das
quais um número cada vez maior
vem deslocando pessoal para
Bagdá, não demonstram mais
confiança do que a população.
"Não acho que essa resolução seja
portadora de muita esperança",
avalia Michael Birmingham, co-fundador da sucursal irlandesa da
organização Campaign to End
Iraq Sanctions (campanha para
pôr fim às sanções contra o Iraque). "A anuência à volta dos inspetores permite uma coisa, e uma
apenas: evitar que uma guerra seja lançada imediatamente. A resolução apresenta um número inacreditável de hipóteses nas quais
as coisas podem se deteriorar."
Consciente de que o Ocidente
pode ter dificuldade em compreender seu engajamento, Birmingham explica: ""Não me preocupo em ser considerado defensor do regime. Conheço muitos
iraquianos que não apóiam o governo, mas que tampouco são a
favor das sanções impostas a seu
povo nem a favor de serem ameaçados com uma guerra. Uma
guerra nunca é um bom momento para se instaurar uma democracia nem para fazer valer os direitos humanos e a justiça".
Sob uma grande manchete em
letras vermelhas, o jornal "Al
Joumhouriya" disse: "Vamos nos
adaptar à resolução 1441, apesar
de ela conter elementos degradantes para nós, para evitar mais
sofrimento para o povo".
Tradução de Clara Allain
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