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ANÁLISE
Resistência deve diminuir
SÉRGIO DÁVILA
DA REPORTAGEM LOCAL
Foi anteontem à noite, com a
captura de Saddam Hussein, e
não no dia 1º de maio, com o
anúncio de George W. Bush a
bordo do porta-aviões Abraham
Lincoln, que a Guerra do Iraque
começou a terminar de verdade.
A liberdade do ex-ditador iraquiano era a pedra no sapato do
presidente americano às vésperas
do ano das eleições.
Além disso, com a prisão do ex-líder, a resistência iraquiana sofre
um golpe duro. Fitas atribuídas a
ele apareciam frequentemente na
mídia árabe pedindo aos iraquianos que resistissem à ocupação.
O movimento de resistência
tem três frentes: membros da Al
Qaeda, que aproveitaram o vácuo
do poder após a queda do regime
para infiltrar militantes pela fronteira; voluntários suicidas do
mundo árabe, os mais desunidos;
e os liderados diretamente por
Saddam. Eram os mais organizados e os que devem ser dizimados.
Analistas crêem que haverá
uma redução nas operações patrocinadas por eles.
Primeiro, porque o ex-ditador
vai ser interrogado rigorosa e extensivamente pelas autoridades
dos EUA, o que pode ajudar a localização das células e aparelhos
ainda atuantes; segundo, porque
deve secar pelo menos o principal
veio de financiamento do movimento, que vinha de sua própria
fortuna, estimada em algo entre
US$ 8 bilhões e US$ 40 bilhões.
Sua prisão certamente desanima a parte dos insurgentes formada pelos membros do antigo
regime que tentavam reconduzi-lo ao poder porque não tinham
espaço nem segurança num Iraque sem Saddam. Segue em liberdade, porém, Izzat Ibrahim, um
dos principais aliados de Saddam,
visto como um dos principais organizadores dos insurgentes saddamistas.
Já outros grupos insurgentes,
como combatentes islâmicos estrangeiros e grupos nacionalistas
xiitas iraquianos contrários à ocupação, podem se sentir mais livres
até para agir, agora sem o constrangimento de estar compartilhando os objetivos do ex-ditador
e antigo inimigo de suas causas.
Alguns vêem a prisão como a
oportunidade para os EUA mostrarem quem, afinal, manda no
pedaço -caso de Timothy Garden, do Instituto de Política Externa de Londres. Todos são unânimes, porém, ao dizer que os ataques diminuem, mas não cessam.
Mesmo a inexplicável demora
na captura, no local mais evidente
e da maneira mais provável, não
deve empanar o feito de anteontem. Mas foi o que aconteceu:
uma captura demorada, que levou inacreditáveis oito meses e
meio a contar do início da guerra.
Num local evidente: depois que
ficou mais ou menos claro que o
ex-ditador havia sobrevivido aos
primeiros bombardeios da guerra, até as pedras do rio Tigre sabiam que seu destino provável era
Tikrit, sua região natal, onde vivia
a maior parte de seus parentes,
que dominavam os principais
cargos do regime.
De maneira provável: escondido num porão de uma casa, provavelmente usando disfarces. Durante os 35 dias que a reportagem
da Folha passou em Bagdá, em
março e abril, na guerra, guias e
tradutores iraquianos gostavam
de contar a mesma história, de como o ex-líder teria se livrado de
ser capturado ou morto na Guerra do Golfo, em 1991.
Contavam que, para não ser
atingido pelos bombardeios nem
delatado por uma eventual traição, o então ditador passava os
dias disfarçado ao lado do motorista num carro velho -falava-se
até num Fusca- e dormia a cada
noite numa casa alugada sob nomes falsos em bairros distantes.
De qualquer maneira, as cenas
divulgadas no mundo inteiro de
Saddam sendo examinado por
um militar tem tudo para virar o
Filme Zapruder (o registro amador do assassinato de John F.
Kennedy, em 63) dos anos 00.
De barba longa e grisalha (mas
os cabelos pretos, o que contraria
uma versão muito divulgada de
que ele, vaidoso, pintaria os cabelos quase diariamente), era a sombra do comandante prepotente de
antes, do auge nos anos 80 e 90.
De resto, espere nova onda de
patriotismo americano, já demonstrado no anúncio da captura, por Paul Bremer. Ao dizer as
palavras "We got him" (nós o pegamos), o chefe americano no Iraque foi aplaudido.
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