São Paulo, domingo, 16 de junho de 2002

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IGREJA

Roma espera 400 mil pessoas para cerimônia que reconhecerá como santo frade capuchinho marcado por estigmas

Papa celebra hoje canonização de Padre Pio

PAULO DANIEL FARAH
DA REDAÇÃO

Roma deve celebrar uma das maiores cerimônias religiosas de sua história hoje, quando a Igreja Católica reconhece como santo um frade capuchinho venerado na Itália e em vários outros países.
Padre Pio (1887-1968) ganhou notoriedade como confessor e por seus dons espirituais extraordinários. Como diz sua biografia oficial no Vaticano, "viveu imerso nas realidades sobrenaturais". Segundo devotos, ainda em vida tinha a capacidade de estar em dois lugares ao mesmo tempo.
Experiências místicas marcaram sua vida, junto com os estigmas, que apareceram quando ele tinha 23 anos, nas palmas das mãos, nos pés e no tórax, semelhantes às chagas que Jesus Cristo recebeu na cruz. As feridas cicatrizaram apenas no dia de sua morte, mais de 50 anos depois.
Apesar da saúde cada vez mais frágil, o papa João Paulo 2º, 82, deve comandar a cerimônia de canonização.
Autoridades civis de Roma esperam ao menos 400 mil peregrinos, e a polícia trabalha com um esquema de segurança para cerca de 600 mil pessoas.
Em 1999, mais de 300 mil pessoas foram à beatificação do frade. O evento serviu de balão de ensaio para as celebrações em Roma do Grande Jubileu dos 2.000 anos do nascimento de Cristo.
Hoje, mais de 4.000 ônibus e 50 trens especiais vão transportar fiéis de todos os recantos da Itália.
Ao lado de cardeais, bispos, políticos e artistas, assistirá à cerimônia o menino Matteo Colella, 11, que se curou de uma meningite supostamente graças à intercessão de Padre Pio. Como é de praxe, o caso foi examinado por um tribunal científico e eclesiástico.
Devotos de países como Itália, EUA e Brasil (cujas agências de turismo religioso organizaram viagens especiais para a canonização) vêm se reunindo em grupos de oração para recordar os numerosos milagres a ele atribuídos.
Cerca de 150 biografias dele foram escritas nos últimos dois anos, além dos CDs e dos sites sobre ele. Uma obra curiosa é o livro "VIPs Devotos de Padre Pio", em que artistas como Sophia Loren contam como o frade italiano teria mudado sua vida.

Estigmatizado
Na semana passada, Gerardo Violi, consultor médico para a causa da canonização de Padre Pio, anunciou a formação de uma comissão de médicos, advogados, teólogos e psiquiatras para estudar os estigmas de Padre Pio.
A intenção é persuadir o Vaticano a reconhecê-lo oficialmente como um estigmatizado. Se isso vier a acontecer, ele será apenas o quarto caso ao qual o Vaticano deu sanções oficiais. Os outros são os de são Francisco, santa Catarina e santa Clara.
O reconhecimento já se fez presente de certa forma. O papa Paulo 6º chegou a descrever Padre Pio, apenas três anos depois da morte, como uma "representação fiel dos estigmas de Nosso Senhor" -palavras que aparecem em seu túmulo.
Além disso, em 3 de março de 2000, João Paulo 2º e o secretário de Estado do Vaticano, cardeal Angelo Sodano, referiram-se a ele como o "frade estigmatizado".
A diocese de Roma inaugurou recentemente uma exposição cuja principal obra é uma das luvas que Padre Pio usava para cobrir as feridas na palma da mão.

Biografia
Conhecido como o "crucifixo vivo", Padre Pio (cujo nome de batismo é Francesco Forgione) nasceu em Pietrelcina, na arquidiocese de Benevento. Filho de camponeses, entrou para o noviciado aos 16 anos.
Em 1916, foi mandado para o mosteiro de San Giovanni Rotondo, onde passou a maior parte de sua vida e foi enterrado.
Então um pequeno vilarejo, San Giovanni Rotondo atualmente é uma espécie de Lourdes da Itália, que recebe 7,5 milhões de visitantes por ano, apesar de ter apenas 23 mil habitantes.
Entre os milagres atribuídos a Padre Pio quando ainda estava vivo, inclui-se a cura de uma amiga de João Paulo 2º, a psiquiatra polonesa Wanda Poltawska, que tinha um tumor na garganta. Em consideração, Poltawska assistiu à beatificação em 1999.
Apesar de admirador de Padre Pio, que conheceu em 1947 (quando Karol Wojtyla ainda era estudante em Roma), o papa desmentiu que ele tivesse previsto sua eleição e o atentado de que foi vítima, em 1981.
Desconfiança
Sua fama de santidade era tão grande que a devoção suscitou a desconfiança da Santa Sé e levou o Vaticano, que criticava seu estilo rigoroso de religiosidade, a investigar sua trajetória.
"Padre Pio é um santo homem, mas seus seguidores se comportam às vezes de forma ridícula e supersticiosa", afirmou o papa João 23, que o proibiu de celebrar missas e decretou que os sacerdotes não deveriam peregrinar a San Giovanni Rotondo, onde ele vivia.
Nos anos que se seguiram à sua morte, a fama de santidade e de milagres foi crescendo cada vez mais, tornando-o um fenômeno da Igreja Católica.
"Ele exerceu o ministério por 58 anos, de manhã e à noite, com horas e horas dedicadas aos que se voltaram para ele: homens e mulheres, doentes e saudáveis, ricos e pobres, clérigos e leigos, vindos de perto e de longe", afirmou o cardeal português José Saraiva Martins, que é o prefeito da Congregação das Causas do Santos no Vaticano desde 1998.
"Em sua causa de canonização, essa é definitivamente sua maior asserção de glória: a prova de sua santidade e o exemplo mais claro que ele deixou para padres de todo o mundo neste século e nos séculos vindouros", declarou.
João Paulo 2º já beatificou e canonizou mais pessoas que todos seus antecessores desde a fundação, em 1594, da Congregação das Causas dos Santos -eles nomearam 808 beatos e 296 santos. O papa realizou mais de 1.300 beatificações e 470 canonizações desde que foi eleito, em 1978.
A festa litúrgica -dia do santo- de Padre Pio será em 23 de setembro, dia de sua morte.


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